Administrador financeiro da TAP não esteve envolvido no acordo de Alexandra Reis, mas soube “informalmente” uns dias antes
O administrador financeiro afirmou na comissão parlamentar de inquérito que soube alguns dias antes sobre a saída da antiga administradora "informalmente".
O administrador financeiro da TAP reconheceu perante os deputados da comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP que soube alguns dias antes de um acordo para a saída da antiga administradora Alexandra Reis da companhia, mas de forma informal. Gonçalo Pires afirmou também que foi o Ministério das Infraestruturas que deu orientação para que resultados fossem apresentados apenas a investidores.
“Não estive na decisão, na elaboração, na negociação, nas conversas com advogados, nem com a tutela, nem conhecia os termos”, afirmou esta quinta-feira o administrador financeiro da TAP, no Parlamento, mantendo o que afirmou à Inspeção-Geral de Finanças. “Não acho que devesse ter sido envolvido, porque a decisão é do acionista. Estando na liderança do processo [de cessação de funções da ex-administradora] a CEO e o presidente do conselho da administração, assumi que existia articulação com o acionista. A comissão executiva não demite os seus pares; é o acionista que toma decisões sobre os órgãos sociais”, acrescentou.
Paulo Moniz, deputado do PSD, confrontou Gonçalo Pires com vários momentos da comunicação entre o CFO e a presidente executiva, a começar no dia 19 de janeiro de 2022. “Poucos dias antes, foi-me dito informalmente que tinha sido chegado a um acordo. Não foi surpresa a saída, até porque era conhecida a intenção da CEO de fazer alterações na comissão executiva“, respondeu. Precisou depois que tinha recebido mensagens da CEO sobre a proximidade do acordo com Alexandra Reis.
O administrador financeiro foi confrontado com a notícia da CNN Portugal de que a presidente executiva da TAP diz na resposta à Direção-Geral de Finanças que Gonçalo Pires sabia do processo desde o início. O CFO manteve a mesma resposta: “Não sei se o processo demorou dias. Eu sabia que havia divergências, que havia intenção de mudar membros da comissão executiva, sabia dias antes que podia acontecer, mas não tive envolvimento no processo, não participei na decisão, nem na elaboração de qualquer acordo”.
Gonçalo Pires foi confrontado com o facto de sendo responsável financeiro ter “carregado no botão” da transferência da indemnização paga a Alexandra Reis. O CFO descreveu que os recursos humanos têm um orçamento anual e que é enviado um ficheiro encriptado às instituições financeiras. Estas geram um código que é enviado à tesouraria da TAP. “Quando a instrução é feita com cabimento orçamental, não é necessário reporte a mim. Quando não tem, tem de ser reportado. Esta tinha cabimento”, disse. Esclareceu ainda que a companhia dispunha de 2,3 milhões de euros para indemnizações não previstas.
O parlamentar social-democrata questionou também, repetidamente, se o administrador financeiro tinha conversado com o antigo secretário do Estado do Tesouro, Miguel Cruz, como este chegou a referir. Gonçalo Pires respondeu sempre da mesma forma: “Não me lembro de ter tido qualquer conversa“.
O CFO foi também questionado sobre se tinha recebido indicações do novo ministro das Infraestruturas para que não fosse feita a conferência de imprensa de apresentação dos resultados de 2022, algo que João Galamba negou. Gonçalo Pires diz que foi entendimento da maioria da administração que a apresentação fosse discreta e apenas para investidores, tendo manifestado essa opinião à tutela.
No entanto, acabou por dizer que a orientação final veio dos Ministérios. “Eu enviei um e-mail com apresentação de resultados, pedindo instruções sobre a data e a forma da apresentação. Expressei a minha opinião às Infraestruturas e às Finanças e recebi e-mail com confirmação do contudo da data e da forma”, respondeu ao deputado Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal.
Gonçalo Pires foi também questionado pelo PSD se João Galamba era um dos seus três amigos mais próximos. O CFO confirmou que o ministro das Infraestruturas foi seu colega na universidade e é um “dos seus amigos mais próximos”.
O administrador financeiro (CFO) já tinha sido um dos visados pelos deputados na audição do inspetor-geral de Finanças, realizada na quarta-feira, a primeira da CPI, questionando a sua responsabilidade no pagamento da indemnização de 500 mil euros brutos à antiga administradora Alexandra Reis e necessidade de informar as Finanças.
António Ferreira dos Santos afirmou que, “sendo a regra o CFO ser escolhido pelo Ministério das Finanças, a questão do reporte ao Ministério tem a ver com questões operacionais”. “Em relação a este processo não tinha de comunicar”, completou. Esclareceu ainda que a legislação impõe essa obrigação quando o montante ultrapassa 1% do ativo líquido da empresa pública, “o que neste caso não se aplicaria”.
O CFO da TAP não é responsabilizado no relatório da Inspeção-Geral de Finanças e o seu depoimento não foi incluído nos documentos enviados à comissão, o que mereceu críticas dos deputados. O mesmo deverá ter chegado à CPI esta terça-feira. “Gonçalo Pires não esteve relacionado com o processo porque toda a negociação [do acordo com Alexandra Reis] decorreu à margem do conselho de administração e da comissão executiva”, defendeu António Ferreira dos Santos.
Gonçalo Pires foi nomeado administrador financeiro da TAP em outubro de 2021, substituindo João Weber Gameiro, que ficou apenas alguns meses no cargo. É o segundo a ser ouvido na CPI, numa longa lista de cerca de 60 personalidades que serão chamadas a depor. Na próxima semana terão lugar as audições da ainda presidente executiva da companhia aérea, Christine Ourmières-Widener, e de Alexandra Reis.
É Gonçalo Pires quem assina o comunicado ao mercado, datado de 4 de fevereiro do ano passado, onde é comunicada a renúncia de Alexandra Reis. Uma informação que teria de ser corrigida pela TAP a 27 de dezembro, por exigência da CMVM, para deixar claro que a saída da administradora “ocorreu na sequência de um processo negocial de iniciativa da TAP”.
O administrador foi confrontado por Bernardo Blanco, deputado da Iniciativa Liberal, sobre a informação falseada na primeira informação aos investidores. “Foram-me comunicados os exatos termos do comunicado. Não tinha razão nenhuma para desconfiar de que palavras usadas não correspondiam à verdade. Sou eu que assino. A responsabilidade é minha, mas o comunicado foi preparado pelas equipas envolvidas no acordo [com Alexandra Reis]”, respondeu. Acrescentou ainda que os termos do comunicado foram
O comunicado da CMVM e a responsabilidade do CFO serviu de mote ao PSD e ao Chega para afirmarem que não tem condições para se manter em funções como administrador. O supervisor do mercado de capitais está a avaliar “as consequências legais aplicáveis”, que podem passar pela abertura de um processo de contraordenação.
A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP em fevereiro de 2022, mas vai recuar até à privatização da companhia em 2015. Tomou posse a 22 de fevereiro, estendendo-se por um período de 90 dias.
(Notícia atualizada às 22h23)
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