CEO da Galp preocupado com fornecimento de gás a Portugal e à Europa

Galp tem estado a trabalhar com o Governo para garantir a importação de gás natural da Nigéria, o maior fornecedor de Portugal. Moçambique pode ser parte da solução para resolver escassez na Europa.

O CEO da Galp, Andy Brown, convocou os jornalistas para uma conferência de imprensa na quarta-feira para partilhar a sua visão sobre a crise energética que afeta o mundo. E se não é indiferente ao impacto da forte valorização do petróleo nos consumidores — contexto que também ajuda os cofres da petrolífera — está muito mais preocupado com o fornecimento de gás à Europa e o impacto nos preços da eletricidade.

“O gás, e por arrasto a eletricidade, é uma questão mais grave a longo prazo”, apontou o presidente executivo da petrolífera. Até porque, em termos relativos, a subida da cotação é muito superior. “Temos noção dos preços do petróleo, que são muito visíveis, mas não dos do gás. Numa base energética equivalente, os preços do gás estiveram ao dobro dos do petróleo. Antes eram metade dos do petróleo”.

“Os preços do petróleo subiram, mas os do gás subiram muito mais. E os preços do gás estão a determinar os preços da eletricidade neste momento. Para mim, o gás e a eletricidade são questões mais importantes do que o petróleo e mais urgentes para a Europa e Portugal resolverem“.

Só que a resolução desta questão é tudo menos fácil e pode demorar vários anos. O problema: “Cerca de 40% do gás natural consumido na Europa é importado da Rússia, cerca de 160 mil milhões de metros cúbicos por ano. Para substituir esse gás será necessário importar de outros países, talvez um pouco mais da Noruega, talvez um pouco mais da Argélia. Mas estes países não têm a capacidade excedentária que a Europa irá necessitar“.

A alternativa é o gás natural liquefeito (GNL), que se obtém baixando o gás até uma temperatura negativa de 160 graus. Só que “os projetos de GNL que arrefecem o gás para o tornar num líquido são caros e levam muitos anos a construir.”

A produção mundial de GNL tem vindo a aumentar a um ritmo de 4% ao ano, mas a maior parte já está comprometido através de contratos de fornecimento de longo prazo, sobretudo para países asiáticos. “Há contratos de curto prazo em GNL que podem ser desviados para a Europa, mas teriam de ser retirados da Ásia”, aponta o CEO da Galp. Mesmo conseguindo esse redirecionamento, “a Europa também sofre com o facto de ter uma capacidade insuficiente de regasificação” para o gás natural ser usado. A Península Ibérica tem capacidade excedentária de regasificação, mas a ligação por gasoduto a França é limitada.

Independência energética da Europa ainda distante

Andy Brown considera, por isso, difíceis de atingir as metas definidas pela União Europeia no REPowerEU de encher até 80% as reservas de gás natural até 1 de outubro. Para o responsável, esse objetivo só pode ser alcançado através de importações da Rússia, que continuam a existir. “Pode levar vários anos até à Europa se tornar totalmente independente da Rússia se quiser manter a atividade no gás que tem hoje“, sentenciou.

A pressão no gás natural tem depois repercussões no preço da eletricidade, uma vez que este é fixado com base no custo marginal do tipo de produção mais cara. E a maior parte do tempo é a produção a partir de gás natural. “É apenas uma parte pequena do total de produção de energia na península ibérica, mas define o preço“, explicou. Segundo dados da Agência Internacional de Energia, rondou os 30% em 2019, quer em Espanha, quer em Portugal.

Estamos preocupados que os preços da eletricidade possam continuar a subir a menos que seja encontrada uma solução de mais longo prazo.

Andy Brown

CEO da Galp

Andy Brown elogia a medida temporária proposta por Espanha e Portugal para limitar a cotação do gás (a 30 euros por MWh) usada no cálculo dos preços de eletricidade, e que ainda aguarda a luz verde de Bruxelas. Mas não chega. “Estamos preocupados que os preços da eletricidade possam continuar a subir a menos que seja encontrada uma solução de mais longo prazo“, afirma.

A pressão também existe sobre o fornecimento a Portugal, que importa todo o gás natural que consome, a maior parte da Nigéria (49,5%, em 2021). “Um dos nossos maiores esforços é assegurar o fornecimento de GNL da Nigéria, em particular perante sérias questões de segurança no delta onde muito do gás é produzido. Temos estado a trabalhar com a Europa e o governo português para garantir com os nigerianos que o gás continua a fluir e que conseguimos satisfazer as necessidades dos nossos clientes“, revelou Andy Brown.

O responsável lembrou ainda que a Argélia decidiu deixar de fornecer gás natural através do gasoduto de Marrocos e que entrega o gás contratado pela Galp através do Medgaz, que liga a Argélia a Espanha. Um gasoduto que “não tem grande capacidade excedentária”.

Moçambique faz parte da solução

“Gostávamos muito de receber mais gás da Argélia, mas isso dependerá dos argelinos”, diz o presidente executivo, que assumiu funções em fevereiro do ano passado. A Galp tem também um novo contrato de GNL que começa lá para finais do próximo ano, com a Venture LNG do Golfo do México. A diversidade de fornecedores é importante para “manter alguma segurança no abastecimento de gás a Portugal”, sublinha.

Os EUA também podem desempenhar um papel muito relevante, até porque têm grandes reservas (sobretudo shale gas) e como o custo é um quarto do que é na Europa, é economicamente viável convertê-lo em GNL e transportá-lo através do Atlântico. Mas o que Andy Brown gostaria de ver era “uma aceleração do GNL em Moçambique”, onde a Galp está envolvida. “Vamos ter uma unidade de GNL flutuante operada pela ENI, onde temos 10%, que começará este ano em Moçambique e vai reforçar o fornecimento”, afirmou.

Temos de ver o que acontece no futuro e a nossa capacidade de construir um projeto muito maior em Moçambique, que tem enormes reservas de gás. E o mundo precisa desse gás”, acrescentou.

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