CEO defende parceiro para a TAP que “traga mais receita e redução de custos”

Depois de conseguir resultados operacionais positivos este ano, a gestão vai "começar a trabalhar na melhoria do resultado líquido" em 2023. Próximo verão já está a ser preparado.

A presidente executiva da TAP defende um parceiro para a companhia aérea que permita alavancar as vendas e ter maior poder para negociar com os fornecedores. Se é uma joint venture ou um novo acionista, cabe ao Governo decidir.

Depois de conseguir resultados operacionais positivos no primeiro semestre, Christine Ourmière-Widener, afirma que no próximo ano a gestão vai “começar a trabalhar na melhoria do resultado líquido”. Um dos objetivos é reduzir o custo com a dívida, indo ao mercado para a reestruturar. Para isso, a companhia irá fazer roadshows junto dos investidores. Pretende ainda reduzir a exposição do balanço ao dólar.

A CEO garante que, por ora, a TAP não sente qualquer impacto do abrandamento da economia ou da inflação e espera que o terceiro e quarto trimestre sejam semelhantes ou mesmo melhores que 2019. Sobre os cancelamentos e atrasos no verão, admite que na companhia “foram talvez demasiado otimistas em relação ao calendário de entrega das aeronaves”. A situação melhorou, mas “voltar ao normal em Lisboa não parece possível, devido à natureza da infraestrutura”.

O próximo verão já está a ser preparado e a gestora espera que seja idêntico a este, até porque a TAP tem um limite de 96 aviões para operar, estipulado no plano de restruturação. A cedência de 18 slots no aeroporto Humberto Delgado à easyJet “não vai prejudicar” o reforço de capacidade.

Disse na apresentação de resultados do primeiro semestre, na terça-feira, que a TAP está acima do plano de reestruturação e vai terminar o ano acima da meta estabelecida. Se a companhia mantiver este desempenho é possível chegar aos lucros antes de 2025?

Porque não? A dificuldade está nos resultados abaixo da linha [encargos financeiros, depreciações e amortizações]. Como sabe, os resultados operacionais são uma combinação de custos operacionais e receitas. Se tiver uma boa eficiência e planear melhor, tiver a rede certa, tentar não ser demasiado criativo em relação aos destinos a abrir… Se fizer isso com disciplina e rigor, é possível melhorar o resultado operacional. O que o meu administrador financeiro [Gonçalo Pires] tentou explicar é que o que está abaixo da linha é o legado e está na altura de o reestruturar. Vamos fazer o nosso melhor, mas é mais complexo.

Este ano tivemos que assegurar a melhoria operacional e no próximo ano vamos começar a trabalhar na melhoria do resultado líquido, indo ao mercado e vendo o que podemos fazer para restruturar a dívida.

O que é mais difícil nesse legado?

Acho que são todos os custos financeiros, as depreciações e amortizações. Temos o custo da frota, o número e o tipo de aviões. Depois disso há as obrigações e os juros dessas obrigações. No próximo ano teremos a perspetiva de abordagem a estas questões. Este ano tivemos que assegurar a melhoria operacional e no próximo ano vamos começar a trabalhar na melhoria do resultado líquido, indo ao mercado e vendo o que podemos fazer para reestruturar a dívida.

O que vão fazer para reestruturar a dívida?

O que Gonçalo referiu é uma dimensão. Vamos começar a fazer roadshows. Vamos começar a trabalhar com os investidores, porque temos obrigações que vão atingir a maturidade em 2023 e 2024. Isso será um indicador importante.

A ideia é reduzir os encargos com juros.

Sim. O importante é reduzir todos os custos que estão abaixo da linha e que são demasiado altos. É fácil comparar com os resultados das outras companhias. Com o mesmo resultado operacional ou mesmo mais elevado, no fim temos um resultado negativo enquanto outras conseguem manter-se positivas. A questão é como reduzir este fosso significativo, para sermos competitivos não só a nível operacional mas também no resultado líquido? Temos de trabalhar com os diferentes parceiros, a frota. Trabalhamos muito com a Rolls Royce, por exemplo, com a Airbus, com as empresas de leasing das aeronaves. Não é só o custo do avião, é também o de operar o avião.

Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP, em entrevista ao ECO - 23AGO22
Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP, em entrevista ao ECO.Hugo Amaral/ECO

Dois terços da dívida está em dólares, o que penalizou os resultados no segundo trimestre, dada a forte valorização contra do euro. A ideia é mudar essa proporção também?

