Dos passes ao apoio a contratos sem termo. O que mudou no OE2024 ao fim de dois dias de votações
Ao fim de dois dias de votação na especialidade do Orçamento do Estado, foram aprovadas quase 40 propostas de alteração do PS e quase 60 da oposição. Medidas emblemáticas caíram ou foram adiadas.
Ao fim de dois dias de votação na especialidade do Orçamento do Estado (OE) para 2024, poucas foram as medidas aprovadas com efetivo impacto orçamental. Entre as quase 40 alterações do PS e quase 60 da oposição que tiveram luz verde, saltam à vista a inclusão do serviço de bicicletas partilhadas nos passes de transporte público gratuitos para estudantes, proposta pelo PAN, a retoma do apoio às empresas que passem para os quadros trabalhadores a termo assim como a criação do subsídio de deslocação e de alojamento para universitários e estagiários ou o alargamento da gratuitidade das creches, medidas apresentadas pelo PS, e ainda a abertura de mais 150 salas no ensino pré-escolar, sugerida pelo PCP.
De salientar ainda a abertura do PS para estudar uma proposta da Iniciativa Liberal (IL) de alargar a licença de parentalidade aos trabalhadores independentes, vulgo recibos verdes. Esta é a primeira e, para já, a única iniciativa dos Liberais a ser viabilizada pela maioria absoluta da bancada do PS.
Fatura do gás mantém TOS e fixação da prestação de crédito adiada
Medidas emblemáticas como o fim da repercussão da taxa de ocupação do subsolo (TOS) na fatura dos consumidores de gás natural, reivindicada pelo PCP, acabou por ser chumbada pela maioria absoluta socialista que, inicialmente, estava inclinada para aprovar a medida. A tal ponto que, no primeiro dia de votações, na quinta-feira, o PS pediu para adiar a votação para o final dos trabalhos.
A expectativa era de que iria ser aprovada, mas o partido que sustenta o Governo demissionário de António Costa decidiu, na hora H, rejeitar a proposta dos comunistas que, de resto, ia ao encontro do que tinha sido aprovado no Orçamento do Estado para 2017, na altura suportado pela geringonça, de que aquele custo não deveria ser imputado aos clientes finais.
Outra proposta de peso, como a fixação da prestação de crédito das micro, pequenas e médias empresas (MPME), por iniciativa pelo PS, e cuja votação estava prevista para esta sexta-feira, acabou por ser adiada para o último dia de votações, isto é, próxima terça-feira. Esta medida, que visa atenuar o impacto das subidas das taxas de juro, iria, no fundo, replicar o mecanismo que já hoje existe para as famílias com empréstimos à habitação.
O reforço, proposto pelo PS, das transferências do Estado em 50 milhões, de 360 para 410 milhões de euros, para as empresas de transportes públicos, de forma a assegurar o congelamento dos passes sociais em 30 e 40 euros mensais, para o navegante (Área Metropolitana de Lisboa) e andante (Área Metropolitana do Porto) municipal e metropolitano, respetivamente, também foi adiado para o último dia das votações.
Livre lidera medidas aprovadas
Entre as quase 60 propostas de oposição viabilizadas pelo PS, o Livre lidera o pódio com 21 alterações aprovadas. Segue-se o PAN, com 13, e o PSD, com 12. O PCP viu, para já, oito iniciativas aprovadas e o Bloco de Esquerda (BE) apenas duas. O Chega é o único partido que ainda não conseguiu passar proposta alguma, nestes últimos dois dias de votação na especialidade.
Passe gratuito alargado a bicicletas partilhadas
Entre as medidas de maior relevo que já foram aprovadas pelo Parlamento, o destaque vai para a inclusão do serviço de bicicletas partilhadas nos passes gratuitos dos estudantes, proposta pelo PAN, que foi aprovada com a abstenção de PSD, Chega e PCP e votos a favor dos restantes partidos.
“Durante o ano de 2024, o Governo, em articulação com as autoridades de transportes de cada área metropolitana e comunidade intermunicipal, adota as diligências e alterações legislativas necessárias a assegurar a inclusão dos sistemas de bicicletas partilhadas no âmbito dos passes intermodais gratuitos e dos direitos à utilização gratuita de transportes públicos”, de acordo com o texto do PAN.
De salientar que, a partir do próximo ano, e por iniciativa do atual Governo, os passes de transporte público passarão a ser gratuitos para estudantes até aos 23 anos.
