Associações dizem que Portugal “falhará largamente” nos objetivos estratégicos e, por isso, insistem que sejam aumentados recursos
Portugal ainda vai ter que pedalar para conseguir atingir as metas das ciclovias assumidas pelo Governo, até 2030
Olhando para a Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável 2030 (ENMAC), prevê-se que, nos próximos três anos, sejam construídos até 5.000 quilómetros de ciclovias espalhadas pelo país como forma de fomentar a mobilidade suave. Em 2019, quando a estratégia foi aprovada em Conselho de Ministros, o Governo contabilizava 2.062 quilómetros de ciclovias existentes. No entanto, de acordo com os dados da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB), partilhados com o ECO/Capital Verde, o valor difere – fica-se pelos 750 quilómetros – o que implica cerca de 4.250 quilómetros por construir. O objetivo do Governo é chegar, a 2030, com 10.000 quilómetros de ciclovias construídas em todo o território nacional.
“Como se pode observar, ao ritmo atual, muito dificilmente será atingido o objetivo de 5.000 quilómetros construídos”, admite fonte oficial da FPCUB, entidade com assento no conselho consultivo da ENMAC.
Entre ciclovias (750 quilómetros), ecovias (500 quilómetros) e ecopistas (315 quilómetros), os dados da FPCUB revelam que já foram construídos um total de 1.565 quilómetros de vias cicláveis, estando outras 80 atualmente em construção. Questionado pelo ECO/Capital Verde sobre a legitimidade destes números, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática (MAAC) não quis comentar.
Mas a falta de infraestruturas não é o único motivo que pode desacelerar a concretização das metas de mobilidade suave no país. Uma das metas do ENMAC, que prevê que, até 2030, sejam aumentadas as deslocações em bicicleta em todo o país até representarem 10% do total de deslocações no meio urbano, pode não ser concretizável, porque este programa “continua sem recursos”, aponta a Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (MUBI). O objetivo era incentivar cerca de 500 mil portugueses a usar a bicicleta como forma de transporte, em linha com as metas europeias.
“Sem um muito maior empenho e outra atitude de parte do Governo, tudo indica que falhará largamente as metas intercalares para 2025”, dizem os responsáveis ao ECO/Capital Verde. Metas estas que incluem também o objetivo de reduzir sinistros envolvendo ciclistas em 25%, até 2025, e em 50%, até 2030.
pesar dos progressos lentos previstos no plano assumido pelo Governo, o gabinete de Duarte Cordeiro garante que “os diversos dados” recolhidos “demonstram uma utilização crescente destes veículos”, referindo que uma das medidas previstas para a impulsão deste tipo de mobilidade suave são os incentivos à aquisição de bicicletas atribuídos pelo Fundo Ambiental.
Desde 2019, ano em que estes incentivos começaram a ser atribuídos, o fundo entregou cerca de 250 mil euros para a aquisição de 1.000 bicicletas elétricas, valor que, em 2022, aumentou para 2,9 milhões destinados à compra de 6.350 bicicletas, de várias tipologias.
“Todos os anos têm sido feitos ligeiros ajustes ao regulamento, de forma a adequar os incentivos à procura e a acomodar a aprendizagem do ano anterior”, explica fonte oficial do MAAC ao ECO/Capital Verde.
O gabinete chefiado por Duarte Cordeiro considera, ainda assim, que “grande parte destas ações”, relacionadas com a criação de infraestruturas ou com o desenho do espaço público, “recaem sob a esfera de competências das autarquias locais, pelo que, nos territórios em que houve uma aposta dos municípios em fomentar este tipo de mobilidade, o uso da bicicleta já pode ser, de facto, uma alternativa viável ao uso do transporte individual motorizado”.
Um desses municípios é o de Lisboa, através do sistema de mobilidade partilhada Gira que, até ao momento, regista 170 quilómetros de ciclovias instalados. Neles, foram percorridos mais de 12 milhões de quilómetros desde a sua instalação, em 2015, através das 1.600 bicicletas disponíveis.
“Muitas pessoas pensam que as bicicletas elétricas da Gira são muito utilizadas apenas pelo aspeto lúdico e de diversão, mas são efetivamente um sistema de transporte”, garante ao ECO/Capital Verde o presidente da Empresa de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa (EMEL), entidade gestora das bicicletas partilhadas.
Segundo o responsável, são registados “picos de utilização” nas horas de maior mobilidade na capital, nomeadamente, “às 9h da manhã, à hora de almoço e ao final da tarde, o que significa que as pessoas utilizam as bicicletas elétricas exatamente em alternativa a outro tipo de transporte”, frisa Luís Natal-Marques.
E, se não for através das bicicletas públicas de sistema partilhado, pode ser com a ajuda das várias empresas que instalaram em Portugal os seus serviços de mobilidade suave. De Norte a Sul, gigantes como a Uber ou a Bolt reconhecem o aumento da procura e a necessidade de investir neste setor, seja através das bicicletas elétricas ou das trotinetes elétricas. A Bird, embora só tenha, para já, trotinetes disponíveis, garante estar a ultimar os últimos passos para entrar no mercado das bicicletas elétricas em Portugal.
“Aplaudimos os esforços até agora levados a cabo pelas cidades portuguesas e acreditamos que os próximos 8 anos, até 2030, serão críticos para Portugal apanhar o comboio da Europa no sentido de apostar fortemente no aumento de infraestruturas cicláveis”, frisa Bernardo Janson, country manager da Bird em Portugal ao Eco/Capital Verde.
Seja através de infraestruturas, incentivos ou segurança, tanto a MUBI como a FPCUB acreditam que, com maior vontade política, a ENMAC pode ser acelerada e acompanhar o ritmo a nível europeu a tempo de cumprir não só com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da ONU 17 (ODS 17), como o Pacto Ecológico Europeu, e também a política portuguesa da Lei de Bases do Clima, aprovada no ano passado.
Certo é que, de acordo com os dados da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em Portugal, o setor dos transportes é, desde 2019, o que tem maior peso (28%) nas emissões do país. As emissões deste setor, que é em grande parte dominado pelo tráfego rodoviário, aumentaram em 12% na última década e em 60% desde 1990. No entanto, Portugal assumiu o compromisso de reduzir as emissões deste setor em pelo menos 40% até ao final desta década, face a 1990.
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Portugal ainda longe de atingir meta de ciclovias para 2030
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