Só motivos de “força maior” podem interromper férias dos trabalhadores. Saiba quais

Empregador não deve contactar por qualquer meio durante os períodos de pausa. Apenas motivos de força maior como terramotos ou falta de energia justificam a interrupção. Coima pode ir até 9.690 euros.

Uma “urgência” criada pela empresa não justifica a interrupção do período de descanso do trabalhador, alerta a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) numa nota técnica publicada esta terça-feira em plena época de férias do verão.

A violação do artigo 199.º-A do Código do Trabalho que regulamenta o direito à desconexão constitui contraordenação grave e é punível com uma coima que pode ir até 9.690 euros em caso de dolo, segundo esclarecimentos prestados pelos advogados consultados pelo ECO.

O dever de abstenção de contacto não é, contudo, absoluto. Prevê-se uma “ressalva: o empregador pode contactar o trabalhador durante o seu período de descanso no caso de situações de força maior”, de acordo com o mesmo comunicado da ACT. Mas, neste caso, é feita uma clara distinção entre “as situações de urgência, criadas pelo empregador ou superiores hierárquico” e “situação de força maior”.

Assim, “uma situação de ‘força maior’ caracteriza-se pela sua ‘inevitabilidade’: será um acontecimento natural ou ação humana que, embora previsível ou até prevenido, não se pode evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências”, define a ACT.

Tratam-se de “situações e de acontecimentos que incidem sobre a empresa que são suscetíveis de causar a sua destruição grave ou danificação, imprevisíveis, estranhas à vontade do empregador e que este não foi capaz de afastar, como são o caso de terramoto, incêndio, inundação, intempérie, falta de energia”, exemplifica. Nestes casos, indica, “pretende-se salvaguardar a viabilidade da empresa e a sua contínua laboração, que irá proteger os postos de trabalho”.

No entanto, notam os peritos da ACT, “não se consideram como ‘situação de força maior’, para efeitos de inexigibilidade de observância do dever de abstenção de contacto, as situações de urgência, criadas pelo empregador ou superiores hierárquicos, que pudessem ser resolvidas dentro do horário de trabalho do trabalhador”.

O dever de abstenção de contacto por parte da entidade empregadora abrange qualquer “comunicação ou tentativa de comunicação que interrompa o gozo pleno do direito ao descanso do trabalhador, independentemente do meio pelo qual é efetuada, incluindo telefone, visitas, mensagens de correio eletrónico, notificações de chat, pedidos de reunião, entre outros“, elenca a ACT.

A este propósito, a ACT cita Leal Amado para esclarecer que “o dever de abstenção de contacto implica ‘do not disturb!‘ e é violado sempre que é dirigida uma mensagem ao trabalhador, mesmo que não seja a solicitar uma resposta nem a determinar uma ação imediata, uma vez que ‘a norma legal impõe uma abstenção de contacto, não uma abstenção de emitir ordens ou de formular questões'”.

Para além disso, o “dever de abstenção recai não apenas sobre o empregador em sentido estrito”. “Pode também estar em causa nas situações em que um trabalhador é contactado, por exemplo, por um superior hierárquico. Contudo, o empregador é sempre o responsável pela violação do dever de abstenção de contacto, para efeitos, nomeadamente, de responsabilidade contraordenacional”, escreve o organismo liderado pela inspetora-geral Maria Fernanda Campos.

A violação do artigo 199.º-A do Código do Trabalho que regulamenta o direito à desconexão constitui contraordenação grave e é punível com multa que pode ir de 612 euros, no caso de uma empresa com uma faturação inferior a 500 mil euros, e até 9.690 euros, em caso de dolo e tratando-se de uma entidade com faturação superior a 10 milhões de euros, segundo Pedro Antunes, da CCA Law Firm, e Eduardo Castro Marques da Lower Firm.

“Ao empregador cabe organizar eficazmente os tempos de trabalho, por forma a garantir os direitos fundamentais dos trabalhadores ao descanso, à conciliação do trabalho com a vida privada e familiar e à saúde. Nesse sentido, o empregador deve adotar medidas que evitem comunicações profissionais fora do horário de trabalho, entre colegas, entre trabalhadores e clientes ou fornecedores“, recomenda a ACT.

No caso de trabalhadores com isenção de horário, Eduardo Castro Marques reconhece que “pode ser difícil compatibilizar o dever de abstenção de contacto, porque o empregador pode achar que o trabalhador ainda está em funções quando já poderá estar no seu período de descanso”.

No entanto, sublinha que “a isenção de horário não significa trabalhar mais horas por dia, mas apenas flexibilizar o horário de entrada e saída”.

“Se a jornada de diária é de oito horas, devem-se manter as oito horas ou então se o funcionário trabalhar 10 horas num dia, trabalha depois menos duas horas”, acrescenta.

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