Regime dos residentes não habituais “devia manter-se” para “profissionais qualificados”

João Leão, ex-ministro das Finanças, diz que os benefícios no IRS devem acabar apenas para os pensionistas estrangeiros. Defende também que o Estado mantenha uma posição "significativa" na TAP.

João Leão, que liderou a pasta das Finanças antes de Fernando Medina, afirma que o regime dos residentes não habituais, que permite um ‘desconto’ elevado no IRS, “foi muito positivo para o país” e devia manter-se para os trabalhadores qualificados. Em entrevista ao ECO, defende também que o Estado mantenha uma fatia “significativa” do capital da TAP, de forma a assegurar o hub no aeroporto de Lisboa.

Antes de entrar para o Governo socialista como secretário de Estado do Orçamento de Mário Centeno, João Leão dirigiu o gabinete de estudos do Ministério da Economia. Foi aí que teve o primeiro contacto com o regime fiscal para os residentes não habituais, que permite beneficiar de uma taxa de IRS única de 20% nos rendimentos em Portugal e não pagar pelos obtidos no estrangeiro.

Foi criado no segundo Executivo de José Sócrates, mas só seria aplicado pelo Governo PSD/CDS, mantendo-se com António Costa. Foi o primeiro-ministro que anunciou, numa entrevista à TVI/CNN Portugal, que o regime ia acabar. As propostas legislativas apresentadas no âmbito do Orçamento do Estado ​abrem uma exceção: doutorados que estejam a trabalhar na investigação e desenvolvimento.

João Leão considera que o regime devia ser mais alargado. “Foi um regime muito positivo para o país, embora os portugueses normalmente não se sentem bem porque vêm os estrangeiros beneficiar de benefícios fiscais que eles não têm”, sublinha o antigo ministro. Além disso, “não faz perder receita [fiscal] para o país, porque era uma receita que de outra forma grande parte não vinha”.

Acrescenta ainda que o atual problema no imobiliário não existia na altura. “Havia os problemas dos bancos estarem com excesso de habitação, os preços das casas estavam baixíssimos. Havia até falta de capacidade de atrair pessoas que dinamizassem a nossa procura interna, que ajudassem a economia a recuperar e a crescer”, argumenta.

Agora, perante a pressão imobiliária, afirma que “ao nível dos pensionistas faz sentido descontinuar”. Já, “na parte dos profissionais qualificados devia conseguir-se manter”. E explica porquê.

Portugal teve um sucesso enorme na provisão de serviços na área da tecnologia, na área de serviços, de “backoffice” na área financeira e de contabilidade. Fornecemos para toda a Europa estes serviços e são empresas que muitas vezes vão buscar também parte dos seus profissionais ao estrangeiro.

João Leão

Ex-ministro das Finanças

“Como temos salários que são mais baixos que no resto da Europa, e a própria estrutura de IRS tem que se adaptar a esses salários mais baixos e começa a subir as taxas mais cedo, muitas vezes torna-se difícil atrair quadros qualificados de fora da Europa para Portugal“, assinala.

Acrescenta ainda outro argumento: “É um problema que também tem a ver com o desafio demográfico. Um dos principais desafios que nós enfrentamos é a própria sustentabilidade do sistema social. Conseguir atrair esses profissionais no médio prazo é muito importante.

João Leão, ex-ministro das Finanças e vice-reitor do ISCTE, em entrevista ao ECO - 12OUT23
João Leão, ex-ministro das Finanças e vice-reitor do ISCTE, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

 

Manter posição significativa do Estado na TAP

O Governo aprovou no final de setembro o decreto-lei de reprivatização da TAP, onde se prevê a venda de mais de 51% do capital. João Leão considera que “é importante ter uma posição do Estado na TAP que assegure que o hub [aeroporto] se mantém em Lisboa”.

Para isso considera “muito importante e fundamental” o Estado conservar uma participação significativa no capital da companhia aérea. “Eu admito que seja possível com uma posição de 50%/50% ou uma posição significativa, mesmo que não maioritária, manter, do ponto de vista estratégico, o hub de Lisboa. Esse é o desafio. Tem que se ver com os detalhes de privatização e como o processo é feito”, afirma o ex-ministro das Finanças.

O que seria mais negativo era ter uma situação em que de repente o nosso hub passava para Madrid e perdíamos essa mais-valia muito forte que Lisboa tem.

João Leão

ex-ministro das Finanças

“A TAP é que dá viabilidade ao hub de Lisboa e importa assegurar que a maior parte das ligações para a América do Sul e para os Estados Unidos se mantêm via Portugal. O que seria mais negativo era ter uma situação em que de repente o nosso hub passava para Madrid e perdíamos essa mais-valia muito forte que Lisboa tem”, aponta.

João Leão considera, ainda assim, importante que a TAP venha a estar “estar inserida num grupo que tenha grande capacidade de gestão a nível do setor aéreo e que possa otimizar com as ligações a outras partes do grupo”. Por outro lado, “se a TAP vier no futuro a ter necessidades de capital, o setor privado tem mais facilidade do que o setor público, porque o setor público está sempre sujeito às leis da concorrência que limitam muita a intervenção”. O que “dá uma garantia de maior sustentabilidade”.

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