O imperativo da sustentabilidade no setor imobiliário e o papel das cooperativas de habitação

  • João Pedro Braz e Susana Brito
  • 11 Dezembro 2023

O setor imobiliário é um grande consumidor de recursos naturais e responsável por cerca de 39% das emissões de carbono no planeta, o que confere à sustentabilidade um estatuto imperativo para o setor.

Em 1962, a Universidade de Chicago publicou “Capitalismo e Liberdade” de Milton Friedman, marcando um ponto crucial no Liberalismo. Esta doutrina enfatiza a responsabilidade social das empresas na procura de lucro dentro da legalidade e num mercado livre. No entanto, a experiência mostrou que esse modelo não assegura um desenvolvimento equitativo e sustentável.

Hoje, a consciencialização sobre o impacto das ações nas gerações futuras coloca a sustentabilidade no centro do debate, levando à reavaliação do papel das empresas, que não devem perseguir exclusivamente o lucro. Rentabilidade, criação de empregos e riqueza já não bastam para garantir a licença social para operar. As empresas são pressionadas, adicionalmente, a adotar práticas sustentáveis, agrupadas em três dimensões conhecidas como ESG: Ambiental, Social e Governança.

O Caso do Setor Imobiliário

O setor imobiliário desempenha um papel fundamental na sociedade, moldando cidades e garantindo o direito à habitação. Com cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) global, contribui significativamente para a economia, emprego e qualidade de vida.

No entanto, é também um grande consumidor de recursos naturais e responsável por cerca de 39% das emissões de carbono no planeta, o que confere à sustentabilidade um estatuto imperativo para o setor, atraindo a atenção de organizações internacionais, legisladores e a opinião pública.

A urgência das alterações climáticas e do aquecimento global tem concentrado a pressão principalmente na dimensão ambiental da sustentabilidade, cada vez mais presente na legislação e nas políticas governamentais, exigindo eficiência energética, gestão de resíduos e redução do consumo de água para evitar multas e sanções. Olhemos, por exemplo, para o programa Compete 2020, que incorporou o princípio “Não Prejudicar Significativamente”, impedindo o financiamento de projetos e empresas que não atendam aos critérios de sustentabilidade definidos.

O setor imobiliário está, portanto, a passar por uma transformação profunda, que exige uma reformulação da forma como se assume a responsabilidade pelo impacto ambiental, eficiência energética, gestão de resíduos, qualidade do ar e consumo de água.

Sem essa transformação e uma genuína preocupação com a sustentabilidade, as empresas do setor não terão licença legal para operar e não poderão construir a reputação necessária para atrair parceiros estratégicos e estabelecer relações de confiança com clientes e partes interessadas.

Em relação às dimensões social e de governança, o setor imobiliário enfrenta desafios menos claros, mas não menos importantes. É crucial valorizar as condições de trabalho, envolver as comunidades locais e promover a equidade e o desenvolvimento económico e social nas áreas de desenvolvimento imobiliário.

A Especificidade das Cooperativas de Habitação

Em Portugal, as cooperativas de habitação são reguladas pela Lei nº 119/2015, que define uma cooperativa como uma associação autónoma de pessoas que se unem voluntariamente para satisfazer necessidades económicas, sociais e culturais comuns. Neste caso em particular, as cooperativas de habitação são reconhecidas como uma solução para o problema habitacional e diferenciam-se da promoção tradicional pela sua especificidade nas dimensões social e de governança.

No que diz respeito ao ambiente, as exigências nas cooperativas dependem das decisões dos cooperadores em relação a projetos, empreiteiros e prestadores de serviços contratados e não se diferenciam significativamente da promoção tradicional.

Já no que diz respeito às dimensões social e de governança, o modelo cooperativo encerra um potencial específico, na medida em que considera o bem comum e as necessidades específicas dos cooperadores, muitas vezes expandindo as suas atividades para incluir serviços que beneficiam a comunidade, como a gestão de espaços comuns e a promoção da equidade económica e social. Além disso, garante a participação efetiva de todos os
cooperadores nas decisões e acesso total à informação, independentemente do capital social que cada um tenha subscrito.

É ainda importante notar que, no modelo cooperativo, o lucro não é o objetivo, uma vez que as cooperativas são entidades sem fins lucrativos. Isso resulta geralmente em casas mais acessíveis, uma vez que o preço de aquisição
corresponde apenas aos custos de construção.

Deste modo, do ponto de vista da sustentabilidade, as vantagens do modelo cooperativo são inegáveis nas dimensões social e de governança, criando condições para um imobiliário mais justo e equitativo, onde as pessoas podem aceder a habitação a preços vantajosos, onde a sua voz e necessidades específicas são consideradas e têm peso efetivo nas decisões e onde à posse de uma habitação se acrescenta um sentido de pertença a uma comunidade interdependente onde todos cooperam para atingir resultados que nenhuma conseguiria sozinha. E isso faz toda a diferença.

  • João Pedro Braz
  • Diretor de Conhecimento e Iniciativas ESG da MOME – Gestora Profissional de Cooperativas de Habitação
  • Susana Brito
  • Diretora Financeira da MOME – Gestora Profissional de Cooperativas de Habitação

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