O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social encerrou 2022 com perdas de 13% por conta da elevada exposição à dívida nacional e obrigou o Estado a injetar mais de 3 mil milhões de euros.
As contas do fundo de reserva da Segurança Social voltaram a terreno negativo. Os números mais recentes do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) mostram um desempenho negativo de 13,3% no ano passado, naquele que foi o pior desempenho dos 34 anos de vida do fundo.
Os dados constam do Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2022 do Tribunal de Contas divulgado na terça-feira — note-se que o relatório e contas de 2022 do FEFSS ainda não foi publicado.
Apesar de manter uma rendibilidade média anual positiva de 3,66% nas últimas duas décadas, 2022 foi um ano particularmente negativo para as contas do FEFSS, com o fundo a contabilizar um desempenho inferior a 16,8 pontos percentuais face aos 3,7% registados em 2021.
A pressionar o desempenho negativo do fundo da Segurança Social no último ano esteve a já tradicional exposição a títulos de dívida pública nacional, que em 2022 constituíam 51,1% da alocação do portefólio de ativos do FEFSS, e que contribuíram com um desempenho de -6,3% para o fundo, como resultado de um desempenho negativo de 12,09% da carteira de obrigações e Bilhetes do Tesouro.
Seguiu-se a componente de dívida pública estrangeira que, com uma exposição de 5,4 mil milhões de euros (23,6% da carteira), contribuiu com perdas de 4,2% para o resultado global do fundo, como consequência de uma desvalorização de 17,9% destes títulos.
Também a penalizar a performance do FEFSS em 2022 esteve a carteira de ações (19,5% da carteira) que, ao fechar o ano a cair 13,59%, contribui com perdas de 2,65% para o desempenho global do fundo. Um dos investimentos acionistas que correu mal à equipa de gestão foi a exposição que o FEFSS detinha ao Credit Suisse no montante de 2,7 milhões de euros que ficou reduzido a cinzas, após o colapso do banco suíço – todavia, como pesava 0,006% na carteira, acabou por ter pouco impacto no resultado global do FEFFS.
“Excluindo a valorização marginal da reserva estratégica (+0,02%), apenas os investimentos em imobiliário mantiveram um retorno positivo [em 2022], embora inferior ao do ano anterior (passaram de uma rendibilidade de 23,86% para 4,70%)”, refere o Tribunal de Contas.
Tribunal recomenda uma revisão das regras
A política de gestão do FEFSS está legalmente sujeita a uma série de regras quanto à exposição da sua carteira. Por exemplo, a equipa de gestão só pode investir em ativos com origem em Estados-membros da União Europeia ou da OCDE e não pode exceder uma exposição de 25% da carteira a ações. Além disso, pelo menos 50% do capital tem de estar investido em títulos de dívida pública portuguesa ou outros títulos garantidos pelo Estado português.
Estas regras levam a que o FEFSS permaneça como um dos maiores investidores em dívida pública nacional há largos anos. No final do ano passado detinha 11,8 mil milhões de euros investidos em obrigações e Bilhetes do Tesouro que representavam 51,5% da totalidade do seu portefólio.
No entanto, o Tribunal de Contas salienta que, “desde 2016, ao contrário do determinado, tem-se verificado uma redução do peso da dívida pública nacional e um aumento do investimento em dívida pública estrangeira.” E é neste sentido que já em 2020 recomendou a reavaliação dos critérios de gestão do fundo da Segurança Social, “por forma a assegurar que as regras aplicáveis à estratégia de investimento do FEFSS sejam aquelas que, em cada conjuntura, melhor permitam otimizar a relação entre rendibilidade e risco na gestão dos recursos do fundo.”
Igualmente relevante na política de gestão do FEFSS em 2022 foi a subida considerável do índice de rotatividade da carteira. Segundo o Tribunal de Contas, o turnover da carteira do fundo foi de 1,48, “o nível mais elevado dos últimos cinco anos, com o volume de transações ocorridas em 2022 a corresponder a quase uma vez e meia o valor médio da carteira gerida ao longo do ano. Em 2021, o índice de rotação da carteira do fundo foi de 0,89.
