Tiago Oliveira, o homem “do terreno, frontal e afável” que vai assumir as rédeas da CGTP
Aos 43 anos, Tiago Oliveira assume a liderança da CGTP, sucedendo a Isabel Camarinha. É descrito pelos que o conhecem há muito como um homem do terreno, frontal, mas capaz de gerar consensos.
De t-shirt preta, óculos escuros ao peito e cartaz na mão, lá estava Tiago Oliveira entre as centenas que, em mais um 1.º de Maio, enchiam a principal artéria do Porto. “Não queremos mais apoios. Queremos salários dignos“, haveria de afirmar, em declarações às televisões, aquele que esta madrugada foi escolhido para novo líder da CGTP. Os que o conhecem há muito, com maior ou menos profundidade, descrevem-no como um homem afável, que facilmente faz amizades, mas que é determinado e frontal.
Solidário e capaz de gerar convergências entre os trabalhadores. “Nos últimos anos, tudo o que foi luta, ele esteve lá“, comenta o sindicalista que o antecedeu no cargo que agora vai deixar – o de coordenador da União de Sindicatos do Porto –, rumando à capital.
“Conheço-o há 18 ou 20 anos. Era ele muito jovem“, recorda João Torres. Travaram conhecimento no sindicato que sempre partilharam, o que representa os trabalhadores do setor metalúrgico e metalomecânico. “Passou a delegado sindical e, depois, foi eleito para a direção. Passou pouco tempo para que se visse que tinha condições para evoluir“, conta o ex-coordenador da União de Sindicatos do Porto.
Mecânico de profissão, Tiago Oliveira foi eleito delegado sindical da Auto-Sueco em 2003. Três anos depois, chegou a dirigente sindical e também a membro da direção do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas do Distrito do Porto.
Em 2012 passa, então, a membro da comissão executiva da União de Sindicatos do Portos, bem como a membro do conselho nacional da CGTP. À comissão executiva dessa central chegaria em 2016, ano em que passaria também a ser coordenador da União de Sindicatos do Porto.
Além desse percurso no sindicalismo, Jorge Torres frisa que Tiago Oliveira revelou logo “qualidades humanas muito boas“. “Faz amizades com muita facilidade, é muito afável e disponível. É de uma simpatia, de uma humildade, muito solidário e preocupado com os outros“, retrata o sindicalista.
Mário Nogueira, histórico líder da Fenprof e membro da comissão executiva da CGTP, conhece-o há menos tempo – há cerca de uma década, desde que chegou ao conselho nacional da central sindical –, mas destaca qualidades semelhantes. “Não é propriamente uma pessoa com quem esteja todos os dias”, admite. “Temos 20 anos de diferença”, assinala. “Mas nota-se que é afável, simpático, que gosta das outras pessoas. Dá-se bem com as outras pessoas e isso é visível no próprio tratamento dele para com as outras pessoas”, sublinha o sindicalista.
Nas reuniões da CGTP às quais, vindo do Porto, Tiago chega já depois de muitos lugares estarem preenchidos, não faz questão de ficar com um assento em particular, indica Mário Nogueira. “Não é uma pessoa que queira exibir-se, mostrar-se. Em alguns momentos, é discreto“, afirma Mário Nogueira.
Outro membro da comissão executiva da CGTP, Joaquim Mesquita, usa afável para adjetivar Tiago Oliveira. “É muito frontal, sem deixar de ser afável“, entende o sindicalista, que realça também o “caráter muito conciliador e muito congregador, ao nível dos sindicados e dos trabalhadores” do novo secretário-geral.
Mesmo quem o conhece há mais tempo, confirma essa tendência para os acordos. “Tem uma postura de firmeza e determinação, com argumentos muito bons em defesa dos consensos entre os trabalhadores. É um homem que se empenha para que os trabalhadores se unam em consensos“, declara João Torres.
Essa é uma característica particularmente relevante, tendo em conta que Arménio Carlos, antigo secretário-geral da CGTP, já fez questão de avisar que um trabalhador revoltado, “se não estiver organizado pode tornar-se amanhã num trabalhador conformado“.
