Vasco de Mello, presidente da Associação Business Roundtable Portugal, espera que a descida do imposto sobre os lucros das empresas avance já no Orçamento do Estado para o próximo ano.
O presidente da Associação Business Roundtable Portugal, Vasco de Mello, defende que a descida do IRC deve acontecer “o mais rápido possível”, já no Orçamento do Estado do próximo ano. É contra a existência de taxas progressivas no imposto – “uma situação anormal” – e considera o sistema fiscal português “extraordinariamente complexo”.
A fechar o mandato de três anos à frente da BRP, Vasco de Mello deixa elogios à colaboração com o IEFP e ao acolhimento pelo anterior Governo das propostas da associação para a simplificação do licenciamento. Já na justiça – “é um bloqueio significativo que temos” – houve “maior dificuldade de encontrar um campo de colaboração”.
O responsável rejeita que será mais fácil ver as propostas da associação aplicadas com o novo Executivo: “A nossa associação é completamente apartidária e trabalhará com qualquer governo”.
A associação BRP elege esta segunda-feira uma nova direção, que será liderada pelo empresário Carlos Moreira da Silva. Vasco de Mello ficará com vogal. “Não me vejo a voltar a ter posições executivas”, diz.
Como é que foi a relação da associação BRP com o Governo nestes três anos?
O BRP identificou três pilares essenciais para desenvolver a sua atividade. O pilar das pessoas, onde identificámos o tema da requalificação, principalmente de pessoas em risco de perder o emprego ou pessoas já desempregadas. E aí tivemos uma colaboração excelente com o IEFP, em que participámos na elaboração dos currículos dos cursos e na identificação dos candidatos. Este é um aspeto onde o relacionamento com o Estado correu muito bem. Tivemos uma fase piloto, estamos agora a começar a alavancar o PRO_MOV.
Outro pilar é o das empresas, o tema de ganharem escala. Se conseguirmos crescer 10% o número de grandes empresas, que são cerca de 1.300 em Portugal, para num período de três anos termos mais 130 empresas, isso tem um efeito muito significativo na taxa de crescimento do país. Entre 2020 e 2022, quando a economia portuguesa até cresceu mais do que nas décadas anteriores, as empresas nossas associadas cresceram acima de 50%, enquanto o resto do país cresceu cerca de 21% [em termos nominais].
Existem entre 11 mil a 17 mil milhões de euros em litígio com o Estado. É um valor enorme bloqueado, 6% ou 7% do nosso PIB.
Há outras áreas em que sentiram pouca recetividade da parte do Governo?
No terceiro pilar, o do Estado, no licenciamento houve alterações importantes que nos parece irem ao encontro daquilo que é necessário para o país poder crescer mais. Também aí o contributo do BRP foi bem aceite.
Mas foi traduzido na legislação?
Traduziu-se na simplificação dos licenciamentos, onde passa a haver um menor número de obrigações de licenciamento prévio, passa a haver prazos rigorosos em termos da informação que pode ser pedida, tempo de resposta e também diferimentos tácitos.
A justiça continua a ser, naquilo que é a atuação do Estado, o maior calcanhar de Aquiles da economia portuguesa?
A justiça é um bloqueio significativo que temos. Foi também uma área onde tivemos maior dificuldade de encontrar um campo de colaboração. Acabámos por considerar que onde podíamos aportar algum algum valor seria no tema da justiça económica e fizemos uma proposta para se alargar o âmbito dos tribunais arbitrais, fiscais e administrativos, no sentido de o limite de 10 milhões poder ser significativamente alargado. Até porque, olhando para o passado, as decisões que foram tomadas em tribunal arbitral têm uma percentagem de sucesso para os privados ou por Estado equivalente àquilo que acontece nos tribunais administrativos regulares. Pode parecer um tema pouco relevante, mas existem entre 11 mil milhões a 17 mil milhões de euros em litígio com o Estado. É um valor enorme bloqueado, 6% ou 7% do nosso PIB.
Sente que com o novo Governo poderá existir maior apetência ou maior vontade de acolher essa sugestão e outras do BRP?
A nossa associação é completamente apartidária e trabalhará com qualquer governo. A nossa associação não é, digamos, uma associação sindicalista. Não está a defender os interesses imediatos dos nossos associados, mas aquilo que é o interesse do país. Se o país crescer muito mais, for mais eficiente, as nossas empresas também beneficiarão. Tenha a certeza que qualquer governo estará interessado em ouvir as propostas. São propostas práticas, de empresas de sucesso, que têm um impacto enorme na economia portuguesa.
Uma das medidas que este novo Governo tem no programa, e que vai ao encontro daquilo que são as propostas da Associação BRP, é a redução faseada do IRC para 15%. Vê condições políticas para essa medida avançar?