Na nossa indústria, os contratos de leasing, a compra de aviões ou motores, é tudo em dólares. Estamos a começar a falar sobre fazer contratos em euros. Diminuir a nossa exposição ao dólar é muito importante e a equipa financeira já o está a fazer.

Mencionou os constrangimentos. A situação é agora mais calma? Poderá regressar ao normal nos próximos meses?

Voltar ao normal em Lisboa não me parece possível, devido à natureza da infraestrutura. Mas está melhor do que estava. Tivemos problemas com o SEF, ainda temos algumas dificuldades com a Groundforce e o nível de recursos disponíveis, porque os trabalhadores estão a sair porque encontram empregos melhores noutras empresas. Têm dificuldades de recrutamento e há atrasos para ter o cartão de acesso ao aeroporto. Os processos estão melhor no SEF. A ANA tem vindo a aumentar os recursos. Mas as coisas ainda não estão 100% perfeitas em Lisboa.

E a companhia aérea? Não tem responsabilidades também?

Tivemos atrasos na entrega de aeronaves, tivemos de encontrar ACMI [aluguer de aviões com tudo incluído – Aircraft, Crew, Maintenance e Insurance – avião, pessoal, manutenção e seguros] no mercado. Tivemos trabalhos adicionais nos A330-900neo e é por isso que tivemos de fazer também um ACMI com a Hi Fly. Depois há ainda o impacto dos outros aeroportos. O que temos visto é que alguns estão melhor, mas outros continuam com problemas.

Qual é o número de cancelamentos atual e o nível de atrasos?

Na semana passada foram cancelados 24 voos [ida e volta].

Fomos talvez demasiado otimistas em relação ao calendário de entrega das aeronaves.

Os cancelamentos não se deveram também a erros no planeamento da operação pela TAP?

Houve aspetos que não eram antecipáveis. O facto de ser suposto termos 96 aeronaves antes da época de verão e ter havido aviões que não foram entregues. Não sei se chamaria a isso mau planeamento. O plano era ter os aviões. Não receber nenhuma das seis aeronaves a tempo… A questão é quanto backup se planeia? Planeia-se que não se vai receber nenhum deles? Metade? Depois disso, prever os constrangimentos em Heathrow, Amesterdão e Frankfurt.

Que lições há a retirar do que aconteceu no verão?

Muitas. Fomos talvez demasiado otimistas em relação ao calendário de entrega das aeronaves. As pessoas estavam talvez otimistas e entusiasmadas com o crescimento da companhia, o que é positivo. Subestimámos o facto de haver aeronaves que vinham de outra companhia aérea que não estava em boa forma, a Air Europa. Talvez pudéssemos ter contratado o ACMI mais cedo.

Que outras lições?

Em relação ao ground handling [serviço de assistência em terra, prestado pela Groundforce] perceber melhor o impacto da pressão, dos baixos salários. Temos dado todo o apoio que podemos. Em relação às tripulações, contratámos em tempo recorde mais de 400 trabalhadores para o pessoal de cabine e 85 para o pessoal de terra. Temos vindo a abrir balcões por todo o lado. Acho que com a crise aprendemos que temos de trabalhar melhor juntos. Muitas coisas podem ser melhoradas se tivermos todas as partes à volta da mesa, como a ANA, a NAV, ANAC e as outras companhias aéreas. Espero que o inverno seja uma oportunidade para revisitar o que aconteceu, perceber o que pode ser melhorado e não repetir [os erros] no próximo verão.

Tem alguma novidade do Governo em relação às obras de melhoramento do aeroporto Humberto Delgado?

Não. Sigo as notícias.

 

Economia e inflação não fazem mossa, por agora

 

Quão perto ficou a TAP dos níveis de 2019 em julho e agosto, por exemplo em termos de receitas?

Não posso dar-lhe os números. É por isso que estamos a mostrar dados sobre o nível de reservas para o terceiro trimestre e vê que está acima de 2019. Será muito consistente com o desempenho do segundo trimestre [rendimentos operacionais quase igualaram 2019].

E o quarto trimestre?

