Manifesto para reformar lei eleitoral exclui criação de um círculo de compensação

Garantido que irá auscultar os partidos para o desenho do projeto de lei, o IPP revela que a criação de um círculo de compensação não está nos planos, mas sim um "redesenho dos círculos eleitorais".

O Institute of Public Policy (IPP) quer entregar no próximo ano na Assembleia da República um projeto legislativo “académico e tecnicamente bem fundamentado” que permita reformar o sistema eleitoral em Portugal e reduzir o desperdício de votos, tal como se propõem a fazer no âmbito do manifesto apresentado, esta quarta-feira. O processo deverá ser feito em diálogo com os decisores políticos, “para se perceber as sensibilidades atuais em relação ao sistema eleitoral”, explica Paulo Trigo Pereira.

No entanto, o IPP revela que o futuro projeto legislativo não prevê a criação de um sistema de compensação, tal como tem sido defendido pelos alguns partidos.

“Ainda estamos na fase de discutir as propostas. Mas o que está a ser trabalhado pelo IPP não contempla a criação de um círculo de compensação nacional”, indica o criador do manifesto, ex-deputado independente eleito pelo PS e professor catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), rejeitando que isso dificulte o apoio de partidos como a Iniciativa Liberal, Livre e Bloco de Esquerda que já apresentaram propostas na AR que defendem a criação de um círculo eleitoral de compensação nas eleições legislativas.

As propostas foram apresentadas em maio, mas foram chumbadas pelo PS e PSD, os dois partidos que mais beneficiam do atual sistema. O Livre sugeria a criação de um círculo de compensação nacional de 37 deputados, a Iniciativa Liberal de 30 e o Bloco de Esquerda de dez. Já o PAN defendia que uma agregação de círculos eleitorais.

“Ainda estamos numa fase muito preliminar e vamos dialogar”, sublinha Paulo Trigo Pereira, rejeitando que a falta de inclusão desta proposta comprometa o apoio dos partidos. Para o responsável, o atual desperdício de votos pode ser combatido de duas maneiras: através da criação de um círculo de compensação mas também pelo redesenho dos círculos eleitorais, sendo essa “a via” que está a ser seguida pelo IPP, nesta fase. A proposta não irá contribuir uma fragmentação do voto, garante o mesmo.

Apesar de tudo, o autor deste manifesto que conta com a assinatura de 25 personalidades, entre elas, Luís Marques Mendes e António Vitorino, sublinha que irá auscultar todas as bancadas parlamentar e “apresentar um projeto que seja academicamente e tecnicamente bem fundamentado”.

“Queremos dialogar com os decisores políticos para perceber as sensibilidades atuais em relação à reforma do sistema eleitoral. Não vamos fazer um trabalho independente dos decisores políticos“, sublinha.

Além de querer apresentar um projeto de lei no próximo ano, o IPP também vai lançar um site no qual pretende combater a iliteracia sobre sistemas eleitorais e políticos dos portugueses, disponibilizando informações e recursos para todo o tipo de cidadãos, mas sobretudo aqueles “que não percebem nada sobre sistemas eleitorais” por serem tendencialmente “temas muito complexos”.

“Queremos ouvir os cidadãos. Por exemplo, os eleitores de Portalegre só conseguem eleger dois deputados. Na prática, estes eleitores ou votam nos dois grandes partidos ou o seu voto não é útil”, alerta. “Os eleitores nos distritos do interior sentem que estão limitados no voto. Quem vive nesses círculos eleitorais e vota num partido pequeno não tem hipóteses nenhumas de eleger”.

Assim, o manifesto propõe “aumentar a liberdade de voto”, reformulando, também, o boletim que contém apenas os partidos que concorrem àquelas eleições.

“Hoje em dia, somos confrontados com um boletim com partidos e isso só acontece em três países da União Europeia. Nos outros países, os cidadãos podem votar em candidatos e a maioria das pessoas não sabe isso”, explica, exemplificando que na Alemanha os cidadãos têm direito a exercer dois votos: num partido político e num candidato.

“Estou convencido de que há muitos cidadãos que, sobretudo tendo acesso à informação sobre estas matérias, percebem que há vida para além do nosso boletim de voto”, diz, garantindo que tal proposta não contribuirá para uma fragmentação do voto.

“Esta é a principal objeção que se coloca. Mas ao contrário de algumas propostas, a fragmentação não aumenta se não aumentar a proporcionalidade do sistema eleitoral, que, por sua vez, não aumenta se compensarmos a agregação de círculos eleitorais pequenos com a partição de círculos eleitorais grandes“, explica.

De acordo com o manifesto divulgado esta quarta-feira, intitulado “Reformar o Sistema Eleitoral: Renovar a Democracia”, meio século após o 25 de Abril e 48 anos passados sobre a aprovação da Constituição que balizou o sistema eleitoral para a Assembleia da República “poucas foram as alterações ocorridas”, apesar de muito ter mudado no país nestas décadas.

Portugal “em contracorrente”

Segundo os 25 signatários, “Portugal está em contracorrente” já que integra “um grupo muito reduzido de três países da União Europeia em que só é possível votar em listas partidárias (listas fechadas) nas eleições legislativas”, sendo possível um pouco por todo o mundo “alguma forma de personalização do voto”.

“Os sistemas eleitorais têm impactos reconhecidos tanto na fragmentação parlamentar — que por sua vez afeta a estabilidade política — como no grau de proporcionalidade de votos e mandatos e na maior ou menor relação entre candidatos e eleitores”, refere o documento.

As 25 personalidades que assinam este manifesto “consideram necessária uma reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República, no sentido de dar maior liberdade de escolha aos eleitores e aproximar eleitores de eleitos, diminuindo o desperdício de votos, mantendo a proporcionalidade do sistema”.

Entre os nomes que assinam este manifesto estão o antigo diretor-geral da Organização Internacional para as Migrações, António Vitorino, a ex-eurodeputada e antiga candidata presidencial Ana Gomes, os ex-deputados Paulo Trigo Pereira, Alexandre Quintanilha e Jorge Lacão ou ainda o socialista Álvaro Beleza. O antigo líder do PSD Luís Marques Mendes, o ex-presidente do CDS-PP José Ribeiro e Castro e o ex-ministro Miguel Cadilhe também assinam o documento.

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