PS quer cartão de mobilidade tipo cartão de refeição
Apesar de ter sido adiada para o último dia de votações, 28 de novembro, o reforço das transferências para as empresas de transporte público para assegurar as devidas compensações pelo congelamento dos preços dos títulos, em 2024, o Parlamento aprovou, esta sexta-feira, a proposta do PS de criação do cartão de mobilidade, que tinha sido prometida pelo atual Executivo. A iniciativa contou com as abstenções de Chega, IL, PCP e BE e os votos favoráveis das restantes bancadas.
Será uma espécie de cartão de refeição que as empresas podem oferecer aos trabalhadores para suportar despesas com transporte público. Recorde-se que o atual Executivo demissionário tinha prometido avançar com esta medida. Em fevereiro, o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, anunciou que o Governo estava “a desenvolver o projeto de cartão de mobilidade, que visa criar uma solução semelhante ao cartão refeição, que será pré-carregado e utilizado em soluções de mobilidade sustentável, bem ou serviços, como passes e títulos de transporte público, incluindo viagens ocasionais, longo curso e sistemas de car ou bike sharing e talvez de velocípedes e carregamento de veículos elétricos”.
Perante a demissão do primeiro-ministro, António Costa, e por arrasto de todo o elenco governativo, e diante de umas eleições antecipadas para 10 de março, a medida vai ficar na gaveta. Por isso, o PS apresenta uma proposta para que, em 2024, o “Governo avalie e determine a criação e a implementação do Cartão da Mobilidade, atendendo a critérios de sustentabilidade ambiental e da mobilidade sustentável, com o objetivo de incentivar as empresas a comparticipar as despesas de mobilidade dos seus empregados, constituindo-se também como uma medida de acréscimo de rendimento das famílias, e fomentando a adoção de soluções de mobilidade sustentáveis e descarbonizadas pelos trabalhadores”, segundo o texto da iniciativa dos socialistas.
“A criação e implementação do Cartão da Mobilidade são regulamentadas por despacho do membro do Governo responsável pela área da mobilidade urbana e pela área das Finanças”, ainda de acordo com a mesma proposta.
Apoio para empresas que passem contratados para os quadros
A renovação, em 2024, do apoio às empresas que convertam os contratos de trabalho a prazo em vínculos permanentes, proposta pelo PS, foi aprovada na quinta-feira com os votos favoráveis do PS e PSD. O PCP votou contra, enquanto o Chega, IL e Bloco de Esquerda optaram pela abstenção.
“Em 2024, o Governo renova o programa Converte+ e reabre as candidaturas, prosseguindo o apoio à conversão de contratos a termo em contratos sem termo. São elegíveis os contratos a termo celebrados até 14 de novembro de 2023“, lê-se na proposta socialista.
Esta medida surgiu no âmbito do acordo tripartido para combater a precariedade, tendo estado em vigor até 31 de março de 2020. Na primeira edição, recebeu 48 mil candidaturas, um “sucesso estrondoso” nas palavras do PS.
O Orçamento do Estado para 2022 previa que o Governo reavaliaria o programa, em função dos resultados, tendo em vista a reabertura de candidaturas. É isso que os socialistas propuseram agora e foi aprovado.
Subsídio de deslocação e alojamento para universitário e estagiários
O Parlamento aprovou por unanimidade uma proposta do PS que alarga o acesso ao complemento de alojamento e de deslocação aos estudantes que frequentem estágios curriculares obrigatórios para o reconhecimento da conclusão do ciclo de estudo e que se encontrem deslocados, nos termos do Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior.
De salientar ainda medidas do PS como a criação de um subsídio mensal de 40 euros para despesas de deslocação de universitários com bolsa de estudos e que não tenham residência. Também foi criado aquilo a que os socialistas batizaram de “ação social indireta”, que vai apoiar residências e cantinas universitárias em 40 euros por cama ocupada e um euro por refeição, respetivamente.
Alargada a gratuitidade das creches a mais instituições
O Parlamento aprovou uma proposta do PS que alarga a “medida da gratuitidade das creches a entidades públicas não abrangidas pela Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, desde que disponibilizem oferta ao público, nos termos já legislados para o alargamento da medida ao setor lucrativo, com efeitos no ano letivo 2023/2024″. A iniciativa contou com os votos da favor de todas as bancadas, exceto do PCP que se absteve.
A mesma proposta estabelece que, durante o ano de 2024, o Governo promove uma Nova Geração do Programa Rede Social, designando-se de Programa Rede de Desenvolvimento Social e Local, que passa “pelo fomento do desenvolvimento social e económico local e a promoção da coesão social e económica dos territórios”.
Governo abre 150 novas salas no pré-escolar da rede pública
O Parlamento aprovou ainda uma proposta do PCP que determina que, em 2024, o Governo abre mais 150 novas salas no ensino pré-escolar da rede pública, em articulação com os municípios. A iniciativa passou com as abstenções do PSD e IL. Os restantes partidos votaram a favor.
