Pressão chinesa dita fim de Tavares e obriga a reestruturação da Stellantis. Ações caem 6,3% após saída do CEO

Tavares deixa Stellantis após resultados dececionantes. O gestor português transformou empresa no quarto maior construtor automóvel mundial, mas falhou na eletrificação e enfrentou pressão chinesa.

As ações da Stellantis fecharam esta segunda-feira a cair 6,3%, após terem chegado a desvalorizar 10% ao final da manhã para os 11,268 euros, o valor mais baixo desde 6 de julho de 2022.

A queda acentuada das ações nesta sessão surge na sequência da saída abrupta de Carlos Tavares do cargo de CEO da Stellantis, anunciada no domingo. O gestor português, que liderava a empresa desde a sua criação em 2021, apresentou a sua demissão com efeitos imediatos, tendo sido aceite pela administração da fabricante automóvel.

Num comunicado divulgado pela empresa, o presidente do conselho de administração, John Elkann, agradeceu a Carlos Tavares pelos “anos de serviço dedicados e pelo papel que desempenhou na criação da Stellantis, além das recuperações anteriores da PSA e Opel”.

No entanto, no mesmo documento, a administração da empresa refere que a saída de Tavares foi antecipada devido a “visões diferentes” que emergiram nas últimas semanas entre o gestor português, os acionistas e os administradores.

Entre os problemas mais destacados estão os resultados dececionantes alcançados este ano, marcados por uma forte queda das vendas e dos lucros. Só nos primeiros seis meses do ano, a empresa apresentou uma queda homóloga de 48% dos lucros e uma contração de 15% das receitas líquidas.

A situação foi exacerbada no terceiro trimestre pela estratégia de Tavares, frequentemente descrita como focada no curto prazo e com um estilo de gestão “implacável”, que alienou concessionários, fornecedores e políticos, provocando uma queda anual de 27% da faturação da empresa. A queda de 45% nas ações da Stellantis este ano ilustra bem a magnitude dos desafios enfrentados.

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Os desafios de uma nova Era

A Stellantis, criada em 2021 pela fusão entre a Fiat Chrysler e o Grupo PSA, é atualmente a quarta maior fabricante automóvel do mundo. Contudo, a empresa enfrenta uma série de problemas estruturais que estarão em cima da mesa do próximo CEO da empresa.

  1. Queda das vendas nos EUA: Marcas como Jeep e Dodge registaram uma queda significativa das vendas este ano, que foi agravada por preços elevados e um inventário crescente. No caso dos modelos Jeep Wagoneer e do Ram 1500, o inventário disponível nos concessionários ultrapassa em 20 dias os níveis médios dos concorrentes.
  2. Conflitos laborais: A pausa na produção em fábricas italianas gerou tensões com sindicatos, culminando na primeira greve nacional de trabalhadores da indústria automóvel em 20 anos.
  3. Custos de produção elevados: Nos mercados europeus, os altos custos e a falta de incentivos para veículos elétricos foram apontados por Tavares como fatores críticos para a redução da competitividade.

Além de todas estas “batalhas”, o principal desafio que enfrenta a Stellantis e o próximo CEO é a transição para veículos elétricos. Tavares tinha defendido em 2021 um investimento de 50 mil milhões de euros na eletrificação da construtora automóvel, com o intuito de atingir 100% de vendas de veículos elétricos a bateria na Europa até 2030.

No entanto, as vendas têm consistentemente ficado aquém das expectativas. Segundo os últimos dados do “EV Tracker” do Bank of America, depois de no primeiro semestre de 2023 a Stellantis ter vendido 173,4 mil veículos elétricos, este número caiu 9% para 157,7 mil no primeiro semestre deste ano.

Além disso, a quota de mercado global da Stellantis no segmento de veículos elétricos caiu para 3,5% no primeiro semestre de 2024, em comparação com 5,3% no primeiro semestre de 2023, à medida que os fabricantes chineses avançavam com preços competitivos e inovação.

Com desafios colossais pela frente, a quarta maior fabricante automóvel do mundo deve agora equilibrar inovação, eficiência operacional e um portefólio diversificado para garantir o seu lugar no competitivo mercado global.

No centro das preocupações do futuro CEO da empresa estará claramente o combate assertivo à crescente concorrência dos fabricantes chineses, que estão a ganhar terreno nos mercados tradicionais da Stellantis. “Os fabricantes de automóveis tradicionais estão a perder terreno para as marcas chinesas de veículos elétricos, mesmo nos seus mercados mais rentáveis. A inovação já não é opcional”, destacou Brian Tycangco, analista da empresa de research financeiro Stansberry Research.

Ainda recentemente, Stellantis admitiu fechar fábricas na Europa devido à concorrência chinesa. “Se os chineses conquistarem 10% da quota de mercado na Europa no final da sua ofensiva, isso significa que produzirão 1,5 milhões de automóveis. Isto representa sete fábricas de montagem”, referiu na altura Carlos Tavares, sublinhando que “os fabricantes europeus terão então de fechá-las ou transferi-las para os chineses”, alertou.

Outro desafio relevante nas prioridades do próximo CEO da Stellantis é o restabelecimento da confiança dos investidores. A queda de 60% das ações desde o máximo histórico alcançado a 26 de março reflete as preocupações do mercado com a estratégia e o desempenho da empresa.

O novo líder terá de apresentar um plano convincente para reverter esta tendência e demonstrar que a Stellantis pode competir eficazmente no novo panorama automóvel global. A empresa responsável pelas marcas Citroën, Peugeot e mais 12 marcas de automóveis já iniciou o processo de procura de um novo líder, para concluir a nomeação até meados de 2025. Até lá, um comité executivo interino, presidido por John Elkann, será responsável pela gestão da empresa.

A saída de Carlos Tavares marca o fim de um capítulo na história da Stellantis e o início de um período de incerteza. Com desafios colossais pela frente, a quarta maior fabricante automóvel do mundo deve agora equilibrar inovação, eficiência operacional e um portefólio diversificado para garantir o seu lugar no competitivo mercado global.

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