Portugal é o segundo país da Zona Euro com o maior agravamento orçamental entre 2025 e 2026
Contas públicas trocam excedentes por défice com agravamento de 0,7 pontos percentuais do saldo orçamental em dois anos, segundo provisões de Bruxelas. Na área do euro, só a Estónia está pior.
Portugal vai registar o segundo maior agravamento do saldo orçamental entre os 20 países da Zona Euro entre 2025 e 2026, depois de dois anos de excedentes, segundo as previsões económicas de primavera da Comissão Europeia, divulgadas esta segunda-feira.
As contas públicas portuguesas deverão passar de um excedente equivalente a 0,1% do PIB em 2025 para um défice de 0,6% em 2026, uma deterioração de 0,7 pontos percentuais. Entre os Estados-membros da área do euro, a dimensão deste agravamento orçamental só é superado pela Estónia, que deverá ver o seu saldo orçamental agravar-se em 1 ponto percentual, passando de um défice de 1,4% do PIB em 2025 para 2,4% em 2026.
As projeções divulgadas na segunda-feira por Bruxelas confirmam a viragem nas contas públicas portuguesas, que após um ciclo de excedentes orçamentais, regressarão a território negativo já no próximo ano. O agravamento de 0,7 pontos percentuais entre 2025 e 2026 coloca Portugal numa trajetória inversa à que tem seguido nos últimos anos.
Os riscos para as perspetivas orçamentais são negativos e estão relacionados, nomeadamente, com os pedidos de reequilíbrio financeiro das parcerias público-privadas em curso e com as vulnerabilidades financeiras do setor das empresas públicas.
Segundo o documento da Comissão Europeia, o agravamento das contas públicas portuguesas resulta principalmente de medidas expansionistas adotadas pelo Governo. “As medidas de política orçamental colocam o excedente orçamental sob pressão”, aponta Bruxelas, destacando “o impacto das medidas de política fiscal, como a redução da taxa do imposto sobre o rendimento das empresas e o investimento público financiado por empréstimos do PRR”.
O relatório da Comissão Europeia refere ainda que “os riscos para as perspetivas orçamentais são negativos e estão relacionados, nomeadamente, com os pedidos de reequilíbrio financeiro das parcerias público-privadas em curso e com as vulnerabilidades financeiras do setor das empresas públicas.”
As projeções da Comissão Europeia vêm confirmar o que já tinha sido antecipado por outras instituições nacionais. O Banco de Portugal, no Boletim Económico de dezembro já alertava para esta inversão. “A atual projeção aponta para um saldo de -0,1% do PIB em 2025, inferior aos 0,3% estimados no OE2025” e, “nos anos seguintes, a manutenção da situação orçamental deficitária é explicada pelos efeitos das medidas permanentes já adotadas, que impactam tanto a despesa pública como a receita fiscal“, lê-se no documento produzido pela entidade liderada por Mário Centeno.
Além disso, o mesmo documento do Banco de Portugal refere que “ao longo do horizonte [até 2027], a orientação da política orçamental é expansionista e pró-cíclica, refletindo-se numa deterioração acumulada do saldo primário estrutural superior a 2 pontos percentuais do PIB nos anos de 2024 a 2027, num contexto em que o PIB permanece acima do seu potencial”.
Também o Conselho de Finanças Públicas (CFP), no seu relatório de “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2025-2029”, publicado em abril, alertava para este cenário, projetando “um défice de 1% do PIB” para 2026, um valor ainda mais pessimista que o agora previsto por Bruxelas.
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Portugal deixa grupo de países com excedentes orçamentais
Com a deterioração prevista para as contas públicas, Portugal deixará de integrar o grupo de países com excedente orçamental, que em 2025 incluirá apenas cinco Estados-membros da Zona Euro: Chipre (3,5%), Grécia (0,7%), Irlanda (0,7%), Luxemburgo (-0,4%) e Portugal (0,1%).
No conjunto dos países da União Europeia, a situação orçamental deverá melhorar ligeiramente. O número de países com défice excessivo (superior a 3% do PIB) deverá passar de 11 em 2025 para nove em 2026, segundo as previsões da Comissão Europeia. Contudo, o défice médio da União Europeia continuará a subir ligeiramente, atingindo 3,4% do PIB em 2026.
“Após cair para 3,2% do PIB (3,1% do PIB na Zona Euro) em 2024, espera-se que o défice público geral da União Europeia aumente em mais de 0,1 pontos percentuais em 2025 e apenas marginalmente em 2026, atingindo 3,4% do PIB em 2026 (3,3% na Zona Euro)”, indica o documento de Bruxelas.
