Que carteiras ganham com o programa do Governo?

  • Filipe Grilo
  • 7 Maio 2024

Parece muito improvável que este programa consiga colocar a economia portuguesa a crescer significativamente de forma a engordar as carteiras dos portugueses.

Após a aprovação do programa do Governo, muitos portugueses devem estar a perguntar se o programa vai impactar a sua carteira. Do lado do Governo, ficou prometido um aumento dos rendimentos, mas a oposição não parece muito convencida. A resposta a esta pergunta exige um exercício simpático de futurologia, especialmente porque uma grande parte das medidas foi descrita de forma genérica e vaga.

Mas vamos por partes. Em teoria, o Governo pode aumentar o rendimento disponível dos contribuintes de duas maneiras principais: impulsionando o crescimento económico, refletindo-se num aumento generalizado dos salários; ou atribuindo benefícios diretos, como a redução do IRS ou o aumento de salários e apoios que possam ser diretamente influenciáveis pelo Governo.

Começando pela primeira alternativa, parece muito improvável que este programa consiga colocar a economia portuguesa a crescer significativamente de forma a engordar as carteiras dos portugueses. Digo isto porque o programa do Governo está fortemente apoiado num alívio fiscal de 5 mil milhões de euros (distribuído ao longo de três anos) que visa aumentar o consumo e pouco faz para aumentar a capacidade produtiva do país. As medidas destinadas ao aumento do consumo incluem a redução do IRS e do IVA da construção e as medidas para os jovens (o IRS e IMT), num total de 3 mil milhões de euros.

Já as medidas que estão pensadas para alterar a forma como as empresas produzem são duas. Relativamente à primeira, acreditar que a isenção de impostos no 15º mês vai alterar a capacidade produtiva do país implica acreditar na teoria do trabalhador português preguiçoso e desmotivado. Aparentemente há quadros no PSD que acreditam que o trabalhador português só trabalha em condições se tiver uma cenoura à sua frente. A forte emigração com sucesso dos portugueses qualificados não parece ser suficiente para ensinar alguma coisa aos quadros do PSD. Relativamente à segunda, a redução de IRC dificilmente será aprovada pelo PS e, mesmo que fosse aprovada, o facto de o presidente da Confederação Empresarial de Portugal afirmar que não considera esta medida urgente diz muito sobre o impacto esperado desta medida. Portanto, não me parece que seja por aqui que as carteiras vão engordar.

Considerando que este alívio fiscal não deverá provocar mudanças significativas na economia, vamos então aos benefícios diretos. A redução adicional de 348 milhões de euros no IRS, anunciada pela AD, não vai trazer grandes alívios para a maior parte das carteiras, incidindo bem mais nas carteiras mais recheadas: 66% dos agregados familiares deverão ter um alívio adicional anual a rondar os 100 euros, enquanto os agregados familiares que se situam nos 10% mais ricos (acima de 40 mil euros anuais) terão uma redução adicional média de 600€ – quase o dobro da proposta do PS. Assim, se o leitor se encontra neste último grupo, poderá sentir uma folga média adicional de 50 euros mensais no seu IRS.

Além desta redução de impostos, o programa do Governo propõe aumentar diretamente certas classes profissionais. Tendo em conta o contexto de um Governo fragilizado com a necessidade de ganhar votos nas eleições Europeias para reforçar a sua legitimidade na legislatura, a situação orçamental ligeiramente mais confortável pode criar a tentação para distribuir dinheiro por classes que podem influenciar a votação, como a função pública e os pensionistas. É por isso que surgem menções a valorizações de várias carreiras e ao complemento social para idosos. Se o leitor pertencer a estas classes, pode considerar-se com sorte.

  • Filipe Grilo
  • Professor convidado, Porto Business School

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