PSI dispara 22% no primeiro semestre, mas já está com o pé no travão para o resto do ano
O PSI brilhou como há muito não se via, mas a história mostra que este brilho não dura o resto do ano. Apesar dos dividendos generosos, o entusiasmo pode ser passageiro.
A bolsa portuguesa brilhou nos primeiros seis meses do ano. Num semestre marcado por incertezas geopolíticas, receios de recessão e queda a pique das taxas de juro na Zona Euro à conta de sete cortes de 25 pontos base do Banco Central Europeu, o principal índice da Euronext Lisboa encerrou os primeiros seis meses do ano com ganhos de 21,8% (incluindo dividendos), assinalando o melhor primeiro semestre desde 2007.
Há 18 anos que o PSI não arrancava um ano com tanta força, eclipsando praticamente os seus pares europeus como o francês CAC40 e o neerlandês AEX, que ficaram a léguas de distância deste sprint bolsista português. O PSI apenas não foi capaz de bater o espanhol IBEX35, que encerrou os primeiros seis meses com uma valorização de 23,35%.
O entusiasmo do principal índice acionista da praça portuguesa tem rostos bem definidos. CTT e BCP foram as estrelas da Euronext Lisboa, ao valorizarem 43,38% e 48,72%, respetivamente, enquanto o restante mercado europeu tentava acertar passo com a inflação renitente e as hesitações dos bancos centrais. Do lado oposto, apenas três empresas do PSI fecharam os primeiros seis meses no vermelho: Navigator, EDP Renováveis e Altri.
Nos últimos 30 anos, sempre que o primeiro semestre do PSI fechou com ganhos acima dos 20% – situação que apenas se verificou em quatro dos últimos 30 anos até 2024 – o desempenho do índice no segundo semestre ficou sempre abaixo dos ganhos do primeiro semestre.
Para o segundo semestre, as expectativas são muitas. Mas a história e o contexto macroeconómico atual apontam para um abrandamento da euforia registada na primeira metade do ano, deixando antever um desempenho mais moderado do PSI até ao final do ano.
De acordo com dados recolhidos pelo ECO dos últimos 30 anos, embora o desempenho do PSI no primeiro e no segundo semestre esteja historicamente bem distribuído – registando-se 15 ocasiões em que o primeiro semestre superou o segundo semestre e 15 ocasiões em que se observou o contrário –, há um detalhe que merece atenção redobrada.
Sempre que o primeiro semestre fechou com ganhos acima dos 20% – situação que apenas se verificou em quatro dos últimos 30 anos até 2024 – o desempenho do segundo semestre ficou sempre abaixo dos ganhos do primeiro semestre; e em metade dessas ocasiões (em 1998 e 2007), em que o PSI valorizou mais de 20% nos primeiros seis meses, o segundo semestre fechou com perdas. Esta tendência histórica sugere que a exuberância atual pode não se manter nos próximos meses, tal como também perspetivam os especialistas contactados pelo ECO.
“O PSI está claramente num momento excecional”, explica Virgílio Garcia, gestor do fundo Sixty Degrees Ações Portugal. “Mas é importante perceber que estes números excecionais raramente se sustentam durante um ano completo. A história mostra-nos que após primeiros semestres muito positivos, o mercado tende a consolidar.”
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Valorização atrativa mas cautela é palavra de ordem
Apesar dos receios de uma possível moderação nos próximos seis meses, o PSI apresenta argumentos sólidos para atrair investidores. O índice está a negociar “mais barato” que muitos mercados europeus, apresentando um rácio Price-to-Earnings (PER) de 12,21 vezes, que compara favoravelmente com um PER de 16,75 do francês CAC40, 18,83 do alemão DAX ou de 20,31 do neerlandês AEX.
“Neste momento não trocava a bolsa portuguesa por nenhuma bolsa europeia”, confessava Virgílio Garcia a 18 fevereiro, em entrevista ao ECO sublinhando que o índice português transacionava com desconto de alguma forma substancial face aos comparáveis europeus. Desde então, o PSI acumulou 11,1 pontos percentuais a mais que o DAX e 16,4 pontos percentuais a mais que o índice pan-europeu Stoxx Europe 600.
