Criação de tribunal arbitral ad-hoc na obra do novo hospital em Évora foi ilegal
A decisão da ARS "constitui um desrespeito do princípio da transparência e da separação em todos os níveis entre a advocacia e um tribunal arbitral". O relatório será remetido ao Ministério Público.
O Tribunal de Contas (TdC) concluiu que houve ilegalidades na constituição de um tribunal arbitral para apreciar um pedido de compensação financeira da empresa construtora do novo Hospital Central do Alentejo, em Évora, foi divulgado esta terça-feira.
Em comunicado, o TdC indicou que a criação do tribunal arbitral no âmbito do contrato entre a Administração Regional de Saúde (ARS) do Alentejo e a Acciona para a construção do hospital “não se encontrava suficientemente fundamentada e foi ilegal”.
Segundo o Tribunal de Contas, esta é a principal conclusão da ação de fiscalização realizada no âmbito dos trabalhos de auditoria de acompanhamento da execução do contrato de empreitada, assinado em dezembro de 2020. O relatório será remetido ao Ministério Público.
A fiscalização, realçou, visou apreciar “a conformidade legal” da constituição e do funcionamento do tribunal arbitral, a contratação de assessoria jurídica e pagamentos efetuados pela ARS do Alentejo relacionados com o processo arbitral.
“Este tribunal arbitral foi constituído a 21 de abril de 2022 – o valor da ação foi fixado em 71,1 milhões de euros e o total dos encargos com os honorários dos árbitros e custos administrativos em 353,7 mil euros – sem que, nos termos da lei, a Acciona tivesse direito à sua constituição e a entidade pública tivesse o dever de aceitar a proposta”, sublinhou.
O TdC disse ter concluído também que a decisão do conselho diretivo da ARS do Alentejo (de constituir o tribunal arbitral) “pressupunha a realização de uma avaliação prévia, nos termos do artigo 476.º do Código dos Contratos Públicos, que não foi realizada”.
Assinalando que a ARS aceitou que o tribunal arbitral ficasse sediado no escritório da sociedade de advogados que conduziu o processo, os juízes consideraram que esta decisão “constitui um desrespeito do princípio da transparência e da separação em todos os níveis entre a advocacia e um tribunal arbitral”.
“A ação de fiscalização permitiu concluir ainda que o pagamento dos honorários do árbitro presidente e da secretária do tribunal arbitral têm vindo a ser realizados, por determinação do próprio árbitro presidente, à sociedade de advogados de que é sócio e de que a secretária é advogada e não diretamente às pessoas designadas para o exercício de tais funções”, referiram.
Esta conduta, vincou o TdC, “carece de fundamento legal, por o contrato de árbitro ter sido realizado com o presidente do tribunal arbitral e não com a sociedade de advogados de que é sócio”. “Os pagamentos à sociedade de advogados, no montante de 28,3 mil euros, não respeitaram a qualquer contraprestação efetiva e são suscetíveis de ocasionar responsabilidade financeira reintegratória dos membros do conselho diretivo da ARS do Alentejo”, acrescentou.
O tribunal recomenda ao Ministério da Saúde o cumprimento das regras relativas à constituição e funcionamento dos tribunais arbitrais, à realização de despesa e pagamentos e às normas da adjudicação de contratos de aquisição de serviços jurídicos mediante ajuste direto selecionado em função de critérios materiais.
No início de outubro de 2022, o Jornal de Negócios (acesso pago) noticiou que a Acciona reclamava uma compensação ao Estado de mais 50 milhões, em sede de tribunal arbitral, relativa à empreitada do novo Hospital Central do Alentejo. O futuro hospital, que está a ser construído pela Acciona na periferia de Évora, deverá ter cerca de 360 camas em quartos individuais, uma capacidade que pode ser aumentada, se necessário, até às 487 camas.
A nova unidade, cujas obras deverão terminar no final deste ano, custa mais de 200 milhões de euros e vai ter, entre outras valências, 11 blocos operatórios, três dos quais para atividade convencional, seis para ambulatório e dois de urgência, cinco postos de pré-operatório e 43 postos de recobro. Em comunicado, o TdC indicou que a criação do tribunal arbitral no âmbito do contrato entre a ARS do Alentejo e a Acciona para a construção do hospital “não se encontrava suficientemente fundamentada e foi ilegal”.
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