Temos um pico enorme à volta do Natal que é muito importante para os resultados da companhia. Há muitas companhias aéreas na Europa que não têm este pico. O nível de reservas está em linha com 2019. Sinceramente, e sendo transparente, o único impacto que sentimos foi uma flutuação nas reservas ponto a ponto na Europa. Penso que alguns dos nossos clientes reagiram aos constrangimentos nos aeroportos. Agora está ok, porque há menos ruído sobre os constrangimentos.

O único impacto que sentimos foi uma flutuação nas reservas ponto a ponto na Europa. Penso que alguns dos nossos clientes reagiram aos constrangimentos nos aeroportos.

Não notam uma menor procura devido ao abrandamento da economia e aumento da taxa de inflação?

Ainda não. Não significa que não venha a acontecer. As pessoas ainda terão dinheiro para gastar e fazer férias ou visitar os clientes e assinar contratos. Estamos a olhar para as previsões para planear o próximo verão. Estamos a iniciar a elaboração do orçamento para o próximo ano.

Neste momento olha para o próximo verão ainda com a expectativa que seja semelhante a este?

Sim, porque temos o crescimento da frota limitado [99 aeronaves, conforme prevê o plano de reestruturação]. A questão é mais onde vamos colocar mais capacidade e não seremos muito criativos em relação a novos destinos. Vamos ser cautelosos. Num ano com total visibilidade é possível ser empreendedor e testar o mercado. Não será o caso do próximo ano. Como CEO vou incentivar a que se reforce o que funciona, em vez de começar a explorar novas oportunidades.

Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP, em entrevista ao ECO - 23AGO22
Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

A TAP está com 96 aviões, quando espera chegar aos 99? No próximo ano?

O plano prevê 99 aviões só no último ano. No próximo ano vamos ter saídas e entradas mas não vamos atingir o limite.

Vai relançar o programa de Stopover. O que vai ser diferente?

O programa é pouco conhecido e temos de o comunicar melhor. É um programa único e tem potencial para ser mais usado. É bom para Portugal, para a TAP. Ainda não está totalmente fechado, mas é uma paragem adicional e mais dias. Em vez de uma paragem num destino em Portugal podem parar em dois e podem ficar mais dias.

A cedência dos 18 slots no Aeroporto Humberto Delgado à easyJet significa que a TAP terá de reduzir capacidade ou rotas?

Não. Reorganizamos as nossas rotações com os slots que temos. Teremos de ajustar horários, mas a prova é que vamos acrescentar duas aeronaves narrow body e uma wide body e continuaremos com um aumento ligeiro da capacidade. Não nos vai penalizar no próximo verão.

O longo curso é lucrativo e o curto perde dinheiro. Na categoria de longo curso, o Brasil é o principal mercado em vendas, depois de Portugal.

Qual o contributo do Brasil e dos EUA para os resultados do grupo no semestre?

Não divulgamos esses números. O longo curso é lucrativo e o curto perde dinheiro. Na categoria de longo curso, o Brasil é o principal mercado em vendas, depois de Portugal. A maioria da receita nas rotas para o Brasil é gerada localmente. É um grande motor de rentabilidade, mas não é o único. Nos EUA estamos a rever a nossa estratégia comercial e temos um novo diretor. Acho que podemos ser mais fortes, talvez não ao nível do Brasil… Estamos a tentar estar mais próximos dos nossos parceiros, a JetBlue e a United Airlines, com mais acordos de codeshare [venda partilhada de voos]. Nos EUA somos muito competitivos nas ligações a partir do sul da Europa, devido à estrutura da rota, porque não é preciso subir e depois descer. Por exemplo, a partir de Milão ou Nice, com uma paragem.

A cotação do jet fuel desceu cerca de 17% desde o pico em junho, mas continua muito elevado. Ainda assim, o preço das passagens poderá descer?

As tarifas são sempre um reflexo do mercado. Nós somos mais seguidores do que líderes. Se em algum momento tivermos de ajustar os preços para sermos competitivos é o que faremos.

Quantos aumentos fez a TAP?

Fizemos três vagas de aumentos, mas não sempre nas mesmas rotas. Daqui em diante, o valor das tarifas dependerá da procura. Se a procura diminuir, os preços vão descer.

 

Um parceiro para puxar pelas vendas e baixar custos

 

Para sobreviver a longo prazo a TAP terá de ser integrada noutro grupo?

