Quem são e que negócios têm os novos donos da Farfetch?
Os novos donos da Farfetch da falência são a maioria retalhista de e-commerce da Coreia do Sul com receitas acima dos 20 mil milhões de euros. Porém, na bolsa, as suas ações não param de definhar.
Num rasgo de último recurso para evitar a falência, a Farfetch fechou na segunda-feira um acordo com os sul-coreanos da Coupang que permite à empresa de José Neves receber de imediato a injeção de 500 milhões de dólares sob a forma de um empréstimo, pelo qual pagará uma taxa de juro de 12,5% para garantir a sobrevivência da empresa.
Em troca, não só o primeiro unicórnio português terminará a sua história de cinco anos na bolsa de Nova Iorque, como o controlo das operações da Farfetch passarão para o total controlo da Coupang nos próximos meses.
O negócio foi concretizado através de uma parceria da Athena Topco, uma empresa ligada à Coupang, e da Greenoaks Capital, um dos primeiros e mais próximos parceiros da Coupang. Para a concretização da operação, terá também ajudado o facto de a sociedade financeira Baillie Gifford, principal acionista da Farfetch, ser também um dos principais acionistas da Coupang.
Bom Kim tornou-se milionário aos 40 anos, quando o SoftBank Vision Fund investiu 2 mil milhões de dólares na Coupang, avaliando a empresa em 9 mil milhões de dólares.
Sem qualquer ligação ao mercado de luxo, a Coupang, fundada em 2010 e liderada até hoje por Bom Kim, é uma das maiores retalhistas de comércio eletrónico do mundo, conhecida pelo seu rápido crescimento e inovação no setor do retalho, contando atualmente com operações na Coreia do Sul, Taiwan e Japão — apesar de recentemente ter transferido a sua sede para Seattle, nos EUA, e a sede fiscal para o Estado norte-americano de Delaware.
A capitalização bolsista da Coupang está atualmente nos 29 mil milhões de dólares, cerca de 128 vezes mais que a capitalização bolsista da Farfetch.
A retalhista sul coreana é frequentemente comparada com a Amazon devido ao seu amplo portefólio de serviços e rápida entrega de diferentes produtos, onde pontificam serviços como a Coupang Eats, que opera na entrega de alimentos preparados, a fintech Coupang Pay e a Coupang Play, que oferece serviços de streaming de vídeo.
“É a Amazon com uma UPS ligada a ela; com a DoorDash, com Instacart, com uma pequena pitada de Netflix, e tudo isso está integrado numa plataforma de tecnologia com um grau extremo de centralização no cliente”, referiu Lydia Jett do SoftBank, então um dos membros do conselho da Coupang, antes da realização do IPO da empresa em março de 2021.
Na liderança da empresa desde o primeiro dia está Bom Kim, um empreendedor sul-coreano de 45 anos, que desde a sua adolescência vive nos EUA, tendo frequentado a Deerfield Academy, em Massachusetts, e formou-se na Harvard University. A sua biografia revela que Kim ainda frequentou a Harvard Business School, mas acabou por abandonar a universidade no segundo semestre.
Bom Kim tornou-se milionário aos 40 anos, quando o SoftBank Vision Fund investiu 2 mil milhões de dólares na Coupang, avaliando a empresa em 9 mil milhões de dólares. Atualmente, Kim conta com uma participação de cerca de 10% na Coupang, que lhe confere grande parte de uma riqueza líquida avaliada pela Forbes em 2,8 mil milhões de dólares.
O percurso em bolsa deixa muito a desejar
Cotada na bolsa de Nova Iorque, a Coupang fechou os primeiros nove meses do ano com receitas líquidas de 15,7 mil milhões de dólares, que se traduziu num crescimento homólogo de 15,3%, e alcançou lucros de 327 milhões de dólares, que comparam com prejuízos de 194 milhões de euros no mesmo período do ano passado.
Os números apresentados no início de novembro revelam também uma empresa com uma margem EBITDA de 4,4% nos primeiros nove meses do ano, cerca de quatro vezes mais do que o registado há um ano. No decorrer da apresentação dos resultados, Bom Kim destacou a expansão da seleção de produtos e o crescimento do programa de membros Eats WOW como fatores responsáveis para o desempenho positivo da empresa neste período.
Apesar dos números sonantes dos primeiros nove meses do ano, a empresa de Bom Kim não está livre de desafios e, em grande medida, tem uma história em bolsa que se assemelha em alguns episódios à própria história da Farfetch.
Após angariar 4,6 mil milhões de dólares no IPO em março de 2021, que tornou a operação da Coupang no maior IPO de uma empresa asiática na bolsa de Nova Iorque após a operação da Alibaba em 2014, as ações da Coupang não têm parado de cair.
Desde 11 março de 2021, quando as ações chegaram a negociar nos 63,5 dólares, que os títulos da retalhista sul coreana acumulam até esta segunda-feira uma desvalorização de 75%, sendo atualmente transacionados por 16,15 dólares. Só na sessão de ontem, como resultado do anúncio da compra da Farfetch, as ações afundaram mais de 5%.
A Farfetch também teve um início de vida em bolsa bastante auspicioso, angariando quase 900 milhões de euros com o IPO em setembro de 2018, e com as ações a dispararem 43% logo no primeiro dia de negociação. No entanto, menos de um ano depois, as ações da Farfetch negociavam a metade do preço do IPO, como resultado dos elevados prejuízos da operação e de dúvidas sobre a aquisição da New Guards.
Depois disso, as ações recuperaram e até chegaram a negociar acima dos 70 dólares em fevereiro de 2021, mas depois foi sempre a cair, terminando na sexta-feira a cotar nos 0,64 dólares, que se traduzirá num valor nulo na carteira dos seus acionistas com a operação de compra pela Coupang.
Sinergias existentes entre a Farfetch e a Coupang
Pouco se conhece sobre os planos da Coupang para a Farfetch, mas será difícil não considerar uma continuação do processo de reestruturação do grupo, que só este ano até agosto contava já com a redução de 800 pontos de trabalho (cerca de 11% dos seus funcionários) e com o encerramento da sua divisão de beleza, que até então somava apenas dois anos e avultados investimentos realizados.
Se no plano da remodelação do negócio as notícias não prometem ser positivas, há uma série de sinergias entre as duas empresas que se vislumbram no horizonte, que se destacam em áreas como expansão de mercado, tecnologia, logística e experiência do cliente.
- Expansão de mercado: A forte presença da Coupanga no continente asiático, especialmente na Coreia do Sul, pode oferecer à Farfetch acesso a um novo mercado de consumidores de luxo. A Coreia do Sul é conhecida pelos elevados níveis de gasto per capita em bens de luxo. Isso pode ajudar a Farfetch a expandir a sua base de clientes e aumentar as vendas. A colaboração entre as duas empresas pode também abrir oportunidades para campanhas de marketing cruzado, aproveitando as vantagens de ambas as operações para promover produtos e serviços de luxo em diferentes regiões e segmentos de consumidores.
- Melhoria dos processos de logística: A empresa sul-coreana é reconhecida pela eficiência das suas operações de logística e pela capacidade de entrega rápida. A integração com a Farfetch pode melhorar significativamente todos os processos de entrega e de logística dos produtos de luxo da Farfetch, proporcionando uma vantagem competitiva em termos de satisfação do cliente.
- Tecnologia e inovação: A Coupang tem investido muito em tecnologia para otimizar as suas operações de comércio eletrónico. Essa expertise tecnológica deverá ser transferida para a Farfetch, ajudando a plataforma a melhorar a sua infraestrutura de e-commerce, tanto ao nível da experiência dos utilizadores como ao nível da análise de dados. Além disso, a combinação das duas empresas pode criar uma plataforma de e-commerce ainda mais poderosa e abrangente.
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