Cristina Casalinho: “Estamos preparados para a subida de taxas de juro”
Apesar da subida das taxas por causa do BCE, a fatura com juros no Orçamento do Estado deverá continuar a cair nos próximos anos, assegura a presidente da agência que gere a dívida pública.
A taxa das obrigações portuguesas a dez anos acabou de superar os 2%, o que já não acontecia desde 2018. O diferencial para a dívida alemã voltou a alargar-se para cima dos 100 pontos base. Portugal está a pagar o dobro este ano para se financiar nos mercados. Os sinais de que a era do dinheiro barato está perto do fim estão todos aí, com os investidores a apostarem em grande numa inversão da política monetária do Banco Central Europeu (BCE) para travar a inflação. Portugal deve estar preocupado? “Estamos preparados para a subida de taxas de juro”, responde ao ECO Cristina Casalinho, presidente da agência que gere a dívida pública.
Com a inflação nos 7,5% na Zona Euro, cada vez mais o BCE está encostado à parede para começar a subir as suas taxas, logo a seguir ao fim do programa de compras de ativos. Os mercados monetários antecipam que até final do ano, o banco possa fixar a taxa diretora dos depósitos em zero (face aos -0,50% atuais).
Para os Governos que nos últimos anos beneficiaram de custos de financiamento muito baixos, o novo ciclo avizinha tempos desafiantes sobretudo para quem tem de lidar com uma dívida pública elevada, como o português. O endividamento tem vindo a cair em relação ao PIB, atingindo os 127% no final de março. Ainda assim, são 276 mil milhões de euros.
Mas Cristina Casalinho assegura que o país se preparou para este cenário de subida de juros que, mais tarde ou mais cedo, teria acontecer. “Estamos preparados para a subida de taxas de juro, visto nos últimos anos se ter procedido ao aumento da maturidade média da emissão de obrigações de médio e longo prazo, de modo a beneficiar de taxas de juro baixas durante o período de tempo o mais longo possível”, explica a gestora da dívida pública em declarações ao ECO.
"Estamos preparados para a subida de taxas de juro, visto nos últimos anos se ter procedido ao aumento da maturidade média da emissão de obrigações de médio e longo prazo, de modo a beneficiar de taxas de juro baixas durante o período de tempo o mais longo possível.”
Dados do IGCP mostram que a maturidade média da dívida aumentou dos seis anos para os oito anos na última década, conferindo maior grau de proteção ao país que tem de enfrentar agora uma escalada dos juros.
Maturidade média da dívida nos 8 anos
Fatura com juros continuará a cair nos próximos anos
Em 2013, o então primeiro-ministro Passos Coelho dizia que ia ser o ano do “Ministério da Dívida Pública”, tendo em conta o fardo de mais de 7,5 mil milhões que o país ia ter de suportar só para pagar os juros da dívida aos investidores.
Uma década depois, e longe da situação caótica que Portugal vivia com a troika em Lisboa, o Orçamento do Estado para 2022 antecipa um encargo de 6,285 mil milhões com o serviço da dívida, cerca de 2,2% do PIB (abaixo dos 2,4% de 2021).
Ainda que a subida dos juros venha a traduzir-se num de agravamento dos custos de financiamento – como já se sente, com as novas emissões a custarem 1,2%, o dobro de há um ano –, o IGCP vê a fatura com os juros no bolso dos contribuintes a continuar a cair este ano. “Bem como nos próximos anos, visto estar a substituir-se dívida emitida em 2012 ou 2013, com custos mais elevados que os presentes”, sublinha Casalinho.
“Apesar da elevação dos custos de financiamento, nos anos mais próximos, o custo médio da dívida pública total deverá continuar a reduzir-se (…), embora de forma mais gradual que no passado”, acrescenta. Aponta como exemplo a obrigação com reembolso em outubro deste ano que apresentou um custo de emissão em 2015 de 2,2% e está a ser substituída este ano por emissões com custo médio, até ano momento, de 1,2%. Mas o efeito está a esvanecer-se.
“Posição confortável” para reembolsar 8,4 mil milhões
Com metade do programa de emissões de obrigações já cumprido — o IGCP tende a concentrar mais emissões na primeira metade do ano, tendo em conta o calendário mais apertado pelas férias de verão e Natal na segunda metade –, Cristina Casalinho considera que o país “beneficia de uma posição confortável” para reembolsar os investidores em 8,4 mil milhões de euros de uma linha de obrigações que vence em outubro.
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