Renováveis, redes e fatura: o que ‘liga’ e separa os partidos na energia
A aposta nas energias renováveis, redes e armazenamento é bastante consensual entre partidos. As maiores diferenças estão nas políticas relativamente à fatura energética.
A aposta nas energias renováveis é praticamente consensual nos programas apresentados pelos diferentes partidos para o próximo ciclo político, embora o ritmo proposto para o abandono dos combustíveis fósseis e para o alcance da neutralidade carbónica varie. A necessidade de um reforço nas redes, nas interligações e no armazenamento de energia também é uma constante nos programas. As maiores diferenças estão nas políticas relativamente à fatura energética, que vão desde a descida de impostos e reformulação de taxas até limites nos preços.
Do IVA a 6% a preços máximos, como descer a fatura
A AD indica que quer implementar o Plano de Ação para uma Energia Acessível apresentado pela Comissão Europeia e o estatuto de cliente eletrointensivo, que beneficia as empresas e foi recentemente aprovado pela CE. O mesmo partido acrescenta que quer rever o modelo da tarifa social da Energia, tendo em vista “o reforço da equidade”, sem detalhar de que forma pretende aplicar este princípio. O Governo atual mudou a forma de financiamento no ano passado ditando um possível aumento da fatura, mas já admitiu que podia usar verbas do Orçamento do Estado para evitar que o custo passe para os consumidores.
Todos os partidos à esquerda propõem aplicar à fatura da eletricidade uma taxa de IVA — Imposto de Valor Acrescentado mínima, de 6%, mas com diferentes abrangências. O PS quer esta taxa para todos os consumos eletricidade da potência contratada até 6,9 kVA, passando este regime a beneficiar 5,3 milhões de consumidores, em vez dos 3,4 milhões já abrangidos. O Livre, Bloco de Esquerda e PCP querem esta taxa mínima aplicada à eletricidade, gás engarrafado e também ao gás natural.
O PCP propõe ainda preços máximos para todos os tipos de energia, enquanto o PS propõe fixar o preço do gás engarrafado, com base numa proposta do regulador, que reavaliará periodicamente o limite de preço. O PCP quer ainda que os mercados regulados se mantenham tanto no setor da eletricidade como do gás.
Para as empresas, o PS propõe angariar financiamento europeu no Banco de Hidrogénio e no recém-anunciado Banco para a Descarbonização Industrial e reforçar os auxílios aos custos que as empresas têm com as licenças de carbono.
Diferentes horizontes para a descarbonização
O PS quer atingir a neutralidade carbónica até 2045, cinco anos antes do apontado pela AD e Iniciativa Liberal. O Bloco de Esquerda defende antecipar “de forma socialmente justa” as metas do roteiro que coloca a fasquia em 2050, “sem comprometer os indicadores de independência energética”. Os mais ambiciosos são o Livre e o PAN, que apontam para 2040 como o ano da neutralidade. AD, PS e PAN sublinham a intenção de aprovar uma Estratégia Industrial Verde no âmbito dos esforços de descarbonização, tal como previsto na Lei de Bases do Clima.
Do offshore ao nuclear, os ‘favoritos’ de cada partido
A AD quer “reforçar a aposta nas energias renováveis”. A coligação evidencia a intenção de lançar o leilão de energia eólica offshore, mas também avança várias referências a gases renováveis. Quer um regime legal e sistemas de apoio ao biometano, hidrogénio verde e combustíveis de aviação sustentáveis, executar o já delineado (e atrasado) Plano de Ação para o Biometano, o qual prevê a substituição de 10% do consumo de gás natural até 2030. Pretende ainda rever a Estratégia Nacional para o Hidrogénio, mas não indica em que sentido. Em paralelo, quer promover as biorrefinarias, valorizando a biomassa, através de uma atualização do plano nacional.
O PS quer prosseguir com investimento em renováveis, da solar à eólica, passando pela energia geotérmica, biomassa e gases sustentáveis, sendo que o leilão de eólico offshore e indústria associada também têm direito a menção. No que toca os gases renováveis, propõe leilões de compra centralizada e regulação da injeção na rede de gás, procurando assim garantir grandes investimentos.
O Chega pretende complementaridade entre fontes renováveis e nucleares, apontando para uma diversificação equilibrada do mix energético. A Iniciativa Liberal alinha no discurso das energias limpas, apesar de sublinhar que o abandono dos combustíveis fósseis deve ser feito de forma “gradual”. Aponta o “potencial único” de Portugal em relação ao hidrogénio verde, embora queira limitar os apoios públicos a projetos-piloto nesta área, e apoia ainda tecnologias emergentes como as baterias de lítio, os combustíveis sintéticos e a captura de carbono. O partido propõe leilões tecnologicamente neutros, focados em energia não fóssil, e defende um estudo da viabilidade da energia nuclear no país.
O Livre propõe uma maior aposta nas energias renováveis e que a refinaria de Leixões seja aproveitada para o fabrico de componentes para o eólico offshore, e recomenda seguir “de perto” os desenvolvimentos na tecnologia nuclear, em particular os pequenos reatores e a fusão nuclear. O Bloco de Esquerda abraça as energias renováveis mas opõe-se à expansão da produção elétrica a partir de biomassa, e defende leilões de “modesta dimensão” para a energia eólica, dada a sua penetração, assim como a revisão da sua remuneração “em forte baixa”. O PCP fala de uma “perda de peso” das energias fósseis e crescente presença das renováveis.
O PAN apoia as energias renováveis mas quer impedir que centrais fotovoltaicas sejam instaladas em áreas protegidas. Por fim, defende que sejam eliminados todos os subsídios e apoios públicos aos combustíveis fósseis até 2030, canalizando os apoios para a produção de energias renováveis, uma visão na qual é acompanhado pela IL. O PCP pede a revisão completa dos incentivos, subsídios e outros apoios às empresas produtoras de eletricidade, seja no domínio da produção “convencional”, seja no das energias renováveis.
Dois dos conceitos mais consensuais são armazenamento e solar descentralizado. Todos os partidos, exceto o PCP, referem a intenção de reforçar a aposta em armazenamento ou mesmo na cadeia de baterias, assim como no autoconsumo e produção descentralizada.
Redes e soberania energética na mira
O reforço das interligações energéticas no quadro ibérico e da União Europeia, em particular o reforço da rede elétrica com Espanha, consta do programa da AD. O PS quer modernizar a rede elétrica, reforçar as interligações com Espanha e insiste na construção de um novo gasoduto para os gases renováveis entre Portugal, Espanha e o resto da Europa. O Chega quer apostar em interligações energéticas não só com a Europa, mas também com África e com o continente americano. A IL atribui prioridade a novas interligações elétricas entre França e a Península Ibérica, o Livre olha para a ligação entre Portugal e Espanha e o PAN generaliza, defendendo ligações transeuropeias.
Sobre soberania, o Chega propõe a criação da estratégia nacional para a soberania energética. O PS defende uma soberania energética a nível europeu, sendo que a IL partilha desta visão, apontando as interligações com a Europa como um garante de soberania energética. Para o PCP, a soberania nesta área passa por o Estado reassumir o controlo da EDP, Galp e REN. O Livre propõe ainda a criação de uma empresa pública vocacionada para a promoção das energias renováveis e para a gestão de uma rede nacional de transportes públicos sustentável, falando ainda da eventual criação de uma empresa pública focada no hidrogénio verde, a Hidrogénio de Portugal.
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