Amigo de Ronaldo, homem da Sonae e advogado de craques de futebol. Quem é Osório de Castro, acusado de fraude fiscal?
Sócio da Morais Leitão, Carlos Osório de Castro, pediu a exoneração do cargo ao escritório de advogados, depois da acusação de fraude fiscal qualificada, juntamente com o cliente e amigo Jorge Mendes.
O Ministério Público (MP) deduziu acusação contra Jorge Mendes, empresário do mundo do futebol, a sua mulher Sandra e Carlos Osório de Castro, advogado reconhecido no mercado da advocacia de negócios e sócio da Morais Leitão. Em causa estão alegados esquemas de fraude fiscal. Os três arguidos foram acusados formalmente pelo MP, cada um por um crime de fraude fiscal qualificada. Um processo que nada tem a ver com a Operação Fora de Jogo nem com a investigação Football Leaks, denunciada pelo hacker Rui Pinto.
Na terça-feira, quando se tornou pública a acusação, o sócio da Morais Leitão, Carlos Osório de Castro não tardou a reagir. Internamente, pediu a exoneração do cargo ao escritório de advogados, que foi aceite, justificando com a vontade de “não criar constrangimentos à sociedade e de ter maior disponibilidade para preparar a sua defesa”. O escritório, liderado por Martim Kuprenski, considerou essa decisão como “um gesto de enorme dignidade e de respeito pela nossa sociedade”, o pedido foi aceite, “mantendo a Morais Leitão toda a confiança em Carlos Osório de Castro e no seu trabalho. Estaremos a acompanhar o processo, com a serenidade e a discrição habituais, incluindo na defesa dos nossos clientes por todos os meios legais e nas instâncias próprias”, disse à Advocatus fonte oficial da firma.
Osório de Castro era sócio da Morais Leitão – uma das maiores sociedades de advogados do mercado que conta com cerca de 250 advogados e 48 sócios atualmente – desde 2006. É um dos advogados mais bem referenciados na área do mercado de capitais e de fusões e aquisições. Foi ainda fundador do escritório Osório de Castro, Verde Pinho, Vieira Peres, Lobo Xavier e Associados (de 1989 a 2005) e Professor na Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto (de 1982 a 2002), onde lecionou a cadeira de mercado de capitais. Foi ainda membro da Comissão de Revisão do Código do Mercado de Valores Mobiliários e é classificado como “Senior Statespeople” em Corporate/M&A e Capital Markets pelo Chambers Global (2025), destacado pela sua expertise em transações complexas e cross-border. “Um advogado excecional com conhecimento profundo e capacidade para resolver questões difíceis”, segundo escreve o ranking da Chambers Europe, um dos mais reputados do mercado. Domina fluentemente o inglês, francês e alemão e é autor de livros e artigos sobre direito societário e insolvência, incluindo o anteprojeto do Código da Insolvência.
Católico, politicamente alinhado ao centro-direita, Osório de Castro gosta de manter um perfil reservado, tanto que são muito poucas as entrevistas dadas a meios de comunicação social. Porém, ao Quem é Quem?, publicação do Jornal Económico ligada ao mercado da advocacia, admitia ter ” sorte de ter como amigo e cliente o maior empresário de futebol do mundo. Em Portugal, os génios não abundam, nem sequer no futebol”.
A ligação com o Futebol Clube do Porto e com Cristiano Ronaldo
Natural de Nampula, Moçambique, nasceu em 1959 e formou-se em Direito na Universidade de Coimbra com média de 18 valores, em 1982, onde chegou a corrigir professores logo no 1º ano da licenciatura. Portista fervoroso, sempre teve uma ligação próxima ao FC Porto e a Jorge Mendes, empresário que o recrutou para vários negócios mediáticos no futebol, lidando com clientes como Cristiano Ronaldo, José Mourinho, Deco, Falcão, Di Maria, Luiz Felipe Scolari e o colombiano James Rodríguez.