Nunca como em 2022 o fundo de reserva da Segurança Social recebeu tanto dinheiro do Estado. Os mais de 3 mil milhões de euros injetados no FEFSS através de transferências de capital e de alienações de imóveis foi um número recorde em 34 anos de existência do fundo.
Transferências do Estado batem recorde em 2022
De acordo com dados publicados no “Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2022” do Tribunal de Contas, o FEFSS apresentava um saldo de 22,99 mil milhões de euros no final de 2022, menos 0,8% face aos 23,18 mil milhões de euros que contabilizava em 2021, e o equivalente a 9,5% do PIB.
No entanto, “a redução do valor do Fundo só não foi mais acentuada porque o resultado de gestão da carteira bastante negativo (-3,269 mil milhões de euros) foi quase integralmente compensado por entradas de capital (3,081 mil milhões e euros)”, refere o Tribunal de Costas. Trata-se de um valor da dimensão da injeção de dinheiro que o Estado acordou com Bruxelas para recapitalizar a TAP.
Recorde-se que o financiamento do FEFSS é assegurado por diversas fontes de financiamento, no âmbito do previsto na Lei de Bases da Segurança Social (LBSS), “mas também no âmbito do que anualmente tem sido definido em sede de Lei do Orçamento do Estado, designadamente por via de consignação de receitas”, destaca o Tribunal de Contas, como sejam as receitas geradas do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI), da parcela do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e do Adicional de Solidariedade sobre o setor bancário.
Todavia, nunca como em 2022 o fundo de reserva da Segurança Social recebeu tanto dinheiro do Estado. Os mais de 3 mil milhões de euros injetados no FEFSS através de transferências de capital e de alienações de imóveis foi um número recorde em 34 anos de existência do fundo, chegando a superar a totalidade de transferências realizadas nos três anos anteriores somados.
O Tribunal de Contas esclarece que, dos mais de 3 mil milhões de euros transferidos para o fundo de reserva da Segurança Social, 2,6 mil milhões de euros (84%) vieram do saldo anual do sistema previdencial-repartição, 479 milhões de euros (15,5%) de receitas fiscais consignadas (297 milhões de parte da receita do IRC, 148 milhões de receita do AIMI e 34 milhões do adicional de solidariedade sobre o setor bancário) e ainda 700 mil euros de receitas de alienação de imóveis.
De acordo com contas do ECO, desde a constituição do FEFSS em 1989, que contou na altura com uma dotação inicial de 216 milhões de euros, foram injetados mais de 15,5 mil milhões de euros no FEFSS através de transferências de capital e de receitas geradas com a alienação de imóveis. Significa que, no espaço de 34 anos de existência do fundo, apenas 32% do volume de ativos do fundo de reserva da Segurança Social, atualmente nos 22,99 mil milhões de euros, foi gerado pela equipa de gestão.
Além disso, o Tribunal de Contas salienta que, no ano passado, a taxa de crescimento da despesa com pensões foi de 4%, “pelo que se interrompeu a tendência dos últimos cinco anos, em que o valor da despesa com pensões do sistema previdencial cresceu menos que o valor do Fundo”.
Desta forma, a taxa de cobertura das pensões pelo valor do FEFSS, em 2022, foi inferior ao verificado em 2021, passando de 151,2% em 2021 para 144,3% em 2022, “contrariando a tendência de crescimento que se manifestou nos últimos 10 anos”, sublinha o Tribunal de Contas, e voltando a não conseguir assegurar a cobertura das despesas previsíveis com pensões por um período mínimo de dois anos (até hoje nunca foi capaz de o alcançar), como é seu desígnio.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Fundo da Segurança Social afunda 13% e regista pior desempenho de sempre
{{ noCommentsLabel }}