Marcelo dissolve Parlamento e convoca eleições antecipadas para 10 de março

O Presidente da República vai deixar passar o Orçamento do Estado do Governo demissionário de António Costa e só depois marca eleições antecipadas para 10 de março.

O Presidente da República optou pela “dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições em 10 de março de 2024”, anunciou esta quinta-feira à noite Marcelo Rebelo de Sousa, depois de consultado o Conselho de Estado com o qual esteve reunido durante cerca de quatro horas.

E vai deixar passar o Orçamento do Estado para 2024 antes de assinar e publicar o decreto presidencial que formaliza a aceitação da demissão do primeiro-ministro António Costa: “Quero deixar a garantia da indispensável estabilidade económica e social, que é dada pela prévia votação do Orçamento do Estado, antes mesmo de ser formalizada a exoneração em inícios de dezembro”.

O Chefe de Estado tenciona assim oficializar a demissão de António Costa, e por arrasto de todo o Executivo, só no início de dezembro, dando margem para a aprovação final global, assegurada pela maioria absoluta socialista, do Orçamento do Estado para 2024 no dia 29 de novembro. A partir da publicação do decreto da demissão, o atual Governo entra em modo de gestão, estando mais limitado nos seus poderes. Apenas poderá aprovar atos estritamente necessários e quaisquer propostas de lei caducam automaticamente, segundo a Constituição.

“A aprovação do Orçamento permitirá ir ao encontro das expectativas de muitos portugueses e acompanhar a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que não pára nem pode parar, com a passagem de Governo a Governo de gestão ou com a dissolução da Assembleia da República”, justificou Marcelo num discurso dirigido ao País a partir do Palácio de Belém que durou cerca de sete minutos.

De referir que a decisão do Presidente não reuniu o consenso no Conselho de Estado. Houve mesmo um empate, com oito conselheiros a favor de eleições e oito pela nomeação de um novo governo.

Marcelo destacou ainda a gravidade da investigação criminal: “Pela primeira vez em democracia ficou-se a saber que, respeitando a terceiros, uns seus colaboradores outros não, que o primeiro-ministro ía ser objeto de processo autónomo sobre a jurisdição do Supremo Tribunal de Justiça”. E deixou recados à justiça: “Espero que o tempo mais depressa do que devagar permita esclarecer o sucedido”.

Outra das razões que sustentaram a dissolução e a marcação de eleições em vez de um novo Governo proposto pelos socialistas é a “fraqueza” da solução proposta pelo PS, com a manutenção da mesma maioria mas com qualquer outro primeiro-ministro “para tanto não legitimado política e pessoalmente pelo voto popular”, explicou o Chefe de Estado.

“A devolução da palavra ao povo é a força da democracia, é não ter medo do povo”, destacou, reforçando que, “sem dramatizações, nem temores, é preciso dar a palavra ao povo” para escolher um Governo que garanta “estabilidade” e “progresso económico, social e cultural” em liberdade, pluralismo e democracia.

Marcelo explicou que tentou “encurtar o mais possível o tempo desta decisão, tal como a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições e se não foi possível torná-lo mais breve, isso tem a ver com o processo de substituição na liderança no partido do Governo, como aconteceu no passado”.

Recorde-se que o congresso do PS, que irá eleger o sucessor de António Costa à liderança do partido, só deveria realizar-se entre 15 e 17 de março. Entretanto, e face à decisão de Marcelo, a direção do partido vai propor esta quinta-feira à comissão política que o congresso ocorra mais cedo, nos dias 6 e 7 de janeiro em Lisboa e que as eleições diretas para o cargo de secretário-geral se realizem a 15 e 16 de dezembro.

O Presidente da República quis ainda deixar uma palavra de esperança: “Confio como sempre em vós, portugueses, no vosso patriotismo, espírito democrático, bom senso e liberdade, que são a certeza decisiva no futuro de Portugal”.

Na comunicação ao País, o Presidente da República elogiou o primeiro-ministro pela “elevação do gesto” na forma como se demitiu: “Agradeço a disponibilidade para assegurar funções até à substituição nos termos constitucionais”. E enalteceu “o serviço à causa pública, durante décadas, em particular nos longos e exigentíssimos anos de saída do défice excessivo, saneamento da banca, pandemia e guerras na Ucrânia e no Médio Oriente, na chefia do Governo de Portugal”.

O Conselho de Estado foi convocado esta terça-feira pelo Presidente da República, depois de o primeiro-ministro se ter demitido depois de ter tido conhecimento que estava a ser investigado pelo Ministério Público, no âmbito de suspeições de corrupção ligadas aos negócios do lítio e hidrogénio verde.

Fazem parte deste órgão político de consulta do Presidente da República, 18 conselheiros, sendo que oito são por inerência direta pelos cargos que ocupam: presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, primeiro-ministro, António Costa, presidente do Tribunal Constitucional, José João Abrantes, provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, presidente da Madeira, Miguel Albuquerque, presidente dos Açores, José Manuel Bolieiro, e os antigos presidentes da República, Ramalho Eanes e Cavaco Silva.

Cinco cidadãos são designados pelo Presidente da República: António Lobo Xavier, António Damásio, Lídia Jorge, Luís Marques Mendes, Leonor Beleza. E outros cinco são eleitos pela Assembleia da República: Carlos César, Francisco Pinto Balsemão, Manuel Alegre, António Sampaio da Nóvoa, Miguel Cadilhe.

Na quarta-feira, o chefe de Estado recebeu no Palácio de Belém os oito partidos com assento parlamentar que, à exceção do PS, se manifestaram a favor de uma dissolução e convocação de eleições legislativas antecipadas.

No entanto, os socialistas, que têm maioria absoluta de deputados, propuseram a nomeação de outro primeiro-ministro para chefiar um novo Governo apoiado pela atual maioria. Terão sido indicados personalidades como Mário Centeno, atual governador do Banco de Portugal, Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República, e António Vitorino, ex-ministro da Defesa e ex-comissário europeu, para chefiar o novo Executivo. Os três nomes terão sido rejeitados por Marcelo Rebelo de Sousa.

O primeiro-ministro apresentou na terça-feira a sua demissão, que Marcelo aceitou, depois de buscas em vários gabinetes do Governo, no âmbito de uma investigação do Ministério Público em torno dos negócios do lítio e hidrogénio verde. Em causa estão suspeitas de crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência.

A Operação Influencer visa ainda o agora ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, que foi exonerado destas funções esta quinta-feira, depois deste ter sido constituído arguido.

O ministro da Infraestruturas, João Galamba, também foi constituído arguido. No anterior Executivo de Costa, o governante foi secretário de Estado da Energia do então ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, também implicado neste processo.

O atual Governo resultou de uma dissolução do parlamento, a primeira decretada por Marcelo Rebelo de Sousa, no início do seu segundo mandato presidencial, na sequência do chumbo da proposta de Orçamento do Estado para 2022 na generalidade, e que resultou na vitória do PS com maioria absoluta nas eleições legislativas antecipadas de 30 de janeiro de 2022.

(Notícia atualizada às 20h43)

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