Concorrência dos depósitos e queda da poupança testam liquidez dos fundos em 2024
A subida das taxas de juro tem-se traduzido numa maior atratividade dos depósitos, que poderão atrair mais dinheiro das famílias.
Os fundos de investimento nacionais registam volumes de entradas positivas em 2023, apesar do ambiente de incerteza a nível global e da subida das taxas de juro. No entanto, o movimento recente de aumento de remunerações dos depósitos poderá vir aumentar a concorrência pelas poupanças dos portugueses, que estão em queda, colocando pressão na liquidez dos fundos, alerta a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
Depois de vários meses marcados por subidas tímidas de juros, que ficaram muito aquém do movimento de aumento de taxas na Zona Euro, os bancos portugueses aceleraram a subida de remunerações destes produtos de poupança. A taxa de juro média dos novos depósitos de particulares subiu de 2,29% em setembro para 2,93% em outubro. Um nível de remuneração que pode vir a roubar dinheiro a outras aplicações, como os fundos de investimento.
“A remuneração dos depósitos bancários tem aumentado nos últimos meses, pelo que, este efeito, ainda recente, de maior concorrência, associado à redução progressiva da taxa de poupança das famílias – que passou, entre junho de 2021 e 2023, de cerca de 11,7% para 5,7% do rendimento disponível, a percentagem mais baixa dos últimos 15 anos – poderá vir, em 2024, a testar os níveis de liquidez de alguns fundos de investimento abertos”, avisa a CMVM no seu Risk Outlook para 2024.
A remuneração dos depósitos bancários tem aumentado nos últimos meses, pelo que, este efeito, ainda recente, de maior concorrência, associado à redução progressiva da taxa de poupança das famílias, poderá vir, em 2024, a testar os níveis de liquidez de alguns fundos de investimento abertos.
O regulador liderado por Luís Laginha de Sousa acrescenta, porém, que, “num possível contexto de movimentos de resgate nos fundos de investimento mobiliário (FIM) nacionais em 2024, o choque adverso para o mercado de capitais nacional, por via da alienação de ativos a que os FIM possam vir a ter de incorrer, seria relativamente limitado, visto que os instrumentos financeiros nacionais (ações, dívida pública, dívida privada e unidades de participação) representavam, no final de outubro de 2023, apenas 4% (ou 707 milhões de euros) da carteira dos FIM”.
Apesar do risco de maior concorrência associado à subida de juros dos depósitos, até agora os fundos de investimento mobiliário têm mostrado resiliência, tendo captado, até ao final de outubro, cerca de 421,5 milhões de euros.
Correção de preços é risco para fundos imobiliários
Ao contrário dos fundos mobiliários, os produtos que investem em ativos imobiliários têm assistido a uma saída de poupança, no valor de 26 milhões de euros. Olhando para 2024, a CMVM alerta que o principal risco está relacionado com uma possível correção de preços no setor imobiliário, o que poderia colocar pressão ao nível da liquidez.
“A manutenção das taxas de juro em níveis mais elevados poderá levar a correções de preços no mercado imobiliário residencial e comercial (no qual os FII – Fundos de Investimento Imobiliário – maioritariamente investem), e colocar assim pressão na liquidez dos FII”, refere o mesmo relatório, acrescentando que “possíveis choques de liquidez, por via de resgates em volume anormalmente elevado, teriam efeitos bastante diferenciados, na medida em que a grande maioria dos imóveis das respetivas carteiras se encontra em Portugal, além de que o liquidity mismatch entre ativos e passivos dos FII é manifestamente superior ao dos FIM”.
A manutenção das taxas de juro em níveis mais elevados poderá levar a correções de preços no mercado imobiliário residencial e comercial (no qual os FII – Fundos de Investimento Imobiliário – maioritariamente investem), e colocar assim pressão na liquidez dos fundos imobiliários.
Dito isto, as comissões e ‘janelas’ de resgate aplicadas nos fundos imobiliários “poderão fazer face a uma desmobilização de capital e permitir uma adequada gestão dessa liquidez pelas entidades gestoras dos FII”.
Crise na dívida tem impacto, mas é “limitado” a máximo de 2%
O movimento de subida de taxas de juro a nível global tem tido grande impacto nos mercados e no desempenho dos ativos. Com as carteiras dos fundos de investimento em Portugal muito expostas a obrigações, estes produtos poderão ser negativamente afetados num cenário adverso de maiores subidas de juros – o que não se está a perspetivar neste momento, uma vez que tanto a Reserva Federal dos EUA como o Banco Central Europeu (BCE) estão a dar indicações no sentido de começarem a descer juros já em 2024.
Segundo a CMVM, no final de outubro de 2023, 39,6% do património dos FIM encontrava-se alocado a obrigações de dívida pública e privada ou a instrumentos equiparados (7.064,2 milhões de euros). Já no caso da gestão individual de carteiras, o investimento direto em títulos de dívida situava-se nos 54,9% (17.717 milhões de euros). Esta exposição é ainda maior, uma vez que tanto nos fundos como na gestão de carteiras há exposições indiretas a títulos de dívida através de posições em ETF e noutros fundos de investimento.
Entre os 15 fundos de investimento mobiliário com maior investimento em obrigações denominadas em euros e dólares, as perdas potenciais num cenário adverso oscilam entre 0,15% e 2,13% do valor total dessas obrigações.
Uma vez que a valorização dos instrumentos de dívida é influenciada pelas variações das taxas de juro de mercado, a CMVM calcula que, num cenário adverso marcado por maiores oscilações de taxas de juro, “entre os 15 fundos de investimento mobiliário com maior investimento em obrigações denominadas em euros e dólares, as perdas potenciais num cenário adverso oscilam entre 0,15% e 2,13% do valor total dessas obrigações”. Entre estes FIM, quatro apresentam perdas potenciais superiores a 1,5%, sendo que, em média, “as perdas para este setor situam-se em 1,2% do valor gerido da dívida denominada em euros e dólares”.
No caso da gestão de carteiras, as perdas potenciais são superiores. “Já entre as entidades responsáveis pela GIC, seis registam perdas potenciais superiores a 1,5% sendo que para três delas essas perdas são superiores a 2%. Em termos agregados, as perdas potenciais totalizam 2%”, conclui a CMVM.
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