Portugal escapa (para já) a despedimentos de multinacionais alemãs. Planos são para crescer

Multinacionais alemãs, como a Volkswagen, Siemens, Bosch ou Continental, que empregam milhares de pessoas no país, têm deixado Portugal de fora dos planos de despedimentos.

As últimas semanas têm sido marcadas por sucessivas notícias de planos de despedimentos por parte de grandes multinacionais alemãs com atividade em Portugal. Empresas como a Bosch, Volkswagen ou Continental, alguns dos maiores empregadores do país, pretendem despedir milhares, sobretudo na Alemanha. Mas a vaga de despedimentos não está, pelo menos para já, a afetar Portugal, com grande parte destas empresas a continuar a investir no país e a aumentar o número de colaboradores.

O travão na economia alemã e o mau momento vivido pela indústria automóvel, que enfrenta uma quebra da procura e crescente concorrência chinesa, além de atrasos na transição para os veículos elétricos, têm acelerado uma maré de reestruturações na indústria alemã, onde os salários são mais elevados.

A Volkswagen, que tem em Portugal a Autoeuropa e é o maior exportador do país, é uma das empresas que tem feito correr mais tinta, sobretudo desde o passado mês de setembro, quando a empresa admitiu pela primeira vez o encerramento de fábricas na Alemanha, algo inédito para a companhia automóvel. A companhia tem estado em negociações com os sindicatos, mas a empresa quer fechar três fábricas alemãs e despedir milhares, falando na necessidade “urgente” de corte de custos e decisões “dolorosas”.

Estes planos de redução de pessoal não incluem os cerca de cinco mil funcionários da fábrica de Palmela, segundo apurou o ECO, com a fábrica da Autoeuropa a manter-se estratégica para o grupo, que continua a investir em Portugal.

De acordo com a Comissão de trabalhadores da fábrica portuguesa, o grupo está a investir em Palmela para se adaptar ao mercado dos carros elétricos.

Mas a Volkswagen não é a única gigante alemã com atividade em Portugal que está a ser forçada a avançar com planos de reestruturação para cortar custos. A Bosch anunciou na última sexta-feira que está a planear avançar com a dispensa de 5.500 trabalhadores a nível mundial, principalmente na Alemanha, devido a dificuldades no mercado de veículos novos. Este novo anúncio de redução de pessoal surge depois de a quinta maior exportadora portuguesa, que no ano passado faturou mais de dois mil milhões de euros em Portugal, ter já avançado com a intenção de eliminar sete mil postos de trabalho.

Questionada sobre o potencial impacto em Portugal, após o primeiro anúncio de despedimentos, fonte oficial da empresa, que tem fábricas em Braga, Aveiro, Ovar e um hub de serviços de Lisboa, garantiu ao ECO, no dia 15 de novembro, que “Portugal não será afetado pelos despedimentos“. “E mantém-se o que dissemos no dia da apresentação dos resultados relativamente ao crescimento previsto, ou seja, a estratégia mantém-se”, sublinhava a mesma fonte, nessas respostas enviadas ao ECO.

Mais adiantava que, “apesar de um ambiente económico e social a nível global que se mantém exigente, as expectativas para 2024 são de um ligeiro crescimento em todas as localizações em Portugal.” Na apresentação de resultados de 2023, Carlos Ribas, o então responsável da empresa em Portugal, que foi entretanto afastado compulsivamente do cargo, estimava que a empresa continuasse a crescer em volume de negócios e em número de colaboradores.

Mais dúbias foram, porém, as respostas dadas no final da semana passada, após o segundo anúncio de cortes. “Neste momento, o que podemos dizer é que ainda é muito cedo para adiantar mais informações, uma vez que as negociações estão apenas a começar”, adiantou ao ECO fonte oficial da Bosch em Portugal. A mesma fonte referiu que “outros detalhes fazem parte das discussões com os representantes dos colaboradores e, por conseguinte, não [é possível] fazer quaisquer declarações concretas nesta fase”.

O Grupo Siemens em Portugal é, e sempre foi, sinónimo de criação de emprego. No ano fiscal de 2024, terminado a 30 de setembro, registou mais de 4.000 colaboradores, uma subida superior a 300 colaboradores no país. No ano fiscal de 2025 estimamos aumentar a nossa equipa em Portugal em pelo menos cerca de 200 colaboradores.

