Exclusivo Christine Ourmières-Widener impedida de trabalhar em empresas de topo depois de ter sido despedida da TAP
Gestora diz que com o despedimento com justa causa no seu currículo fica impedida de trabalhar em empresas cotadas e que se sente "achincalhada" pelo Governo, alegando danos profissionais e pessoais.
A ex-CEO da TAP sente-se “fortemente injustiçada, humilhada e destratada” e diz que a sua carreira de 35 anos “ficou destruída” com o despedimento da TAP por justa causa que, além de danos reputacionais, provocou, também, danos morais e pessoais.
Christine Ourmières-Widener vinca que depois desta situação “jamais conseguirá voltar a ser uma gestora de topo em companhias aéreas de bandeira ou em companhias cotadas em bolsa”, enquanto “mantiver esta mancha no seu currículo”, lê-se no processo que avançou em setembro contra as duas empresas do universo TAP – a TAP S.A. e a TAP SGPS – e a que o ECO teve agora acesso.
E este é um impedimento que a gestora francesa, que se diz “achincalhada” pelo Governo, sente também em “outras indústrias cotadas em bolsa”, tendo em conta que o seu despedimento da TAP por justa causa teve eco além-fronteiras em notícias publicadas por meios internacionais.
Como exemplo desse impacto, Christine Ourmières-Widener refere, no processo, que depois dos ministros das Finanças e das Infraestruturas a terem despedido durante a conferência de imprensa, foi forçada pelo governo do Reino Unido a renunciar ao cargo de administradora não executiva do Met Office, o instituto nacional de meteorologia para o qual trabalhava depois de ter sido nomeada a 12 de fevereiro de 2021, recebendo um salário de 15 mil euros anuais. Cargo que, aliás, desempenhou enquanto assumiu os comandos da TAP. Mas para a gestora francesa a sua nomeação para o Met Office era vista como “o ponto alto” da sua carreira e o cargo que “mais se orgulhava” de exercer por ter sido “nomeada com base na sua reputação e mérito profissionais”, lê-se no documento.
O processo de saída do Met Office arrancou imediatamente após o seu despedimento com justa causa, conhecido a 6 de março de 2023. Dois dias depois, a 8 de março, Christine Ourmières-Widener foi contactada pelo chairman do Met Office a pedir explicações sobre a sua situação na TAP, o que levou a gestora a deslocar-se a Londres “para esclarecer o assunto pessoalmente”. No entanto, de acordo com a documentação do processo a que o ECO teve acesso, no dia 16 de março foi comunicado à gestora que o governo do Reino Unido “estava muito preocupado com o impacto das acusações imputadas” e que a sua permanência no cargo estava a ser analisada pela secretaria de Estado da tutela.
No fim da análise do governo do Reino Unido e depois de Christine Ourmières-Widener ter sido notificada do seu despedimento a 21 de março de 2023, foi comunicado à gestora que a continuação no cargo estava “comprometida” e a 10 de maio o Met Office faz saber que “havia decidido exonerar” a gestora que, “de imediato”, questionou se “estariam dispostos a aceitar a sua renúncia”, refere o documento.
Outro exemplo de danos reputacionais apresentado por Christine Ourmières-Widener passa pela sua qualificação no mercado com “risco superior à média” por uma sociedade gestora de fundos com sede no Reino Unido, a Vintage Asset Management, que por isso, a informou que estava impedida de ser sua cliente para realizar investimentos.
Perante estes prejuízos “vincados por todo o mundo” e tentar “mitigar a situação de descrédito internacional”, em julho, a ex-CEO da TAP foi contactada por uma empresa americana, a Trident DMG, consultora especializada em mitigar danos reputacionais em contexto de crise, de estratégia e de comunicação. Foi ainda contactada pela Status Labs, sedeada no Reino Unido, considerada como a principal empresa de gestão de reputação digital, marketing online e relações públicas. O recurso a estas duas empresas está a ser analisado por Christine Ourmières-Widener, tendo em conta que representam “custos bastante elevados” para a gestora.
O impacto pessoal
Além dos prejuízos profissionais, a gestora alega que também na esfera pessoal sentiu danos e que se sente “vexada” e “rebaixada” na sua “dignidade”.
Além das “graves perturbações de sono” que resultaram em “cansaço e dificuldades de relacionamento familiar e social” a que se soma um “desgosto inarrável”, Christine Ourmières-Widener conta, na ação que deu entrada contra a TAP, que se sente “envergonhada perante os comentários públicos que têm vindo a ser feitos em relação à sua pessoa”, com base “numa história falaciosa arquitetada” pela companhia de aviação “para justificar uma causa e fugir à compensação de uma demissão por mera conveniência”.
A gestora diz ainda que se sente “rebaixada” e “humilhada” perante os seus pares, os seus colegas de carreira, os seus amigos e familiares que se mostraram “surpresos” com a situação e com um “profundo sentimento de pena”. Cenário que Christine Ourmières-Widener defende que “não merecia” e que se vê, desta forma, prejudicada no “direito ao bom nome, honra e consideração social”.
Também o seu marido, Floy Widener – que é uma as 15 testemunhas chamadas pela ex-CEO da TAP – é referido no processo. A gestora diz que se sente “culpada” em relação ao seu marido que a acompanhou na mudança de país que a levou a comprar uma casa que “pensava estar paga” no final do seu mandato na companhia. Com toda esta situação, acrescenta Christine Ourmières-Widener, o seu marido passou a “sofrer de ansiedade aguda, insónias e taquicardias diárias”, comprovadas por um relatório médico entregue ao tribunal.
A demissão de Christine Ourmières-Widener aconteceu na sequência da polémica indemnização de 500 mil euros brutos paga à antiga administradora executiva Alexandra Reis para renunciar ao cargo na TAP, que foi considerada ilegal pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF). O anúncio foi feito a 6 de março pelos ministros das Finanças e das Infraestruturas, Fernando Medina e João Galamba (que entretanto se demitiu), em conferência de imprensa.
O Ministério das Finanças justificou a demissão com a “violação grave, por ação ou por omissão, da lei ou dos estatutos da empresa”, conforme previsto no artigo 25.º do Estatuto do Gestor Público. O que não dá direito a receber qualquer indemnização.
Uma acusação sustentada nas conclusões da auditoria da IGF, que considerou “nulo” o acordo celebrado entre a companhia aérea e Alexandra Reis, por o Estatuto do Gestor Público não prever “a figura formalmente utilizada de ‘renúncia por acordo’ e a renúncia ao cargo contemplada naquele Estatuto não conferir direito a indemnização”, concluindo “que a compensação auferida pela cessação de funções enquanto administradora carece de fundamento legal”.
O mandato da ex-CEO terminou formalmente a 12 de abril, quase 22 meses depois de tomar posse. Além de Christine Ourmières-Widener, também foi demitido o presidente do conselho de administração, Manuel Beja. Alexandra Reis teve de devolver a maior parte da indemnização.
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