Uma jovem jornalista e o Dr. José Manuel Galvão Teles
Mas os olhos meigos, de miúdo maroto (é uma expressão que se lhe adequa que nem uma luva), a simpatia imediata e, acima de tudo, a simplicidade, manifestaram-se logo nos primeiros cinco minutos.
Corria o ano de 2004. Com menos 19 anos, eu, uma jovem jornalista, a quem tinham dado a função de começar a escrever sobre o mercado dos advogados, no Diário Económico, decidi começar por conhecer pessoalmente, um por um, dos que, à data, já detinham o estatuto de senadores do direito.
Comecei por José Miguel Júdice – na altura bastonário dos Advogados – continuei com André Gonçalves Pereira e o meu terceiro encontro foi com José Manuel Galvão Teles. Combinamos algures numa pastelaria de renome, no Estoril, um pequeno almoço logo cedo. Nervosa e ansiosa, cheguei, pontualmente, ao encontro daquele que tinha fundado uma das (já na altura) maiores sociedades de advogados em Portugal: A Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados (um nome que me forcei a decorar na véspera do encontro para não fazer má figura!).
Mal cheguei, já o Dr. José Manuel Galvão Teles me esperava. Entrei em pânico com a possibilidade de ter deixado à espera um homem e advogado tão ocupado. A paixão foi imediata. Como uma recém licenciada em direito que era, e que há menos de um ano terminara o estágio de advocacia, esperava um homem sobranceiro, de simpatia forçada e com alguma altivez na postura. Como os advogados, dessa geração, me estavam a começar a habituar. Mas os olhos meigos, de miúdo maroto (é uma expressão que se lhe adequa que nem uma luva), a simpatia imediata e, acima de tudo, a simplicidade, manifestaram-se logo nos primeiros cinco minutos. Uma empatia que, penso eu, foi mútua.
Com aquele homem desbocado, contador de histórias, frontal e extremamente brincalhão, guardo uma das minhas mais interessantes experiências profissionais: uma simples conversa que durou mais de quatro horas. Disse-lhe por várias vezes que me fazia lembrar o meu avô materno – que nos deixara há seis anos – e com quem tinha uma relação de pai e filha e uma admiração e amor sem limites. Pediu-me para falar então do meu avô que me dera o nome inesquecível: Ambrósio. Durante algum tempo, aquele senador da advocacia absorveu a (minha) história de família, os episódios em Moçambique dos meus avós e da minha mãe, as minhas raízes da Beira Baixa, o meu gosto pela política, o lado de necessidade de intervenção cívica que herdei da minha mãe, a admiração que os meus pais me levaram a ter por Jorge Sampaio (seu amigo de longa data), a missão que eu (ainda) encarava no jornalismo, a admiração pelo perfeccionismo do meu pai, os meus medos, as minhas dúvidas (e na altura eram tantas!).
Foram vários os pontos em comum que encontrei com este homem. Saí dali mais rica, mais sábia, mais curiosa pelo mundo, com uma vontade ainda maior de aprender e de ter vida. E com confiança: porque aquele senhor, que tanto deu ao país e à advocacia, me disse somente isto: vais conseguir, Filipa, tu és das de fibra! A última vez que o vi foi na apresentação do livro de Daniel Proença de Carvalho. Fui ter com ele – já muito afetado pela doença – e dei-lhe um abraço. Os olhos, os tais de miúdo maroto, e o seu riso sincero estavam lá. E foi isso que José Manuel Galvão Teles me deixou: mais do que um grande advogado, foi e será sempre um grande homem, que lidava com todos os seres humanos de forma igual. E são tão poucos esses. Obrigada, Dr. José Manuel Galvão Teles, a quem nunca consegui tratar apenas por Zé Manel.
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