Temos fatores externos que não controlamos, como o preço do combustível ou as variações cambiais. Sim, ter parceiros fortes é importante. Vemos isso com o codeshare. Na rota de Telavive, por exemplo, temos um acordo com a El Al. No Dubai temos com a Emirates. Funciona muito bem. Se amanhã podermos replicar isso em todos os nossos pontos de venda com um parceiro e ter maior poder sobre os fornecedores, claro. No fim de contas é uma questão de receita e custos. Se trouxer mais receita e capacidade para reduzir custos…

Se amanhã podermos replicar isso em todos os nossos pontos de venda com um parceiro e ter maior poder sobre os fornecedores, claro. No fim de contas é uma questão de receita e custos.

Faz então sentido um parceiro.

Qualquer companhia que possa contribuir para ambos.

Um parceiro de capital que compre uma percentagem da empresa ou mesmo a totalidade?

Também pode ser uma joint venture. Na nossa indústria existem diferentes degraus. Há o codeshare, a joint venture, a entrada no capital ou o controlo total. Há uma lista grande de coisas que podem acontecer no futuro e que podem tornar-nos mais fortes.

Há reuniões com potenciais parceiros?

Reunimos com toda a gente. É esse o meu trabalho. Tentamos ter mais acordos de codeshare. Se está a falar de algo mais estratégico, isso é responsabilidade do acionista.

Quando é que a Portugália vai ser integrada na TAP SA?

Essa é também uma questão para o acionista. É necessária uma assembleia geral. Espero que aconteça no próximo mês.

O que muda com essa integração?

É uma integração societária. Nada mais. Significa que a Portugália estará na TAP SA em vez da TAP SGPS. Não terá impacto. A Portugália providencia capacidade para a TAP com um nível de custos que é competitivo. É o nosso próprio ACMI. É o mesmo que trabalhar com a Hi fly ou a Air Bulgária, mas é a nossa própria empresa. A relação será a mesma.

Porquê esta mudança então?

É uma evolução societária. É uma expectativa do acionista, que talvez queira simplificar a estrutura corporativa. Para a equipa executiva acreditamos que pode simplificar bastante focar tudo na TAP SA.

 

TAP e futuro acionista da Groundforce já negoceiam contrato

 

A National Aviation Services (NAS), do Kuwait, está em negociações exclusivas com a Groundforce para ficar com a participação de 50,1%. Também tinha a melhor proposta de custos para a TAP?

Como principal cliente da Groundforce estamos a negociar com eles o próximo contrato. Temos tido reuniões. Desde o início que dissemos que faríamos tudo para garantir a sustentabilidade da Groundforce porque é o handler do nosso hub. Estamos em contacto com a NAS.

Quando espera ter esse contrato fechado?

O que dissemos é que queríamos ter o novo figurino da Groundforce o mais cedo possível, porque temos de preparar o próximo verão. Ter uma Groundforce mais forte seria muito importante.

Este novo contrato significará custos mais baixos para a TAP?

Estamos sempre à procura de eficiência. Vamos ver o que é possível, mas vamos tentar reduzir os custos.

Não a surpreendeu que a Swissport não tenha ganho o processo, tendo em conta que já trabalha com a TAP em muitos outros aeroportos?

Eles desistiram. O processo não é gerido diretamente por nós, mas pelos administradores de insolvência. Estamos em contacto com a Swissport porque trabalhamos com eles em 27 estações, mas a decisão é deles.

A NAS e a Menzies estão a demonstrar uma enorme motivação para fazer um bom trabalho em Lisboa. Temos de trabalhar juntos.

Teria preferido que fosse a Swissport a entrar no capital da Groundforce?

Não é uma questão de preferência. O mais importante é que a Groundforce tenha investimento, nomeadamente em tecnologia, e que tenha uma experiência que beneficie todos os empregados. Lisboa é um grande aeroporto, mas é complicado.

A NAS assumiu o compromisso de fazer esses investimentos?

A NAS, como sabe, está a adquirir a Menzies. A Menzies tem experiência na Europa e a NAS e a Menzies estão a demonstrar uma enorme motivação para fazer um bom trabalho em Lisboa. Temos de trabalhar juntos.

A TAP vai vender a participação de 49,9% na Groundforce? Está previsto no plano de recuperação?

É muito cedo para responder. Fará parte do processo em curso com a Groundforce. Claro que temos o compromisso no plano pelo que teremos de olhar para isso.

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