Proença de Carvalho: “Decisão não enfrentou ondas de opinião pública”

  • Lusa
  • 31 Julho 2023

O ex-presidente do BES Ricardo Salgado vai ser julgado pelos 65 crimes de que estava acusado, de acordo com a decisão instrutória lida esta tarde no TCIC, em Lisboa.

A defesa de Ricardo Salgado criticou a decisão instrutória que envia o ex-presidente do BES a julgamento, qualificando-a como “um mero cumprimento de calendário”, que não foi capaz de “enfrentar as ondas de opinião pública”.

À saída do tribunal, no Campus de Justiça, em Lisboa, Francisco Proença de Carvalho, advogado de Ricardo Salgado, disse que a decisão que validou na íntegra os 65 crimes imputados ao seu cliente “era expectável”.

O advogado defendeu que a substituição do juiz de instrução a meio do processo transformou a instrução num “mero cumprimento de calendário”, com o qual apenas se pretendia “tirar uma fotografia e fingir que está tudo bem com a Justiça”, o que tornou previsível a decisão.

“Devo confessar: quando para um advogado passa a ser tão previsível a decisão que se vai tomar, algo está muito mal na Justiça. Uma Justiça de sentido único é uma Justiça que não serve a ninguém porque se percebe que não está a fazer o seu papel de árbitro, de distanciamento e de capacidade de ter coragem para precisamente enfrentar, enfim, as ondas de opinião pública, de alguma que é natural que se sinta enfim perturbada com determinado tipo de casos, mas a Justiça e a democracia serve para isso”, disse.

Para Proença de Carvalho, a própria leitura da decisão, rápida e concisa e sem considerações ou argumentação do juiz, confirmou a ideia de cumprimento de calendário: “Aquilo que se leu aqui confirma a ideia que eu tenho de que se cumpriu um calendário para mostrar que a Justiça é fantástica, funciona tudo muito bem. Não nos iludamos”.

O advogado considerou ainda que “os termos da lei” neste processo não têm sido cumpridos, pondo em causa a “justiça democrática”, que em seu entender “não está a preservar-se e dificilmente poderá valer para todos”.

“É um problema de segurança para todos nós que a Justiça não saiba ter essa calma, essa tranquilidade, essa objetividade para lidar com determinado tipo de processos, não é só este obviamente”, acrescentou.

O advogado de Salgado, que foi confrontado à entrada do tribunal por uma concentração de dezenas de lesados do BES, alguns dos quais assistiram à sessão, alegou que a defesa do ex-banqueiro “nunca se fez contra os lesados do BES”.

“Para nós, os lesados do BES são lesados do Estado Português, o doutor Ricardo Salgado e esta defesa, sempre tentámos, com uma cronologia de factos, demonstrar que [o colapso] do BES podia ter sido evitado. Foi o que fizemos, nunca contra nenhum lesado e nunca sentimos sequer os lesados contra nós. É uma luta contra o Estado, é uma luta muito desigual, mas temos de a fazer”, disse.

Proença de Carvalho sublinhou que, enquanto Ricardo Salgado esteve à frente do BES, não houve lesados e havia um processo em curso que reembolsou os clientes do papel comercial.

“Ricardo Salgado obviamente nunca disse – nós nunca dissemos – que nunca foram cometidos erros, erros de gestão, erros de julgamento de decisões que se tomam. Coisa diferente é serem cometidos crimes. Nós o que estamos a tentar demonstrar é que não foram cometidos crimes, todos os atos que foram feitos foram de boa-fé”, defendeu.

Quanto ao diagnóstico de Alzheimer de Ricardo Salgado, a defesa insiste na realização de uma perícia médica independente, que espera que venha a acontecer no decurso do julgamento, acrescentando que Ricardo Salgado “não tem capacidade para compreender esta decisão e se defender dela”.

O advogado de Amílcar Morais Pires, ex-responsável financeiro do BES/GES, afirmou também que a decisão de levar o seu cliente a julgamento “era expectável”, afirmando que o juiz foi colocado no processo para se atingir “um certo fim”.

“Era muito expectável. Pelo modo como correu a instrução, outra coisa não era de esperar, porque a instrução não foi verdadeiramente respeitadora dos direitos de defesa. Designadamente à mudança do juiz”, disse Raul Soares da Veiga, advogado de Morais Pires, à saída do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), no Campus de Justiça, em Lisboa, onde hoje o juiz Pedro Santos Correia leu a decisão instrutória que leva o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, e os restantes principais arguidos no processo da derrocada do BES a julgamento pelos crimes constantes na acusação do Ministério Público.

Para Soares da Veiga, neste processo a justiça “esteve malíssima”, nomeadamente com a substituição de Ivo Rosa a meio da fase de instrução do processo, comentando que “nunca se viu isso”.

“Não me espanta este resultado da instrução, foi um mero formalismo, não teve substância verdadeira, porque estava um juiz a dirigir as coisas e de repente mudaram o juiz, passou a haver um outro juiz caído do céu. Dessa forma não se consegue trabalhar”, disse.

Soares da Veiga, que disse considerar o juiz Pedro Santos Correia “uma pessoa respeitável” em relação à qual não tem nada contra, disse também que o juiz “foi posto [neste processo] para um certo fim que é prosseguido”.

O ex-presidente do BES Ricardo Salgado vai ser julgado pelos 65 crimes de que estava acusado, de acordo com a decisão instrutória lida esta tarde no TCIC, em Lisboa.

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