UE recebe quase 50% do gás natural liquefeito dos EUA. Há “risco relevante”, defendem analistas

O gabinete de estatística europeu assinala uma diminuição das importações de gás e produtos petrolíferos russos. Contudo, os EUA passam a dominar no gás natural liquefeito.

As importações da União Europeia de combustíveis fósseis russos caíram no primeiro trimestre de 2025, em comparação com o trimestre homólogo de 2021. É verdade para os produtos petrolíferos, gás natural e gás natural liquefeito (GNL), embora neste último a descida seja muito ligeira e os Estados Unidos tenham ganhado a dianteira, com um peso de quase 50% nas importações deste gás.

Os analistas consultados pelo ECO/Capital Verde consideram que os EUA continuam a ser um parceiro mais fiável que a Rússia, apesar da imprevisibilidade política que o presidente norte-americano, Donald Trump. Mas o ideal, defendem, é continuar o caminho da diversificação. Já em relação a continuar a diminuir as importações da Rússia, concordam que é possível, embora alguns sejam mais cautelosos face ao efeito que poderia ter nos preços da energia.

Segundo dados do Eurostat, entre o primeiro trimestre de 2021 e o primeiro trimestre de 2025, verificou-se uma redução de cerca de 50% nas importações de gás natural da Rússia pela UE, o que resultou também numa redução da dependência energética de 40% para cerca de 20%. Contudo, a Rússia ainda pesa 17% nas importações de gás natural e 19% no que diz respeito ao gás natural liquefeito.

A redução da dependência de gás russo [a partir de 2025] é economicamente possível”, defende o think tank Bruegel, que considera que os desenvolvimentos estão dependentes de vontade política. “É crítico que se estabeleçam regulações vinculativas para cessar as importações de gás russo e assegurar que os governos nacionais as aplicam”, conclui a analista do Bruegel, Ugnė Keliauskaitė, ao mesmo tempo que admite que “a procura da Europa por gás deverá cair, o que permite à Europa ser mais seletiva em relação às suas fontes”.

Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, concorda que “a UE tem condições para continuar a reduzir as importações de energia fóssil da Rússia em todos os segmentos”.

Já Vítor Madeira, analista na XTB, descreve como “questionáveis” as condições para diminuir a dependência, uma vez que “uma transição total para outros fornecedores ou para fontes renováveis não parece compensar em termos económicos, uma vez que a aceleração desse processo teria um impacto agressivo nos preços”. Contudo, vê ainda margem para investir em contratos de longo prazo com fornecedores como os Estados Unidos, o Qatar e países africanos.

Henrique Valente fala de “graus de dificuldade distintos”. Enquanto diminuir as importações de carvão e de petróleo foi mais simples, “o verdadeiro desafio está no GNL, cuja redução é limitada por contratos de longo prazo ainda em vigor com empresas russas e pela ausência, até agora, de sanções formais”. Medidas políticas mais firmes, diversificação e uma aposta reforçada na transição energética, de forma a reduzir os consumos de gás, são as soluções apresentadas.

GNL desce apenas ligeiramente. EUA ganham

As importações de gás natural liquefeito a partir da Rússia desceram de 22% no primeiro trimestre de 2021 para 19% no primeiro trimestre de 2025. A Rússia manteve-se desta forma no segundo lugar na lista de parceiros dos quais a União Europeia importa este gás, com uma ligeira quebra. Sobre a descida ligeira, o analista da XTB, Vítor Madeira, assinala que se relaciona com “o facto de o GNL representar apenas uma fração do total de gás natural importado pela UE“. Ao mesmo tempo, relata Henrique Valente, analista da ActivTrades Europe, ao contrário do gás natural transportado por gasoduto, não há sanções diretas ao GNL russo por parte da UE, devido à falta de alternativas.

Em 2024, a UE aumentou mesmo as importações de GNL russo para 16,5 milhões de toneladas, um valor recorde, assinala Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa. Uma subida que foi reflexo da necessidade de garantir segurança energética a curto prazo, indica.

A alteração mais relevante no âmbito das importações deste gás foi a subida dos Estados Unidos, de 24% para 48%, que contrabalançou uma queda relevante da Nigéria, de 16% para 5%.

A sobredependência de uma só fonte é arriscada“, considera Ugnė Keliauskaitė, analista do Bruegel. Para Paulo Rosa, a atual quota de 48% “constitui um risco relevante“, já que deixa o bloco europeu “vulnerável” a alterações políticas, económicas ou logísticas nos EUA, como mudanças de governo, alterações nas prioridades energéticas internas ou restrições à exportação. Ao mesmo tempo, “uma dependência excessiva pode afetar a estabilidade de preços e limitar o poder negocial da UE”, continua Rosa.

“Qualquer dependência significativa de um fornecedor externo representa um risco estrutural para a segurança energética” e “os Estados Unidos não são exceção a essa regra”, reforça Vítor Madeira. Contudo, “é preferível para a UE depender de um parceiro aliado, como os EUA, do que de um fornecedor como a Rússia”, ressalva Madeira.

A analista do Bruegel também considera que “comparando a Rússia e os Estados Unidos, o GNL dos Estados Unidos é uma fonte de gás muito mais confiável“. Henrique Valente concorda, “apesar da atual política protecionista dos EUA”, pois “a instabilidade política do Kremlin e o uso da energia como instrumento de pressão representam uma ameaça significativamente mais grave”.

Vítor Madeira sublinha ainda que o GNL representa apenas cerca de 37% do total do gás consumido na UE, pelo que “podemos concluir que a UE se baseia numa matriz de fornecimento relativamente diversificada, conseguindo mitigar o risco de dependência exclusiva de um único fornecedor”. Já Valente acredita que faz sentido continuar a diversificar, afastando-se da situação de um fornecedor dominante.

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As importações de gás natural a partir da Rússia desceram dos 48% registados entre janeiro e março de 2021 para 17% no período homólogo deste ano. A Argélia tornou-se assim o maior parceiro, com uma quota de 30% (mais 5 pontos percentuais), seguida da Noruega, que aumentou 11 pontos pontos percentuais para os 26%.

De acordo com o Bruegel, na Europa, os maiores volumes do gás liquefeito russo têm como destino a Hungria e a Eslováquia, embora Espanha, Bélgica e França importem “volumes significativos” deste combustível. “Estes países não estão, contudo, dependentes do gás russo. Importam-no porque compensa financeiramente”, escreve o mesmo analista.

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No início de 2021, a Rússia era o principal fornecedor de combustíveis petrolíferos da União Europeia, com uma quota de 29%, igual à que cabia a “outras nações” e muito acima dos 8% que contribuíam os Estados Unidos, Noruega e Cazaquistão, individualmente. No entanto, na sequência da guerra com a Ucrânia, o bloco europeu baniu as importações de petróleo em dezembro de 2022, ação à qual se seguiu um embargo em relação aos produtos petrolíferos refinados. Neste sentido, as importações destes combustíveis a partir da Rússia caíram para uma fatia mínima, de 2%.

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O petróleo russo só chega à União Europeia através do corredor de Druzhba, que está isento de sanções. No entanto, alerta o Bruegel, o petróleo russo representa mais de 80% das importações de petróleo para a Eslováquia e Hungria.

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