Medina ainda controla cativações de 915 milhões de euros para imprevistos
Verbas do OE para 2024 servem para acudir a situações de emergência, justifica as Finanças. Já a libertação de despesa corrente dos ministérios passa a depender apenas da tutela setorial.
A proposta do Orçamento do Estado (OE) para 2024 passou para os ministérios setoriais o poder de descativar verbas de gestão corrente, mas as Finanças terão sempre a última palavra na libertação de 915 milhões de euros para acudir a situações de emergência, de acordo com os cálculos do ECO e esclarecimento prestados pelo Ministério de Fernando Medina.
Esta fatia das cativações, ainda sob a alçada das Finanças, diz respeito à reserva orçamental alocada a cada ministério, de 415,6 milhões de euros, e à dotação provisional, de 500 milhões de euros, o que totaliza 915,6 milhões, ou seja, segundo dados fornecidos pela tutela ao ECO.
“A dotação provisional e a reserva orçamental são instrumentos de natureza diferente, para acautelar despesas inesperadas”, realça o Ministério para justificar a manutenção destas verbas na dependência das Finanças. “No caso da dotação provisional, trata-se de uma verba inscrita no orçamento do Ministério das Finanças para riscos transversais; no caso da reserva, acautelam-se riscos setoriais, isto é, imprevistos, e, por isso, as verbas estão inscritas nos respetivos orçamentos”, explica a tutela, acrescentando que, “em ambos os casos, a responsabilidade da utilização das verbas é conjunta entre ministério setorial e ministério das Finanças”.
"A dotação provisional e a reserva orçamental são instrumentos de natureza diferente, para acautelar despesas inesperadas.”
Em comparação com as verbas orçamentadas para este ano, a dotação provisional cai cerca de 300 milhões de euros, de 817 milhões para 500 milhões de euros. Em sentido inverso, a reserva orçamental que afeta aos ministérios cresce 93 milhões de euros, de 322,2 milhões de euros para 415,6 milhões, segundo cálculos do ECO com base nos dados facultados pelo Ministério das Finanças.
Há ainda a dotação centralizada das Finanças que serve fins específicos, nomeadamente como contrapartidas em investimentos e obras financiadas por fundos comunitários, por exemplo. No Orçamento de Estado para este ano, o Governo alocou 745 milhões de euros a esta rubrica, valor que deverá ser idêntico em 2024.
Despesa corrente na alçada dos ministérios setoriais
Já as cativações, relativas a despesa corrente, deixam de depender do aval das Finanças, bastando apenas luz verde da tutela setorial.
Recorde-se que, em julho, Fernando Medina anunciou o fim das cativações e depois teve de moderar o tom durante a apresentação do OE para o próximo ano, explicando que, afinal, aquele congelamento não termina, mas apenas muda de mãos. “O que desaparece dentro do Orçamento do Estado, o que é retirado é o poder das Finanças de fazer a gestão das cativações”, afirmou, na altura. Até aqui, “era obrigatória autorização da tutela setorial e das Finanças sobre um conjunto muito vasto de despesas que anualmente estavam fixas no Orçamento”, com esta mudança “acabamos com a participação das Finanças neste processo”, acrescentou.
Ora o governante referia-se unicamente a um dos quatro instrumentos de controlo da despesa ou de racionamento da tesouraria da administração central: as cativações, excluindo as reservas orçamentais de cada ministério, as dotações provisionais e as centralizadas, sendo que estas duas últimas são almofadas afetas ao orçamento das Finanças.
Deste modo, e tendo em conta apenas a rubrica “cativações”, o controlo de cerca de 820 milhões de euros que foram inscritos no OE para 2024 para despesa do dia-a-dia, segundo dados enviados ao ECO pelas Finanças, passa agora para a esfera exclusiva dos ministérios setoriais, deixando de haver necessidade de visto prévio por parte da tutela de Fernando Medina.
“A alteração permitirá agilizar o processo orçamental e melhorar a gestão corrente dos recursos públicos e, logo, dos serviços públicos”, afirmou ao ECO fonte oficial do gabinete de Fernando Medina. Isto significa que, em última análise, já não será preciso autorização das Finanças para comprar papel de impressão, canetas, computadores ou outro tipo de bens e serviços.
Apesar desta alteração, o coordenador da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), Rui Baleiras, ressalva que “o instrumento de cativação não acabou”. “As cativações são um instrumento que vai continuar a atrapalhar os serviços públicos, vai continuar o calvário burocrático da libertação dessas verbas”, afirmou ao ECO o economista, acrescentando que, “apesar de deixar de haver necessidade de autorização das Finanças, será sempre preciso o aval do ministério setorial”. “Este instrumento é um entrave muito grave à gestão de uma instituição”, rematou.
As cativações são um instrumento que vai continuar a atrapalhar os serviços públicos, vai continuar o calvário burocrático da libertação dessas verbas.
A proposta do OE para 2024 prevê o congelamento de 1.235,2 milhões de euros, entre cativações e reservas, uma descida ligeira de 6,9 milhões ou de 0,56% face aos 1.242,1 milhões inscritos no OE para este ano, de acordo os dados recolhidos pelo ECO nos mapas de ambos os documentos.
Analisando as cativações e reservas por tutela, o Ministério das Infraestruturas lidera com 201,9 milhões de euros. Defesa, com 137,2 milhões, e Finanças, com 111,7 milhões de euros, completam o pódio das áreas governativas com mais verbas cativadas.
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