Bitcoin ganha “legitimidade” como alternativa ao ouro junto de investidores institucionais
Presidente da Fed comparou a bitcoin a ouro virtual horas antes de atingir a meta dos 100 mil dólares. A posição ajuda a dar "legitimidade" à criptomoeda como ativo de investimento.
A bitcoin nasceu para ser uma moeda alternativa, mas é cada vez mais vista como um ativo de investimento. A sua chegada aos 100 mil dólares durante a madrugada desta quinta-feira ajudará a consolidar ainda mais essa visão de uma bitcoin mais semelhante ao ouro do que ao dólar.
O ano de 2024 já estava a ser positivo para a criptomoeda mais popular do mundo, depois da aprovação, em janeiro, dos primeiros fundos com exposição direta à bitcoin. Mas a reeleição de Donald Trump como Presidente dos EUA em novembro ajudou a catapultar a bitcoin para valores nunca antes vistos.
O republicano, que se aliou a outros entusiastas das criptomoedas, como Elon Musk, fez campanha com a promessa de tornar os EUA num país mais amigo dos criptoativos. E, na quarta-feira, ao final da tarde, cumpriu uma delas, anunciando a escolha de Paul Atkins, um cripto-adepto, para futuro líder da Securities and Exchange Commission (SEC), o regulador dos mercados financeiros.
A nomeação, que ainda terá de ser confirmada pelo Congresso, serviu de catalisador para a bitcoin, mas não foi o único fator a contribuir para a escalada final rumo aos 100 mil dólares (chegou aos 103.900). Nesse mesmo final de tarde, Jerome Powell, presidente da Reserva Federal norte-americana, disse numa conferência que “a bitcoin é como o ouro, só que digital”.
“As pessoas não a estão a usar como meio de pagamento ou como reserva de valor. É altamente volátil. Não é um concorrente para o dólar, é verdadeiramente um concorrente para o ouro”, disse o presidente da Fed.
O caminho estava assim traçado. “Powell ajudou muito à subida da bitcoin”, considera Filipe Garcia, presidente e economista da consultora IMF – Informação de Mercados Financeiros. “Ao meter a bitcoin na mesma prateleira do ouro, não sei se de propósito ou se para dizer que não estava na prateleira do dólar, deu-lhe uma legitimidade enquanto ativo de investimento”, nota o analista.
Uma opinião com a qual tende a concordar: “No início da bitcoin em particular, o argumento principal era que isto era uma moeda alternativa. É muito discutível que cumpra com boa fiabilidade todas as funções de uma moeda. Tem-se transformado de um projeto de moeda num ativo de investimento.”
Para Filipe Garcia, a grande diferença para a bitcoin e para os criptoativos no último ano e meio é precisamente essa entrada cada vez maior de “participantes mais institucionais e mais ligados à finança tradicional”. O lançamento dos primeiros fundos cotados de bitcoin foi um acontecimento “relevante” para puxar as criptomoedas para dentro do “sistema”, diz.
“À medida que muitos consultores de investimento de todos os tamanhos vão introduzindo na sua análise a bitcoin, há aqui uma entrada do mundo financeiro convencional neste mercado. É um mercado de oferta e procura: há uma procura adicional que está a fazer o preço subir”, explica o presidente da IMF.
Essa tendência vai continuar por mais algum tempo, vaticina, o que poderá levar a bitcoin a novos recordes. Mas ninguém sabe ao certo o que vai acontecer. “É um ativo com características muito próprias, com participantes diferentes e condições regulatórias diferentes. Estamos a pisar num terreno novo”, afirma o consultor, que apela à responsabilidade: “Não se pode colocar aqui o dinheiro da prestação da casa”, recorda.
Além da entrada e reforço dos investidores institucionais, Filipe Garcia aponta para um terceiro fator que está a contribuir para a maior popularidade desta e doutras criptomoedas: a maior acessibilidade do mercado aos investidores de retalho. Uma diferença substancial face a outros tempos, como quando o Santander Totta era notícia em Portugal, em 2018, por impedir os seus clientes de transferirem dinheiro para a Coinbase, uma popular corretora de criptomoedas.
Com esta confluência de fatores, a chegada da bitcoin aos 100 mil dólares foi vista por muitos analistas com naturalidade, depois de ter enfrentado alguma resistência nas últimas semanas. “É inevitável [para] um bem tão escasso como é a bitcoin, ainda mais escasso do que o ouro”, comentava ao ECO, esta quarta-feira, Nuno Lima da Luz, presidente da Associação Portuguesa de Blockchain e Criptomoedas (APBC), horas antes de se saber da nomeação de Trump para a SEC ou que esse marco iria ser atingido nessa mesma noite.
Um dos próximos testes poderá vir a ser a próxima reunião da Fed, que será também a última do ano, marcada para 17 e 18 de dezembro. Espera-se que o presidente, Jerome Powell, anuncie um novo corte de 25 pontos base nas taxas de juro, o que, para o responsável da APBC, poderá alimentar o apetite pelo risco: “Normalmente, os cortes das taxas de juro afetam os mercados financeiros na medida em que começa a haver menos aversão ao risco e começa a ser também menos rentável [investir] noutro tipo de produtos, como obrigações do tesouro.”
Mas se para uns as criptomoedas são agora ativos legítimos de investimento — a MicroStrategy, empresa de software que foi um dos primeiros investidores institucionais em bitcoin, detém agora mais de 400 mil unidades da moeda –, para outros continuará a ser sempre fonte de instabilidade para o sistema financeiro, um risco insustentável para as carteiras ou um paraíso para os criminosos.
Aliás, nesta última quarta-feira, também foi anunciado que as autoridades britânicas desmantelaram uma operação de branqueamento de capitais com sede em Moscovo que ajudava a trocar dinheiro sujo por criptomoedas. A rede seria usada por traficantes de droga, mas também por espiões ao serviço do Kremlin, noticiou a BBC.
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