Fonte oficial da Siemens Portugal

Outra grande empresa alemã, a Siemens, que emprega cerca de quatro mil colaboradores em Portugal e tem planos para despedir cinco mil pessoas noutras geografias, afasta despedimentos por cá. Pelo contrário, prevê continuar a crescer no país.

“O Grupo Siemens em Portugal é, e sempre foi, sinónimo de criação de emprego. No ano fiscal de 2024, terminado a 30 de setembro, registou mais de quatro mil colaboradores, uma subida superior a 300 colaboradores no país”, adianta fonte oficial da empresa ao ECO, acrescentando que, “no ano fiscal de 2025 [a empresa] aumentar a equipa em Portugal em, pelo menos, cerca de 200 colaboradores”.

Por sua vez, a Continental, que tem uma fábrica de pneus em Lousado, Vila Nova de Famalicão, e é a quarta maior exportadora nacional, anunciou há uns meses que vai cortar mais de sete mil postos de trabalho a nível global, devido à pressão que o negócio automóvel enfrenta, com as fabricantes automóveis a moderarem a produção face à menor procura por carros elétricos.

Também neste caso, a fábrica em Portugal tem ficado a salvo dos planos de reestruturação anunciados pela casa-mãe e continua a ser uma das apostas do grupo, estando atualmente a acelerar a produção de pneus sustentáveis. Portugal tem recebido novos investimentos todos os anos e continua a expandir a sua produção. Em 2017, a fábrica iniciou a produção de pneus agrícola e, em 2020, começou a fazer também pneus Off the Road (OTR), para maquinaria pesada.

Fábrica da Continental Mabor em Lousado (Vila Nova de Famalicão)Ricardo Castelo/ECO

A estratégia Visão 2030 da Continental tem sido um motor dos investimentos da empresa em Lousado, que totalizaram cerca de 150 milhões de euros nos últimos dois anos. Considerando os últimos três anos, o montante de investimentos ascende mesmo a 200 milhões.

Com mais de 2.700 empregados — grande parte dos 3.700 que a Continental tem em Portugal –, a fábrica de Lousado tem intensificado o investimento em novas máquinas e na maior automatização, colocando robôs a recolher e transportar pneus na fábrica. Depois do investimento num novo armazém, a fábrica tem já aprovados projetos para continuar a comprar novos equipamentos.

Também a Infineon, que quer despedir 1.400, está a contratar duas centenas de pessoas para o centro de serviços partilhados instalado no TecMaia — Parque de Ciência e Tecnologia da Maia, onde já emprega perto de 800 profissionais de mais de duas dezenas de nacionalidades e que serve cerca de 60 clientes em todo o mundo.

Para já [as empresas em Portugal estão a salvo dos despedimentos] e há até anúncios públicos de investimentos de empresas alemãs.

Rafael Campos Pereira

Vice-presidente da AIMMAP

Para já [as empresas em Portugal estão a salvo dos despedimentos] e há até anúncios públicos de investimentos de empresas alemãs, como a Lufthansa [Portugal favorito a “ganhar” unidade de manutenção da Lufthansa no sudoeste europeu]”, resume ao ECO Rafael Campos Pereira.

“Não há notícias de despedimentos”, reforça o vice-presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) e vice-presidente executivo da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), justificando que “o custo da mão-de-obra ser bastante inferior é um dos motivos” para esta aposta em Portugal.

O mesmo responsável explica ainda que às empresas estrangeiras em Portugal são aplicados preços de transferência e “pouco IRC pagam em Portugal”. Ou seja, estas grandes empresas conseguem contratar funcionários com boa formação e salários menores aos que pagariam noutras localizações, nomeadamente na Alemanha. “Portugal pode tirar vantagem [desta situação] e tiraria muito mais se o IRC fosse mais baixo“, acrescenta.

“A contínua aposta em Portugal em detrimento de outros países é muito importante para a economia portuguesa. Portugal deve assegurar e, mesmo, reforçar a atratividade de investimento, incluindo o investimento estrangeiro”, destaca Luís Miguel Ribeiro, presidente do conselho de administração da AEP.

“Numa altura em que o Orçamento do Estado para 2025 é discutido na especialidade, é importante que as políticas públicas concentrem também a sua atenção no estímulo a esta atratividade“, remata o dirigente associativo.

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