Eu espero que haja essas condições. Este é um fator de falta de competitividade em relação aos outros países e que afeta o crescimento. O sistema fiscal é extraordinariamente complexo, tão complexo que entidades como o Banco de Portugal, a administração fiscal e a própria União Europeia não conseguem ter um número comum sobre qual é a taxa efetiva, que varia entre 19 e 20 e picos por cento. Se a taxa que as empresas pagassem fosse 19% já seria muito razoável. Compara mal, mesmo assim, com a taxa global para as multinacionais, de 15%.
Se me pergunta se seria vantajoso a baixa de taxas [do IRC] ser o mais rápido possível? Eu não tenho dúvidas nenhumas que sim.
Gostava que essa descida faseada do IRC começasse já com o Orçamento de Estado para o próximo ano.
Outro aspeto relevante é o tema da discriminação relativamente às empresas que têm melhores resultados e, portanto, maior sucesso. Haver taxas progressivas no IRC é uma situação anormal. Pode acontecer numa situação de crise, como aconteceu, mas em situação de normalidade não deveria existir. Se me pergunta se seria vantajoso a baixa de taxas ser o mais rápido possível? Eu não tenho dúvidas nenhumas que sim.
A Associação BRP tem tido algum tipo de diálogo ou relação com as outras associações patronais ou com sindicatos?
Sim, o BRP é uma associação colaborativa. Em vários dos nossos programas temos um relacionamento e colaboração com várias das associações e confederações. Isso irá com certeza continuar.
Mobilizámos um número muito significativo de colaboradores dos associados. Temos mais de 300 pessoas a trabalhar nos diversos grupos de trabalho.
Fará algum dia sentido a associação entrar na concertação social?
Não. Consideramos que a nossa associação está muito bem como está. O tema de parceiro social está coberto por outras confederações e associações e nós não queremos de forma nenhuma substituir [esse papel]. A nossa associação, tendo identificado os pilares de funcionamento, criou um conjunto de grupos de trabalho onde mobilizámos um número muito significativo de colaboradores dos associados. Temos mais de 300 pessoas a trabalhar nos diversos grupos de trabalho. No entanto, não é uma associação fechada. Está aberta à participação de outras empresas e entidades, como consultores. Lançámos um programa, o Comparar para Crescer, em que tivemos a colaboração da KPMG.
Concorda que Portugal devia estar a comparar-se com os países que crescem a um ritmo mais acelerado na Europa, nomeadamente no Leste, em vez da média da União Europeia ou com a França ou a Alemanha?
Certamente. Nós consideramos que Portugal deveria ter a ambição de crescer 3,9%. Porquê 3,9%? Porque um conjunto de países que em 2000 tinham uma situação parecida com a nossa teve um desempenho muito diferenciado. Passámos de uma posição no ano 2000, onde estávamos em 15.º lugar em PIB per capita e hoje estamos em 21.º. Nós temos que crescer mais do que esses países. Com os 3,9%, e esses países a crescerem na média daquilo que cresceram no passado, em duas décadas voltamos a atingir a 15.º posição em termos de PIB per capita. Este tem que ser o mínimo de ambição que nós precisamos ter.
Em 2023 e 2024 saíram três associados: a Feedzai, a Talkdesk e a Logoplaste. Porque aconteceram estas saídas?
É natural numa associação como o BRP, onde as empresas associadas dão uma parte significativa de esforço das suas equipas. É natural que algumas empresas considerem que o podem fazer melhor dentro de outras entidades ou tenham outras prioridades.
Não foram divergências?
Diria que as divergências são algo de positivo, na medida em que da discussão acaba por sair um consenso que consegue incorporar o melhor da decisão. Penso que é realmente um tema de prioridades, de perspetiva de impacto diferenciado. Acho que é absolutamente natural.
Continuarei como membro da direção do BRP e, desse ponto de vista, a dar o meu contributo. Mas não me vejo a voltar a ter posições executivas.
Entrarmos também em quatro novas empresas — a Generali Tranquilidade, o Grupo Sousa, a Tabaqueira e o Vigent Group. A ideia é continuar a aumentar este universo de empresas da Associação BRP?
A Associação BRP é uma associação aberta, mas tem uma característica que consideramos muito importante: reúne duas vezes por ano os responsáveis máximos das empresas associadas à volta de uma mesa. Nós estamos disponíveis para continuar a acolher novos associados, mas temos esta limitação de que temos que ter um número suficientemente controlado para que possamos estar todos à volta da mesa.
Esta foi a última vez em que assumiu funções de liderança executiva. Ou ainda se vê a exercer o mesmo tipo de funções noutra empresa ou associação?
Hoje não penso vir a exercer outras funções executivas. Continuarei como membro da direção do BRP e, desse ponto de vista, a dar o meu contributo. Mas não me vejo a voltar a ter posições executivas.
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