Ao ECO, explica que a força da CGTP “está nos locais de trabalho”, mas cabe ao secretário-geral “coordenar os trabalhos coletivos“. “É importante que a coordenação seja eficaz, dinamizadora, confiante“, defende Arménio Carlos, que considera que Tiago Oliveira “tem a experiência necessária para desenvolver esse papel“, considerando os seus anos na liderança da União de Sindicatos do Porto.
“Tenho uma boa opinião dele. Já o conheço há vários anos. Tem as condições certas para ser secretário-geral da CGTP“, assevera o antigo líder da central sindical.
Um homem do terreno
É das lutas sindicais no terreno que João Torres guarda as maiores recordações de Tiago Oliveira. “Nos últimos anos, tudo o que foi luta dos trabalhadores, ele esteve lá. Sempre privilegiou a solidariedade, a participação na luta dos trabalhadores. O Tiago esteve sempre lá, intervindo e apoiando“, lembra o ex-coordenador da União de Sindicatos do Porto.
“É um dirigente que sempre pisou o terreno“, concorda Mário Nogueira, que fala numa “grande intervenção nos locais de trabalho“. “Como coordenador da União de Sindicatos do Porto – talvez a segunda maior do país –, tem uma grande experiência em grandes iniciativas e manifestações“, detalha o representante dos professores. E atira: “Sobretudo, é jovem, pronto para o que aí vem“.
Escolhida para secretária-geral da CGTP em 2020, Isabel Camarinha está de saída desse cargo precisamente pelo limite de idade. É que, no curso do próximo mandato, chegará à idade da reforma, o que impediu a sua continuação, e abriu, então, a porta a que alguém lhe sucedesse. Neste caso, “o jovem” Tiago Oliveira, de 43 anos. A sua idade vai permitir que cumpra, querendo, mais do que um mandato como secretário-geral da CGTP.
Numa entrevista recente ao Público, Isabel Camarinha frisava que Tiago Oliveira é “bastante novo”, mas assegurava que isso é algo positivo: “Dá uma perspetiva de renovação e rejuvenescimento“, disse. “É uma sugestão muito forte e com todas as condições para que a CGTP saia reforçada“, salientou. O ECO tentou contactar diretamente a agora ex-secretária-geral, mas não foi possível.
Já João Torres deixa um recado: renovar significa “pôr gente mais nova, não é alterar o paradigma da CGTP“.
Quadro político desafiante
O nome foi apontado pela comissão executiva da CGTP, e, entretanto, confirmado em congresso. Agora, não faltarão desafios a Tiago Oliveira nesse novo lugar, a começar pelo cenário político que resultar das eleições de 10 de março.
“O enquadramento político será de muita instabilidade. O quadro político difícil e desfavorável aos trabalhadores [é desafiante]”, salienta o membro da comissão executiva Joaquim Mesquita, quando questionado sobre as principais dificuldades que Tiago Oliveira irá enfrentar.
Também Mário Nogueira menciona o cenário político, sobretudo porque as sondagens indicam que poderá crescer “uma direita xenófoba, radicalizada e que alimenta um discurso de ódio“. Pior, os direitos dos que trabalham têm sido usados como “chamariz“, alerta, em propostas que, “nas letras pequenas, não são do interesse dos trabalhadores”.
Além disso, o líder da Fenprof identifica como desafios para o novo secretário-geral a defesa dos direitos laborais, sindicais e as funções sociais do Estado. “De uma economia a pensar também nas pessoas. A CGTP vai ter de ter um papel importante”, defende.
A propósito do cenário político, não consta da nota biográfica partilhada pela CGTP, mas importa notar que Tiago Oliveira foi candidato pela CDU à presidência da União de Freguesias de São Mamede de Infesta e Senhora da Horta, nas eleições autárquicas de 2021. Segundo o Público, fez também parte do comité central do PCP.
Por sua vez, Arménio Carlos faz questão de lembrar que hoje “há muitos milhares de empresas onde o movimento sindical está impedido de entrar“, mas a Agenda do Trabalho Digno veio deixar claro que, mesmo nas companhias onde não há trabalhadores sindicalizados, estas estruturas podem ter presença. “Os direitos não podem ficar à porta do local de trabalho“, realça.
“O grande desafio será possibilitar que os trabalhadores tenham voz nos locais de trabalho“, sublinha, de olho no mandato que agora arranca, com Tiago Oliveira nas rédeas.
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