A Comissão Europeia não antecipa que Portugal venha novamente a incumprir com as regras orçamentais europeias, e menos ainda que a situação orçamental do país fique descontrolada. Porém, lembra que a ativação da cláusula de salvaguarda nacional do Pacto de Estabilidade e Crescimento, que proporciona flexibilidade em 2025-2028 para aumentar as despesas com a defesa, se concretize a partir de 2026, o que fará com que a despesa dos Estados-membros aumentem.
Apesar do agravamento orçamental, Portugal será o sexto país com maior crescimento entre os 20 Estados-membros da Zona Euro em 2026, segundo as projeções da Comissão Europeia.
Por isso, Bruxelas salienta que, para o agregado dos países europeus, “espera-se que este impacto seja amplamente compensado pelas medidas de consolidação adicionais necessárias para cumprir os requisitos do quadro orçamental da União Europeia.”
A mesma preocupação já tinha sido manifestada pelo Banco de Portugal em dezembro. “Na ausência de novas medidas de contenção da despesa ou de aumento da receita, o cumprimento das novas regras orçamentais europeias poderá estar comprometido”.
Apesar destes avisos, a Comissão Europeia reconhece que a dívida pública portuguesa continuará a sua trajetória descendente, embora a um ritmo mais lento, prevendo uma redução para 91,2% do PIB em 2025 e 86,5% em 2026, valores ainda bem acima da média da Zona Euro.
Crescimento económico acima da média europeia
Apesar do agravamento orçamental, Portugal mantém perspetivas de crescimento económico positivas. A Comissão Europeia prevê que a economia portuguesa cresça 1,8% em 2025, acelerando para 2,2% em 2026, substancialmente acima da média da Zona Euro (0,9% e 1,4%, respetivamente).
Este desempenho coloca Portugal como o sexto país com maior crescimento entre os 20 Estados-membros da Zona Euro em 2026, atrás apenas de Malta (4,0%), Lituânia (3,1%), Croácia (2,9%), Chipre (2,5%) e Irlanda (2,5%).
“O crescimento do PIB deverá permanecer robusto em 2025 (1,8%) e acelerar em 2026 (2,2%), sustentado pelo consumo privado e investimento”, destaca o relatório da Comissão Europeia, que aponta ainda que “os recentes cortes nas taxas de juro da BCE estimulam o consumo privado e os investimentos”.
As projeções da Comissão Europeia colocam Portugal num cenário de transição orçamental crítica, com o saldo público a deteriorar-se de um excedente de 0,1% do PIB em 2025 para um défice de 0,6% em 2026. Este agravamento de 0,7 pontos percentuais, o segundo maior na Zona Euro, contrasta com as metas do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), que previa um excedente de 0,3% no próximo ano, e também com o programa eleitoral da AD, que projetava um saldo positivo de 0,1% em 2026.
O desafio imediato para a AD e para o Governo será conciliar o estímulo económico com a disciplina fiscal exigida pelo Pacto de Estabilidade.
A divergência reflete o caráter expansionista das medidas do Governo de Luís Montenegro, incluindo a redução do IRC de 21% para 20% em 2025 e cortes progressivos no IRS até 2029, num total de 2.000 milhões de euros. Bruxelas alerta que estas políticas, combinadas com o investimento público via Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), pressionarão as contas públicas, num contexto em que o crescimento económico projetado (1,8% em 2025 e 2,2% em 2026) fica abaixo das expectativas da AD (2,4% e 2,6%, respetivamente).
O quadro macroeconómico da AD, alinhado com o OE2025, assenta em quatro eixos: desagravamento fiscal estrutural, modernização do Estado, aumento da produtividade e execução acelerada do PRR. Contudo, as previsões da Comissão Europeia sugerem que o impacto destas medidas no défice será maior do que o previsto pelo Governo. Enquanto o Executivo antevê uma dívida pública de 93,3% do PIB em 2025, Bruxelas projeta uma redução mais acentuada, para 91,2% em 2025 e 86,5% em 2026, ainda assim acima da média da Zona Euro.
O desafio imediato para a AD e para o Governo será conciliar o estímulo económico com a disciplina fiscal exigida pelo Pacto de Estabilidade. A Comissão Europeia reconhece que a dívida mantém uma trajetória descendente, mas sublinha que a orientação expansionista poderá comprometer a consolidação orçamental, tal como alertado pelo Banco de Portugal (-2 pontos no saldo primário estrutural até 2027).
A execução integral do PRR (6,8 mil milhões em 2025) e a contenção da despesa corrente surgem como fatores críticos para mitigar estes riscos. Num contexto externo marcado por incertezas geopolíticas e protecionismo comercial, o sucesso do plano dependerá da capacidade de transformar o crescimento projetado em ganhos de competitividade, sem desequilibrar as contas públicas.
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