Carlos Osório de Castro chegou ao mundo do futebol através da sua paixão pelo FC Porto. Raramente falhava um jogo no antigo Estádio das Antas e, na década de 1990, ajudou na preparação dos estatutos da sociedade anónima dos dragões, juntamente com o seu amigo de longa data e colega nos seus dois escritórios, António Lobo Xavier. Fazia parte do círculo próximo de Jorge Nuno Pinto da Costa, acompanhando de perto a equipa nos jogos em casa e nas competições europeias. E é precisamente nesses tempos áureos dos dragões que o advogado conhece o empresário Jorge Mendes e começa a trabalhar como seu advogado.
A partir daí, o escritório de Carlos Osório de Castro passou a tratar de todos os grandes negócios de Jorge Mendes. Entre eles, é inevitável destacar Cristiano Ronaldo, que se tornou o centro da atuação da Gestifute, empresa de Mendes.
Osório de Castro conheceu Ronaldo em março de 2004, já depois de o futebolista ter trocado o Sporting pelo Manchester United. Osório de Castro iniciou então o que seria uma longa ligação de confiança. E, a partir daí, Osório de Castro passou a acompanhar cada passo de Ronaldo. A ascensão de Ronaldo levou o futebolista a rodear-se de um núcleo muito restrito de profissionais a quem confiou a gestão da sua fortuna. E tudo o que é contrato, do futebol à hotelaria, da publicidade a assuntos pessoais, foi visto e revisto pelo advogado.

Saiu da sombra em dezembro de 2016, quando CR7 foi notícia em todo o mundo, suspeito de fuga ao fisco, em Espanha. Ronaldo acabou por aceitar pagar 18,8 milhões de euros, com pena de prisão suspensa de dois anos por fraude fiscal.
Em 2018, Madrid acabou por levantar as suspeitas sobre o advogado português. Mas foi decidido pela justiça espanhola que não existia nenhum indício da sua participação nos factos investigados. À data, disse que trabalhava com Ronaldo em Portugal. Nesse mesmo ano, Carlos Osório de Castro volta a ser referido em notícias devido ao seu envolvimento no acordo que Ronaldo acabou a fazer com Kathryn Mayorga, em Las Vegas, em 2010, num caso de alegada violação.
Foi em Nampula, no norte de Moçambique, onde o pai, Manuel Osório de Castro, exercia como advogado, que conheceu Carlos Queiroz, antigo selecionador nacional que haveria de defender no conturbado processo de saída da FPF, após o Mundial 2010.
Com a descolonização, a família regressou a Portugal e instalou-se em Vila Nova de Gaia. O pai abriu escritório na Praceta 25 de Abril, em frente à Câmara Municipal de Gaia, e Carlos frequentou o Liceu de Gaia, antes de rumar a Coimbra, onde conheceu Lobo Xavier.
O advogado, Belmiro e a Sonae
Com percurso umbilicalmente ligado à Sonae e às grandes batalhas do histórico empresário Belmiro de Azevedo, a Sonae tornar-se-ia praticamente a sua segunda casa durante os anos seguintes. Foi Osório de Castro quem recomendou depois António Lobo Xavier à Sonae. Os dois tornaram-se, desde aí, homens-chave no crescimento do grupo empresarial liderado por Belmiro de Azevedo. Na Sonae, Osório de Castro esteve ligado aos principais negócios, nacionais e internacionais. No litígio entre os herdeiros de Pinto de Magalhães, fundador da empresa, e Belmiro de Azevedo, defendeu o falecido gestor.
Já era uma figura mais do que reconhecida na sua área de atuação quando, em 2006, se deu a fusão do escritório portuense com a lisboeta Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva e Associados, alargando a área de influência. A Gestifute de Jorge Mendes já ocupava uma parte do tempo do advogado, mas nada que o impedisse de se dedicar com grande empenho a mais uma OPA. Carlos Osório de Castro foi o mestre da operação jurídica, com Lobo Xavier, da OPA da Sonaecom sobre a PT, em 2007.
Na Sonae, de resto, a influência alargou-se até ao círculo mais próximo de Belmiro de Azevedo, de quem se tornou um conselheiro pessoal.
Osório de Castro, administrador de empresas
Mas a relação com Jorge Mendes foi muito para além da de advogado/cliente. Osório de Castro deixou de ser apenas o advogado e conselheiro de Jorge Mendes para os seus negócios, para passar também a ser gestor de várias sociedades do grupo Mendes — tendo assim deveres e obrigações fiduciárias para com as sociedades e os respetivos acionistas. O advogado é administrador da Start BV, juntamente com um representante do Trust International Management, BV .
