Gestão da TAP em risco por indemnização sem aval das Finanças

Medina diz que vai aguardar pelas conclusões da IGF antes de decidir sobre a administração da TAP, mas a demissão da equipa de gestão ganha força.

O ministro das Finanças vai esperar pela auditoria da Inspeção-Geral de Finanças antes de decidir sobre o futuro da administração da TAP, mas ficou claro que Fernando Medina considera que a gestão não cumpriu o dever de informar o seu ministério. O que deixa em causa a equipa liderada por Manuel Beja e Christine Ourmière-Widener, com risco de demissão por justa causa.

Nem no Ministério das Finanças, nem na TAP se imaginaria que a saída de Alexandra Reis da administração da companhia aérea, anunciada como uma renúncia a 4 de fevereiro, iria provocar tamanho terramoto dez meses depois. A divulgação pelo Correio da Manhã, na véspera de Natal, que a então secretária de Estado do Tesouro tinha recebido uma indemnização de 500 mil euros levaria, cinco meses depois, à demissão do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, e dos seus secretários de Estado. O foco vira-se agora para a administração da transportadora.

A TAP tem duas tutelas, uma operacional, do Ministério das Infraestruturas, e outra financeira, das Finanças, dado ser desde 2020 uma empresa de capital maioritariamente público, agora já 100% do Estado. Se o Ministério das Infraestruturas reconheceu que o secretário de Estado, Hugo Mendes, sabia da indemnização de 500 mil euros, nas Finanças não há qualquer registo de que a informação lá tenha chegado. Quer João Leão, que era ministro das Finanças à altura, quer Miguel Cruz, então secretário de Estado do Tesouro, vieram garantir total desconhecimento sobre a indemnização. O que para Fernando Medina significa que as regras não foram cumpridas por parte da administração da TAP, que é liderada pelo presidente do conselho de administração, Manuel Beja, e pela presidente da comissão executiva, Christine Ourmières-Widener.

A informação ao Ministério das Finanças devia ter sido cumprida com as regras que existem.

Fernando Medina

Ministro das Finanças

Depois de receberem os esclarecimentos pedidos por despacho à TAP, os ministérios da Finanças e Infraestruturas anunciaram o envio para a Inspeção-Geral de Finanças para avaliar a legalidade do processo. Nas declarações que prestou esta sexta-feira após a apresentação Pública do Balanço da Atividade das áreas da Economia, Finanças Públicas e Emprego, Fernando Medina afirmou que só no fim da auditoria da IGF tirará as suas conclusões no que toca à TAP, mas deixou clara a sua opinião: “Não é adequado que numa empresa que tem uma tutela financeira, que é o Ministério das Finanças, existam decisões com este tipo de impacto que não sejam do conhecimento do Ministério das Finanças. Não é regular”. “A informação ao Ministério das Finanças devia ter sido cumprida com as regras que existem”, acrescentou.

Ou seja, tudo indica que Fernando Medina está à espera que a auditoria da IGF confirme, com os devidos argumentos legais, aquilo que já tem como certo: a administração falhou no seu dever de informar a tutela financeira. O que põe em causa quer o presidente do conselho de administração, Manuel Beja, quer a presidente da comissão executiva, Christine Ourmière-Widener – que ao que o ECO apurou são quem assina o acordo de rescisão com Alexandra Reis – mas também o administrador financeiro (CFO), Gonçalo Pires, que é formalmente nomeado pelas Finanças.

Segundo afirmou Miguel Cruz ao Observador, o CFO não lhe referiu a existência de uma indemnização. Confirmando-se a existência de uma ilegalidade, a continuação da equipa de gestão ficará comprometida e poderá resultar na demissão por justa causa, sem direito a indemnização, nos termos do Estatuto do Gestor Público.

A atual administração assumiu formalmente funções em junho do ano passado e, tirando o administrador financeiro, foi nomeada por Pedro Nuno Santos, que entretanto se demitiu. O que a deixa sem suporte político. Além de não ter informado as Finanças, ficou entretanto claro que a administração tentou fazer passar a saída de Alexandra Reis como uma renúncia voluntária, como constava do comunicado enviado ao mercado a 4 de agosto, aquilo que na verdade foi um processo desencadeado pela administração. Segundo o comunicado do Ministério das Infraestruturas, existia “uma manifesta incompatibilização, irreconciliável, entre a CEO e a vogal do conselho de administração”.

Por exigência da CMVM, a companhia teve de alterar o comunicado, para dizer que a saída “ocorreu na sequência de um processo negocial de iniciativa da TAP, no sentido de ser consensualizada por acordo a cessação de todos os vínculos contratuais existentes entre Alexandra Reis e a TAP”. O supervisor está, além disso, aferir “as consequências legais aplicáveis” pela prestação de informação incorreta, o que pode levar à abertura de um processo de contraordenação.

A saída da antiga administradora executiva é mais um de vários casos a envolver a gestão da TAP este ano, como a alteração da frota de administradores e diretores de Peugeot para BMW, entretanto congelada, ou a alegada contratação de uma amiga da CEO para a direção de um dos departamento de Melhoria Contínua, Sustentabilidade e Real Estate, tendo Christine Ourmières-Widener recusado qualquer envolvimento. O ano foi ainda marcado por vários cancelamentos e atrasos no verão, um clima de elevada tensão com os pilotos e o regresso das greves à companhia aérea com a paralisação dos tripulantes a 8 e 9 de dezembro.

A favor da administração joga a forte recuperação dos resultados da transportadora aérea, acima do previsto no plano de reestruturação acordado com a Comissão Europeia, podendo mesmo chegar ao final deste ano com os primeiros lucros desde 2017. Fez a semana passada um ano desde a decisão de Bruxelas, que faz uma avaliação regular da implementação do plano de restruturação. O ECO sabe que esteve recentemente em Lisboa uma delegação da Comissão Europeia e que a opinião manifestada foi positiva.

Ainda assim, assegurados no quadro de um plano de reestruturação, ou seja, com menos dois mil trabalhadores e com cortes salariais médios de 25%, que serão revertidos no final do plano. Será suficiente para segurar a gestão quando for nomeado um sucessor para Pedro Nuno Santos?

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Gestão da TAP em risco por indemnização sem aval das Finanças

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião