Economia precisa de crescer mais de 2,5% no resto do ano para atingir meta do Governo
Conseguir um crescimento de 2% no conjunto do ano obriga a que PIB aumente a um ritmo médio de 2,5% nos próximos trimestres, um cenário improvável. Ventos de abrandamento na zona euro penalizam.
A economia portuguesa tem de crescer em média mais de 2,5%, em termos homólogos, no terceiro e no quarto trimestre, para alcançar a estimativa do Governo de mais de 2% na globalidade do ano, de acordo com cálculos do ECO.
No segundo trimestre, o Produto Interno Bruto (PIB) avançou 1,5% na comparação homóloga, taxa idêntica à registada nos primeiros três meses do ano, segundo os dados publicados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) na terça-feira. O crescimento quase estagnou (0,1%), na comparação face ao último trimestre, após uma taxa de 0,8% entre janeiro e março.
Neste cenário, para Portugal crescer 2% na globalidade do ano, em cadeia, o PIB teria de avançar a uma média de 0,8% quer no terceiro, quer no quarto trimestre, o correspondente a uma taxa homóloga de cerca de 2,5%. No Programa de Estabilidade, num cenário de políticas invariantes, o Ministério das Finanças apontava para uma expansão do PIB este ano de 1,5%. Contudo, após o desempenho acima do esperado no arranque do ano, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento colocou a fasquia mais elevada. “Os números que temos indicam que, quer em 2024, quer em 2025, teremos um crescimento superior a 2% em termos reais”, disse este mês no Parlamento.
“É cada vez mais difícil imaginar um cenário de crescimento económico acima de 2% em Portugal em 2024. Os efeitos económicos desfavoráveis da prolongada política monetária restritiva do Banco Central Europeu (BCE) generalizam-se gradualmente a todos os setores de atividade”, destaca o economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Monteiro Rosa, em declarações ao ECO.
O economista alerta que “as elevadas taxas de juro penalizam não só a procura interna portuguesa, sobretudo o investimento e o consumo privado, mas também a procura externa, especialmente da Zona Euro, o principal destino das exportações nacionais, sendo, assim, difícil imaginar um crescimento económico nos últimos seis meses do ano melhor do que o primeiro semestre”.
Economistas consideram pouco provável atingir um crescimento acima de 2% na globalidade de 2024
O diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, Pedro Braz Teixeira, em declarações ao ECO, alerta que os dados divulgados pelo INE levariam “por si só, a uma revisão em baixa da estimativa para o conjunto do ano”. Contudo, ainda “tem que se acrescentar que os dados preliminares do terceiro trimestre são de abrandamento da economia mundial, apresentando-se especialmente negativos para a Alemanha”.
“Assim, um crescimento acima dos 2% passou a ser muito menos provável”, considera.
Uma opinião partilhada por Ricardo Ferraz, investigador no ISEG e professor na Universidade Lusófona: “Este valor [acima de 2%] não é impossível de atingir, mas é exigente, principalmente numa conjuntura externa que ainda não é a melhor“, disse em declarações ao ECO, apontando para “uma enorme incerteza estando as tensões geopolíticas a aumentar de forma muito preocupante”. “Vivemos uma espécie de Guerra Fria 2.0 e isso não é bom para nenhuma economia”, refere.
O NECEP – Católica Lisbon Forecasting Lab, coordenado por João Borges Assunção, também considera que “o crescimento para a totalidade deste ano está numa trajetória abaixo de 2%”.
Por seu lado, o governador do Banco de Portugal assinalou que os dados do crescimento económico português ficaram “aquém das previsões”, mas não o suficiente para alterar a “projeção de médio prazo”, disse Mário Centeno na terça-feira em declarações ao canal Now.
Ventos de abrandamento europeu
A quase estagnação, em cadeia, da economia portuguesa resulta sobretudo do contributo da procura externa ter passado a negativo, refletindo uma variação nula das exportações de bens e serviços, não compensando o contributo da procura interna ter passado a positivo, devido ao crescimento do investimento, apesar da desaceleração do consumo privado.
“Este facto está em linha com o comportamento dos indicadores relativos ao investimento e ao consumo, que indicavam melhoria no primeiro e resiliência no segundo. Por seu lado, o contributo da procura externa líquida foi negativo, por via de uma aceleração das importações de bens e serviços (muito provavelmente associadas à aceleração do investimento) superior à das exportações”, assinala uma nota de research do BPI.
Já na comparação homóloga, o NECEP destaca “a base de comparação anormalmente elevada do primeiro trimestre de 2023”.
O crescimento do PIB face ao trimestre anterior fixou-se abaixo da média de 0,3% da Zona Euro, região onde se destaca a contração de 0,1% da economia alemã.
“A inesperada contração da economia germânica é um importante revés nas expectativas para o PIB português no segundo semestre do ano“, assinala Paulo Monteiro Rosa.
Pedro Braz Teixeira alerta que “a confirmarem-se os indicadores para a Alemanha, este país pode estar a caminho de uma recessão técnica (dois trimestres negativos de variação em cadeia), afetando negativamente a economia portuguesa, quer por via direta, quer indireta, pelos restantes países europeus”.
“Isto é especialmente relevante pelo facto de a surpresa negativa no segundo trimestre ter estado nas exportações”, explica Pedro Braz Teixeira.
Ricardo Ferraz detalha que esta contração “parece ter sido explicado por uma queda no investimento nos setores da indústria e da construção”. “Por outro lado, sabemos também que a Alemanha está a passar por dificuldades relacionadas com vários fatores, entre eles o abrandamento da procura chinesa por bens alemães”, refere.
Para o investigador no ISEG, sendo a Alemanha um dos maiores clientes das exportações portugueses, o economista adverte que “é normal que logo por aí a sua travagem nos afete“, adverte.
Entre os países da moeda única mais uma economia encolheu, a Letónia (-1,1%), tendo a Áustria registado uma expansão nula, enquanto a Irlanda (+1,2%) registou o maior aumento em comparação com o trimestre anterior, seguida pela Lituânia (+0,9%) e Espanha (+0,8%). Já a economia francesa, outro dos principais parceiros de Portugal, avançou 0,3% na comparação em cadeia.
No retrato face a igual período do ano passado, a economia dos países da moeda única avançou 0,6%. Nesta comparação, Portugal inverte a tendência e regista a segunda maior subida (1,5%), apenas ultrapassado por Espanha (2,9%), enquanto as taxas de crescimento homólogas foram negativas para três países – Alemanha (-0,1%), Letónia (-0,4%) e Irlanda (-1,4%).
“Uma economia aberta como a nossa e muito dependente da economia europeia, tende a ser cada vez mais penalizada pela crescente perceção do ‘homem doente’ da Europa, fenómeno que é cada vez mais uma realidade, a deterioração da economia alemã, a qual como motor da economia europeia teima em fragilizar as restantes economias europeias”, disse Paulo Monteiro Rosa.
Entre os principais clientes das exportações portuguesas de bens, economia alemã encolheu 0,1%, francesa avançou 0,3% e espanhola 0,8% no segundo trimestre face ao trimestre anterior.
O economista sénior do Banco Carregosa aponta que “as economias da Zona Euro sentem cada vez mais a persistente política monetária restritiva do BCE, um entrave para uma economia aberta como a portuguesa, penalizando as nossas exportações”.
Após a evolução registada entre abril e junho, os primeiros sinais sobre o terceiro trimestre exigem prudência ao otimismo. O indicador do sentimento económico na zona euro caiu ligeiramente (-0,1 pontos percentuais (pp.), fixando-se em 97,8, de acordo com dados divulgados na terça-feira pela Comissão Europeia.
Entre as maiores economias da zona euro, o sentimento económico deteriorou-se em França (-2,2 pp.), tendo-se registado a maior subida (1,7 pp.) em França, enquanto na Alemanha aumentou 0,2 pp. e em Itália 0,4 pp.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Economia precisa de crescer mais de 2,5% no resto do ano para atingir meta do Governo
{{ noCommentsLabel }}