O advogado foi igualmente administrador da subholding Start SGPS, SA desde a fundação em abril 2008 juntamente com o casal Mendes, tendo sido presidente do conselho de administração da sociedade entre 2012 e 2020 em substituição de Jorge Mendes. Saiu do cargo em novembro de 2020 — regressando Mendes à liderança —, precisamente nove meses após a sua constituição como arguido. Osório de Castro foi constituído arguido em março de 2020 na qualidade de gestor da Start BV e da Start SGPS, tal como as duas sociedades enquanto pessoas coletivas.
O que diz a defesa de Jorge Mendes e o que diz a acusação?
O advogado foi acusado na mesma investigação que envolve o empresário e a mulher, Sandra Mendes, todos acusados pelo MP por um crime de fraude fiscal relativo a uma doação. “O que está em causa é simples: este caso não tem nada a ver com a Operação ‘Fora de Jogo’ nem com o Football Leaks. Isto é um tema pessoal, familiar e sucessório”, explica Rui Patrício, advogado de Jorge Mendes. “E isto nada tem a ver com os negócios do futebol. O que se passa aqui é que foi feita uma doação do marido para a mulher, Sandra Mendes, em que o Jorge Mendes tem a preocupação de que, se lhe acontecer alguma coisa, metade do que tem seja para a sua mulher, já que este é o seu segundo casamento. Para esta não ficar prejudicada nas partilhas. Depois dessa doação, a mulher recebe as ações e entende que não quer ser sócia e quer saber o valor do que lhe foi doado. E decide vender a uma empresa do marido – não iria fazê-lo a uma empresa fora do circuto empresarial de Jorge Mendes. E recebe o valor. E como este casal – tal como tantos no nosso país – não separa as contas entre si, esse dinheiro é usado em conjunto e pelo Jorge porque a mulher não tinha necessidade de usar o dinheiro. E foi neste contexto de economia familiar comum que surge este contexto. Esta doação não foi simulada para fugir aos impostos, doação existiu mesmo“, explicou o advogado, também sócio da Morais Leitão.
O que está em causa é simples: este caso não tem nada a ver com a Operação ‘Fora de Jogo’ nem com o Football Leaks. Isto é um tema pessoal, familiar e sucessório”, explica Rui Patrício, advogado de Jorge Mendes. “E isto nada tem a ver com os negócios do futebol. O que se passa aqui é que foi feita uma doação do marido para a mulher, Sandra Mendes, em que o Jorge Mendes tem a preocupação de que, se lhe acontecer alguma coisa, metade do que tem seja para a sua mulher, já que este é o seu segundo casamento. Para esta não ficar prejudicada nas partilhas”
“A AT está a usar o processo-crime para obter o imposto que de outra forma não iria obter. E o Jorge decidiu avançar para o processo de pagamento para proteger a família. Não é nenhuma aceitação de culpa. E também para mostrar que sempre esteve de boa- fé porque nunca lhe foi dito que havia um problema tributário. Nada foi dito. A AT nunca fez uma liquidação, o Mendes nunca recebeu uma nota de liquidação e por isso nunca pudemos fazer uma reclamação graciosa. Falamos de 18 milhões de euros”.
As explicações surgem porque, no despacho de acusação a que o ECO teve acesso, os procuradores alegam que se tratou de uma doação fictícia que serviu para o casal evitar pagar 18 milhões de euros em IRS. Factos que estão relacionados com a doação de 49,9% da Start SGPS, a holding portuguesa de Jorge Mendes, à sua mulher em outubro de 2012 e o que aconteceu a seguir — com a recompra dessas ações por uma nova holding criada na Holanda, a Start BV.
O Ministério Público acredita que “através da atuação típica, ilícita e culposa dos arguidos Sandra Mendes, Jorge Mendes e Carlos Osório de Castro, estes dois últimos na qualidade de legais representantes das sociedades arguidas START, os arguidos cometeram um crime de fraude fiscal qualificada”, segundo a acusação.
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