O que está a travar a ida de Costa para o Conselho Europeu

Uma proposta surpresa e um sentimento de exclusão colocaram os sociais-democratas e a direita radical como os protagonistas do impasse nas negociações para os cargos de topo em Bruxelas.

Ao fim de quase seis horas de negociações – a que se somaram mais umas horas de um encontro prévio entre os principais negociadores do Partido Popular Europeu (PPE) e a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) – os 27 líderes europeus não chegaram a acordo sobre o quarteto que irá liderar o executivo comunitário nos próximos cinco anos.

Foi um desfecho imprevisível já que, até ao final da tarde de ontem, Ursula von der Leyen, António Costa, Roberta Metsola e Kaja Kallas eram dados como (quase) certos para liderar a Comissão Europeia (CE), o Conselho Europeu (EUCO), o Parlamento Europeu e representar a política externa da UE ao mais alto nível, respetivamente. A surpresa chegou momentos antes do arranque do encontro informal entre os líderes, em Bruxelas, quando os sociais-democratas pediram a rotação da presidência do EUCO entre os socialistas e o PPE, dois anos e meio para cada um. Uma proposta que não terá agradado aos socialistas dentro da sala, que esperavam que o primeiro, e um eventual segundo mandato (que tipicamente é garantido), ficasse para António Costa.

Com esta surpresa, nem a recondução de von der Leyen na Comissão Europeia por mais cinco anos ficou assegurada apesar das garantias de Emmanuel Macron, da França, e Olaf Scholz, da Alemanha, nos últimos dias, de que estavam perto de um acordo, segundo o Politico.

“Foi uma boa ocasião para partilhar opiniões, para fazer o rescaldo das eleições e preparar o Conselho Europeu, da próxima semana. Estamos na direção certa mas esta noite ainda não foi possível chegar a um acordo”, anunciou o presidente do EUCON, Charles Michel, no final do encontro. A expectativa do belga é, no entanto, de que até ao dia 27 de junho a próxima equipa governativa fique fechada, para que seja formalmente apresentada ao resto da UE.

Mas além de ser imperativo que a proposta de um mandato rotativo seja ultrapassada, os líderes do hemisfério político mais à direita também querem ser incluídos nas negociações. Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria e líder do Fidesz, ex-membro do PPE, recorreu à rede social X (antigo Twitter) para dizer que “a vontade dos cidadãos europeus foi ignorada hoje em Bruxelas”.

“O resultado das eleições europeias é claro: os partidos de direita saíram reforçados, a esquerda e os liberais perderam terreno. O PPE, por outro lado, em vez de ouvir os eleitores, acabou por se aliar aos socialistas e aos liberais: hoje fizeram um acordo e dividiram entre si os cargos de topo da UE“, afirmou o governante, assegurando que não irá “ceder”.

 

Gerogia Meloni, primeira-ministra italiana e líder do partido Conservador e Reformista Europeu (ECR), que tem sido a governante predileta nas negociações com Ursula von der Leyen, também se terá sentido excluída apesar de ter sido uma das vencedoras das eleições europeias. O seu partido, Fratelli d’Italia, venceu as eleições europeias no país com 28% dos votos, tornando-se numa das figuras mais poderosas da União Europeia, mas não o suficiente para que a sua família política seja incluída nas negociações para os cargos de topo e influencie o sentido de voto no Parlamento.

Fonte próxima das negociações adiantou ao Politico que a primeira-ministra italiana “contestou o tipo de abordagem da discussão” e que considerou que “a reunião informal deveria ter sido o momento para discutir o que fazer à luz” dos resultados eleitorais “e, a partir daí, iniciar a discussão sobre os nomes para os cargos de topo, e não vice-versa”, acrescentou a mesma fonte.

Além do partido de Meloni, também em França, o Rassemblement National (RN) de Jordan Bardella foi o grande vencedor das europeias, obtendo o dobro da votação do partido de Emmanuel Macron. Os resultados levaram Macron a dissolver o parlamento francês e a convocar eleições antecipadas para o final do mês. Já na Alemanha, apesar do Alternativa para a Alemanha não ter ganho, acumulou votos suficientes para ficar em segundo lugar, enquanto os sociais-democratas do SPD ficaram atrás.

Apesar de tudo, por cá, Luís Montenegroque entretanto já manifestou apoiar uma eventual candidatura de António Costa para a presidência do Conselho Europeumantém-se confiante de que até ao final do mês será consensualizada uma proposta, e sinaliza que a decisão final permanecerá nas mãos dos três maiores grupos políticos: o PPE, S&D e os liberais do Renovar Europa.

“Não tendo havido nenhum desenvolvimento final, creio que se começa a esboçar que as três principais famílias políticas com maior representação (…) chegarão, na próxima reunião, a um acordo quanto à Presidência da Comissão, do Conselho e à designação do Alto Representante [para os Negócios Estrangeiros]”, afirmou o primeiro-ministro no fim do encontro.

A negociação vai continuar até ao fim da próxima semana, quinta e sexta-feira, quando os líderes se voltarem a sentar à mesa das negociações. Os dirigentes da UE voltarão a reunir-se em Bruxelas a 27 e 28 de junho, na esperança de chegar a acordo sobre os líderes do bloco antes da votação no Parlamento Europeu do próximo Presidente da Comissão, prevista para acontecer na primeira sessão constitutiva no Parlamento, meados de julho.

Ursula von der Leyen e Roberta Metsola — se forem propostas — serão as primeiras a tentar passar no teste, em Estrasburgo, uma vez que a recondução de ambas na presidência da Comissão Europeia e no Parlamento, respetivamente, depende também da aprovação de uma maioria qualificada de eurodeputados.

No caso de António Costa, se o nome for proposto para a presidência do Conselho Europeu, será necessário apenas que uma maioria dos líderes do bloco o apoie, e que estes, representem pelo menos 65% da população europeia.

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