Os trunfos e fraquezas de Pedro Nuno Santos para a audição no Parlamento

O antigo ministro das Infraestruturas vai ser ouvido sobre a TAP na Comissão de Economia, quebrando vários meses de silêncio, com o seu futuro político em jogo.

Pedro Nuno Santos quebra esta terça-feira o silêncio, mais de cinco meses depois dos factos que ditaram a sua demissão de ministro das Infraestruturas, a saída do secretariado nacional do PS e a suspensão do mandato de deputado. O ex-governante, apontado como sucessor de António Costa, vai ser ouvido na Comissão de Economia do Parlamento, num aquecimento antes de ir à comissão parlamentar de inquérito (CPI) à TAP, na próxima semana.

Esta espécie de comissão paralela à CPI foi inaugurada pelo PS a propósito do uso de fundos da Airbus por David Neeleman para capitalizar a companhia aérea na privatização de 2015, e depois estendida pelo PSD. Os socialistas chamaram antigos governantes social-democratas e depois os social-democratas juntaram-lhe ex-ministros socialistas.

O PSD quis entretanto anular a audição de Pedro Marques (decorreu a semana passada) e Pedro Nuno Santos, mas os socialistas não permitiram. E é assim que o antigo ministro das Infraestruturas será ouvido na Comissão de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação sobre a “situação da TAP no período 2015-2023”, num ensaio geral para a comissão de inquérito prevista para dia 15 de junho.

Pedro Nuno Santos chega ao embate com os deputados numa posição fragilizada, depois de se ter demitido a 29 de dezembro na sequência da indemnização bruta de 500 mil euros paga à antiga administradora Alexandra Reis, entretanto parcialmente devolvida, mas também pode puxar alguns temas para sua defesa. Saiba quais.

As fraquezas

Ainda que esse seja um tema central da CPI, os deputados não deixarão de confrontar Pedro Nuno Santos com as suas responsabilidades e contradições no caso Alexandra Reis na Comissão de Economia. O antigo ministro começou por alegar desconhecimento do processo, juntando-se ao seu colega das Finanças, Fernando Medina, para pedir esclarecimentos à TAP.

No comunicado divulgado no dia em que se demitiu, afirmou que só naquele momento teve conhecimento dos termos do acordo entre a TAP e então administradora, mas que saía porque foi o seu secretário de Estado das Infraestruturas que deu aval ao acordo, entendendo, por isso, “assumir a responsabilidade política”. Só que poucas semanas depois, a 20 de janeiro, emitiu um novo comunicado onde admite que afinal não só sabia como autorizou o acordo de cessação de funções de Alexandra Reis.

Na CPI surgiram outras evidências do conhecimento prévio de Pedro Nuno Santos em relação à vontade da ex-CEO, Christine Ourmières-Widener, em fazer mudanças na administração.

A autorização foi dada ao secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, através de mensagens na rede social WhatsApp. Pela CPI à TAP passaram vários exemplos da informalidade das comunicações entre o Ministério das Infraestruturas e a antiga CEO da companhia aérea, o que também vir a ser usado contra Pedro Nuno Santos.

A gestora francesa afirmou na sua audição na CPI, no início de abril, que Hugo Mendes lhe transmitiu que a “única porta de entrada no Governo” era o Ministério das Infraestruturas, apesar de a tutela financeira caber às Finanças. As divergências com o então ministro, João Leão, e o impacto na gestão da TAP também deverão merecer perguntas.

O caso Alexandra Reis é uma meada com vários fios. A nomeação da antiga administradora para presidente da NAV Portugal, a entidade responsável pela navegação aérea, poucos meses depois de sair da TAP com uma elevada indemnização é outro dardo que os deputados poderão atirar.

A injeção de 3,2 mil milhões de euros de ajudas de Estado na TAP será também um tema incontornável. O elevado custo suportado pelos contribuintes num momento em que os portugueses apertam o cinto será usado como munição.

Os trunfos

Alguns temas que a oposição irá usar para atacar Pedro Nuno Santos vão ser usados pelo ex-ministro para o contra-ataque. Um deles é justamente o dinheiro público injetado na TAP. Seguindo o guião repetido várias vezes, o putativo candidato a sucessor do primeiro-ministro irá defender que sem a sua intervenção a companhia área hoje não existiria, ter-se-iam perdido muito mais empregos, diretos e indiretos, e a transportadora não estaria a contribuir para o crescimento do turismo, que tão importante tem sido para a retoma da economia no pós-pandemia.

Pedro Nuno Santos também levará algumas cartas na mão para o ataque, em particular ao PSD. A principal será a utilização de 227 milhões de dólares de fundos da Airbus para a capitalização da TAP por David Neeleman, na privatização da companhia aérea em novembro 2015, dois dias depois do Governo do PSD e CDS ser chumbado na Assembleia da República. Dinheiro que o sócio de Humberto Pedrosa na Atlantic Gateway, que ficou com 61% da transportadora portuguesa, recebeu em troca da desistência de uma encomenda de 12 aviões A350 e da realização de uma nova de 53 aeronaves.

Uma análise legal da Serra Lopes, Cortes Martins & Associados, pedida pela TAP e divulgada pelo ECO, conclui que a companhia aérea ficou na prática a pagar a sua própria capitalização, o que é ilegal. Além disso, segundo uma auditoria pedida pela transportadora à consultora irlandesa Airborne, em 2022, a companhia aérea portuguesa está a pagar mais do que as concorrentes pelos mesmos aviões. Foi o próprio Pedro Nuno Santos que anunciou no Parlamento o envio destes elementos para o Ministério Público, que depois abriu um inquérito.

Para se defender no caso Alexandra Reis, o ex-ministro deverá usar a auditoria da Inspeção-Geral de Finanças, que atribui responsabilidades apenas à ex-CEO e ao antigo presidente do conselho de administração, Manuel Beja. Mesmo a deliberação da DGTF que demite os administradores parece salvaguardar o antigo ministro o seu secretário de Estado, ao defender que apenas anuíram ao valor da indemnização, “não existindo evidência do conhecimento daqueles então membros do Governo sobre o teor, em concreto, do clausulado do acordo, ao que acresce que a sua intervenção foi sempre baseada na informação que lhes foi prestada pela CEO”.

Resta saber se o Partido Socialista vai colocar-se inteiramente ao lado de alguém que já não está no Governo, quando é este que mais recentemente tem estado debaixo de fogo.

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