A tradição de pagar dividendos elevados na bolsa de Lisboa tem permitido aos investidores uma remuneração adicional que representa uma importante fatia dos ganhos.
Além da valorização atrativa, o PSI destaca-se pela generosidade na distribuição de dividendos. Com uma taxa de dividendo média de 4,29%, o índice nacional posiciona-se como um dos índices mais generosos da Europa, oferecendo aos investidores uma remuneração sólida mesmo em cenários de menor valorização das cotações.
“A tradição de pagar dividendos elevados na bolsa de Lisboa tem permitido aos investidores uma remuneração adicional que representa uma importante fatia dos ganhos”, realça Carlos Pinto gestor do fundo Optimize Portugal Golden Opportunities. “Mesmo que a valorização desacelere, esta componente mantém-se como um fator diferenciador importante”, diz.
Apesar deste ponto positivo e do otimismo que deposita nos fundamentais das empresas portuguesas, o gestor destaca que “não podemos ignorar os ventos contrários que sopram da conjuntura internacional”.
Carlos Pinto aponta particularmente para as tensões geopolíticas e o abrandamento económico global como fatores que podem pressionar o desempenho das cotadas nacionais no segundo semestre. “A incerteza geopolítica e as crescentes tensões comerciais resultaram num aumento de protecionismo que pode impactar negativamente os mercados”, adverte.
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Vítor Madeira, analista da XTB, adota uma posição mais cautelosa, sublinhando que “avaliar o PSI de forma isolada pode ser injusto, uma vez que este índice inclui várias empresas com elevados dividendos” cujo pagamento tem impacto direto nas cotações.
“Se o clima de otimismo se mantiver, o PSI poderá apresentar uma melhoria progressiva, mas é improvável que mantenha o ritmo frenético do primeiro semestre”, projeta Vítor Madeira. O analista destaca que o índice tem beneficiado “tanto do abrandamento da inflação como pelas expectativas favoráveis quanto ao desempenho futuro das empresas”, mas alerta que estes fatores podem não se manter indefinidamente.
Independentemente da direção que o PSI possa tomar nos próximos meses, a política de dividendos generosa das cotadas nacionais oferece aos investidores uma proteção adicional. Com empresas como a Nos a oferecer taxas de dividendos acima de 10% e de mais quatro cotadas a negociarem com taxa de dividendos acima dos 5%, o mercado português mantém-se atrativo mesmo em cenários de menor valorização.
Os números excecionais do primeiro semestre criaram expectativas elevadas, mas é importante manter os pés bem assentes na terra. O mercado português tem qualidade, mas a sustentabilidade destes ritmos de crescimento ao longo de um ano completo é historicamente rara.
Entre as apostas de Virgílio Garcia para o segundo semestre continuará a estar a Nos, “que deverá continuar a beneficiar da sua forte presença no mercado doméstico e da sua reduzida exposição a tensões geopolíticas”. Além disso, “no próximo reporte de resultados, já deverão começar a ser refletidos os efeitos da aquisição da Claranet, cuja integração estimamos positiva.”
O gestor, que fez do Sixty Degrees Ações Portugal o fundo de ações nacionais mais rentável de 2024, aponta ainda a Galp como uma aposta para o segundo semestre. “Após um primeiro semestre dececionante, a possibilidade de virmos a assistir a novas subidas no preço do petróleo, fruto das tensões geopolíticas latentes, poderão ajudar a melhorar o valor dos ativos na Namíbia e o encontrar de compradores acima do que atualmente descontamos.”
O PSI arranca assim o segundo semestre numa posição invejável: com o melhor primeiro semestre em quase duas décadas, valorizações atrativas face aos pares europeus e uma política de dividendos que faz inveja a muitos mercados desenvolvidos. Contudo, a lição da história e a prudência dos especialistas sugerem que os próximos meses podem exigir dos investidores uma dose extra de paciência.
“Os números excecionais do primeiro semestre criaram expectativas elevadas, mas é importante manter os pés bem assentes na terra. O mercado português tem qualidade, mas a sustentabilidade destes ritmos de crescimento ao longo de um ano completo é historicamente rara“, alerta Virgílio Garcia.
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