“A abertura de salas de educação pré-escolar […] deve ter previamente asseguradas as condições necessárias ao cumprimento do papel e orientações curriculares da educação pré-escolar, designadamente quanto a condições físicas, número e qualificação de trabalhadores, nomeadamente auxiliares de ação educativa e educadores de infância”, de acordo com a proposta dos comunistas.
Reforço do combate à corrupção aprovado por unanimidade
Numa altura em que o primeiro-ministro, António Costa, e outro ex-membro do Governo, João Galamba, até há bem pouco tempo ministro das Infraestruturas, estão a ser investigados pelo Ministério Público, no âmbito da Operação Influencer, por suspeita e corrupção nos negócios do lítio, hidrogénio verde e do centro de dados de Sines, o Parlamento aprovou por unanimidade duas propostas do PAN que reforçam os mecanismos de combate à corrupção.
“Em 2024, o Governo adota as iniciativas necessárias à otimização da capacidade e o reforço da cooperação entre as inspeções administrativas setoriais e os órgãos de polícia criminal especializados nos segmentos da prevenção e repressão da fraude contra os interesses financeiros do Estado, da corrupção e da criminalidade económico-financeira”, de acordo com a iniciativa do PAN que reuniu o consenso de todas as bancadas que votaram a favor.
Uma outra proposta, também do PAN, foi aprovada por todas os grupos parlamentares e prevê que, “até 30 de novembro de 2024, o Governo, em colaboração com o Mecanismo Nacional Anti-corrupção, assegura a divulgação pública de um relatório de monitorização da execução da Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 37/2021, de 6 de abril”.
De resto, houve uma dezena de propostas da oposição, viabilizadas pelo PS, que não terão impacto significativo no Orçamento do Estado, como a aprovação de programas de formação em bem-estar e proteção animal, que consta de uma iniciativa do PAN. Neste projeto, o PS acabou por chumbar o ponto em que o Governo tem de nomear veterinários municipais em falta.
Do mesmo modo, a bancada socialista deu luz verde à integração de estudantes e professores do Médio Oriente, mas rejeitou a afetação de verbas para esse fim.
Para além disso, o PS deixou passar uma proposta do Livre que determina a criação, em 2024, de uma base de dados digital do património imobiliário público. Este ponto aliás foi aprovado por unanimidade. Mas a parte da iniciativa que estabelece que “as despesas necessárias à criação da base de dados provêm de verba a afetar-lhe na dotação proveniente do Orçamento do Estado para a ESTAMO” acabou por ser chumbada apenas com os votos contra da maioria absoluta socialista.
Os deputados vão agora fazer uma pausa no fim de semana e voltam ao plenário na segunda-feira, para terminar de votar todas as alíneas, culminando na votação final global a 29 de novembro.
TAP aqueceu debate no Parlamento. PS muda de ideias em voto da IL
O debate desta sexta-feira começou com a discussão das normas avocadas, que os deputados quiseram voltar a trazer a plenário. Nesses votos, acabou por ser aprovada uma parte da proposta do IL sobre a proteção na parentalidade dos profissionais liberais. Foi aprovado o seguinte: “Em 2024, o Governo estuda a possibilidade e as condições de integração dos profissionais liberais e trabalhadores independentes nos regimes de licenças de parentalidade”.
Durante o debate, um dos temas mais quentes foi a TAP. A Iniciativa Liberal trouxe a proposta para que “todo o cêntimo gerado pela venda da TAP seja devolvido a todos os portugueses” de volta ao Parlamento, depois de ter sido chumbada nas votações de ontem. “Querem eleitoralismo, ponham nos vossos programas o que querem fazer a TAP“, sugeriu João Cotrim Figueiredo que, por seu turno, foi acusado de eleitoralismo pelo Livre com esta proposta. Do lado do PCP, Bruno Dias apontou que “se tivesse sido a IL a decidir já não” estariam a ter aquela “discussão porque já não existia a TAP”, alertando para o partido não “aderir a moda da motosserra”, numa referência a Javier Milei, eleito na Argentina.
Paulo Moniz, do PSD, classificou o ex-ministro Pedro Nuno Santos de “extremista impulsivo” por ter entregado 3,2 mil milhões de euros “dos portugueses. “E agora o PS não tem coragem de rever o seu retorno como receita”, acusou o deputado, frisando que “esta situação desgraça o país e os portugueses”. Já Eurico Brilhante Dias, do PS, reagiu, garantindo que os socialistas estão orgulhos do trabalho que fizeram, nos últimos oito anos, na saúde, na educação, mas também na TAP. A TAP “é uma empresa que contribui positivamente para o OE”, insistiu.
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