Exclusivo “A União Europeia é para defender valores, sim, mas interesses também”
Durão Barroso defende uma União Europeia que não sirva apenas para fazer "o bem universal". Numa entrevista exclusiva ao ECO/Pessoas, fala de Putin, de Merkel, de Macron e do futuro da Europa.
José Manuel Durão Barroso, 66 anos, foi presidente da Comissão Europeia durante uma década, viveu a crise financeira e agora, perante uma guerra que se segue a uma pandemia, admite que o ‘soft power’ da União Europeia já não é suficiente. “A União Europeia, que recebeu e bem o Prémio Nobel da Paz, e recordo sempre com emoção a ocasião em que tive a honra de proferir o discurso de aceitação em nome da UE, não é apenas para fazer o bem universal. A União Europeia é para defender os interesses europeus. Valores, sim, mas interesses também. Se os outros defendem os seus interesses por que razão, nós os europeus, não o faríamos também?”, afirma em entrevista exclusiva ao ECO/Pessoas, uma edição em papel que estará nas bancas na primeira semana de junho.
Num mundo que mudou no dia 24 de fevereiro, com a invasão da Ucrânia, Barroso afirma que, para uma projeção de poder, uma potência precisa de vontade e meios. “A Rússia tem a vontade, mas não tem os meios. Tem meios militares, mas não tem outros meios, nomeadamente económicos, para uma projeção de poder sustentável ao longo do tempo na área externa (…) a China tem a vontade e os meios, a Europa, a meu ver, tem os meios, mas não tem talvez, ainda, a vontade e a coerência necessárias”. Mas sinaliza que se vive um “momento de transição“.
Barroso admite que esperava uma intervenção da Rússia, “mas não esperava que lançasse um ataque sobre Kiev, uma invasão generalizada“. “É um erro de grandes proporções que Putin comete. É tipicamente o erro de um império que está a estender-se além do que deveria”, diz o antigo presidente da Comissão Europeia e atual presidente — não remunerado — da GAVI, a aliança global para a compra de vacinas contra a covid.
Durão Barroso é, na verdade, um europeísta convicto, mas reconhece as dificuldades, acentuadas pela nova geopolítica. O que será a União Europeia daqui por dez anos? “Eu penso que a União Europeia vai continuar a fazer progressos. Vai ser – repito – um progresso incremental e, talvez, sempre com a perceção que está um pouco atrás em relação às necessidades, mas vai fazer esse progresso”. Num mundo, acrescenta, que mudou. “A regionalização é o novo fenómeno, o novo nome da globalização. Muito possivelmente vamos assistir — aliás, já é visível na União Europeia — a uma perspetiva cada vez mais política em questões que antes eram tratadas sobretudo tecnicamente”, afirmou, numa entrevista que decorreu em Londres, por coincidência no dia 9 de maio, dia da Europa.
O atual chairman do Goldman Sachs Europa admite que, num futuro previsível, a UE vai continuar a ser um híbrido. “Quer dizer, vai ser algo que não é nem uma simples organização intergovernamental nem uma verdadeira federação”. E sintetiza: “Se a União Europeia fosse um estilo musical seria mais ‘free jazz’ do que música clássica. Mas funciona“.
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