Marcelo usa Conselho de Estado para persuadir Governo e PS a acordo para o OE2025
Presidente já assumiu publicamente que está "a fazer pressão" para ter um OE, caso contrário há crise política e económica e eleições antecipadas. Marcelo já afastou uma solução por duodécimos.
Os holofotes vão estar todos apontados para Belém, a partir das 17h desta terça-feira, onde irá decorrer um Conselho de Estado que servirá, sobretudo, para o Presidente da República persuadir o primeiro-ministro e o líder do PS a um entendimento que viabilize o Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), concluem vários politólogos consultados pelo ECO. Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos têm lugar reservado na mesa dos 18 conselheiros.
Esta não será a cartada final do Presidente. Depois da entrega do OE na Assembleia da República, a 10 de outubro, Marcelo irá convocar um novo Conselho de Estado, cuja data ainda não está definida, para uma análise do conteúdo da proposta orçamental.
Oficialmente, a convocatória indica que a reunião desta terça-feira irá “analisar a situação económica e financeira internacional e nacional”. O contexto de incerteza internacional pelo prolongamento da guerra na Ucrânia, os conflitos no Médio oriente, a estagnação económica da Alemanha, o motor económico da Europa, e também a indefinição sobre os EUA no pós-eleições é um dos fatores que o Chefe de Estado tem usado para explicar como um Orçamento chumbado pode mergulhar o país numa crise política e económica.
Repetidas vezes, o Presidente foi alertando que é necessário um OE aprovado, rejeitando uma solução por duodécimos. Mas o extremar de posições entre o chefe do Executivo e o líder do maior partido da oposição, com o Chega à espreita de uma oportunidade para ser partido de poder, levaram Marcelo Rebelo de Sousa a colocar alta pressão sobre a urgência de um Orçamento aprovado.
“Estou a fazer pressão. O que tenho feito é, de facto, influência, não nego. Quando dizem ‘mas ele está a fazer influência? Estou a fazer influência. Está a fazer pressão? Estou a fazer pressão”, reconheceu este domingo.
Para André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, “este Conselho de Estado será sobretudo instrumental para o Presidente da República, uma vez que este órgão não tem poder de intervenção direta”. “Marcelo quer usar este Conselho de Estado para sinalizar a gravidade de não ter um OE aprovado e o risco que seria para o país e para a economia ir para eleições antecipadas”, reforça o politólogo.
Nesta senda, o Presidente da República já afirmou: “Ou se considera que há um interesse nacional que explica que o Orçamento passe ou se acha o contrário”. “Abdicando de convicções, claro, eu abdiquei de convicções, como líder da oposição [quando era presidente do PSD] em muitos pontos, para acertar com o engenheiro Guterres um acordo”, recordou Marcelo Rebelo de Sousa, acrescentando que também “o Governo tem de perceber que o facto de ter um programa que passou no Parlamento, não quer dizer que o aplique todo, agora, de imediato”. “E se tiver que fazer cedências no programa, para tornar possível um acordo, deve fazer cedências no programa”, frisou.
Perante a posição do Chefe de Estado, Paula Espírito Santo, investigadora do Instituto de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa (ISCSP), considera “que a partir deste Conselho de Estado [o Presidente da República] terá no fundo mais elementos para sustentar a sua posição quer do ponto de vista público, quer privado com os partidos”.
Resta saber se a tática do Presidente vai funcionar, questiona André Azevedo Alves. “Não sei se produzirá efeito ou não a pressão que está ser exercida sobre PS e Pedro Nuno Santos. Esta pressão pode ser contraproducente, pode ter um efeito contrário, porque pode aumentar o custo político a Pedro Nuno Santos”, avisa o professor de estudos políticos.
Aliás, este domingo, o líder do PS respondeu à “pressão” do Presidente da República: “Prefiro perder eleições do que abdicar das nossas convicções”.
Por isso, Hugo Ferrinho Lopes olha com maior desconfiança para a eficácia deste Conselho de Estado. “Não creio que a reunião seja determinante para pressionar PS ou Governo. O impasse entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro e a sua resolução dependem apenas do chefe de Governo e do líder da oposição”, aponta o investigador de doutoramento em Política Comparada no Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa.
Marcelo rejeita duodécimos, Cavaco desdramatiza
“O Conselho de Estado pode, no entanto, discutir as implicações de um eventual chumbo do Orçamento do Estado para 2025 e aconselhar o Presidente da República sobre que atuação deve tomar nessa circunstância. Haverá certamente opiniões divergentes. No entanto, a decisão final é de Marcelo Rebelo de Sousa”, segundo Ferrinho Lopes
De recordar que, aquando da demissão de António Costa, no ano passado, “houve um empate no Conselho de Estado quanto à necessidade ou não de convocação de eleições antecipadas, e mesmo assim o Presidente da República dissolveu o Parlamento”, lembra o politólogo.
Em 2021, Marcelo também optou pela bomba atómica, chamando de novo o povo às urnas que acabou por dar uma maioria absoluta ao PS. “Mesmo que o Presidente prefira não convocar eleições antecipadas, que é um direito seu, não deixa de estar constrangido por opções que tomou no passado”, conclui Ferrinho Lopes.
Marcelo já sinalizou que governar em regime de duodécimo com um Executivo minoritário não funciona. Por isso, no caso de o OE chumbar, o caminho aponta para a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições antecipadas, “um cenário que o Presidente quer evitar a todo o custo para não ficar para a história como o recordista de dissoluções”, conclui André Azevedo Alves.
A orientação de Marcelo é apoiada por Luís Marques Mendes, um dos seus conselheiros e ex-presidente do PSD. “Podemos ter OE, mas também é possível termos eleições antecipadas, não é o fim da democracia, mas é uma má solução”, afirmou este domingo no seu espaço de comentário na SIC.
A posição do antigo Presidente da República, Cavaco Silva, é diferente. O ex-Chefe do Estado já afirmou, em entrevista ao Observador, que “não há nenhum drama” se o OE for chumbado. “O atual primeiro-ministro [espanhol, Pedro Sánchez] viveu durante dois anos com duodécimos. Ninguém morreu”, disse.
Contudo, Marcelo já rebateu esta tese, alertando que o Executivo espanhol tinha uma maioria ao contrário de Luís Montenegro. “Estamos a falar num Governo minoritário (….) Considero que qualquer solução que não seja passar o Orçamento é má. Portanto, ninguém gosta de soluções más. Por isso é que se deve fazer um esforço para passar o orçamento”.
Governo e PS inflexíveis no IRC e IRS Jovem
A tensão aumentou após o encontro da última sexta-feira entre o primeiro-ministro, Luís Montenegro, e o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos. O líder socialista garantiu que só viabiliza o OE2025 se a proposta do Governo para o IRC e do IRS Jovem caírem e apresentou em alternativa as suas propostas. Contudo, Montenegro considerou que a proposta socialista para substituir a redução transversal do IRC é “radical e inflexível”, mas prometeu que irá apresentar uma contraproposta na próxima semana aos socialistas. No entanto, deixou claro: “Quem governa é o Governo” e não abdica da sua política económica.
“Estamos numa fricção política, que não vai ser fácil, diria quase impossível de resolver“, sublinha Paula Espírito Santo. Marcelo Rebelo de Sousa já avisou que se o Executivo e o PS não se entenderem, “quem vai desempatar é o terceiro”, numa alusão ao Chega. “A bola fica nas mãos da terceira força política”, disse.
No dia do encontro entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos, o líder do Chega, André Ventura, defendeu que “o PS foi a São Bento fazer exigências que sabe serem irrealistas e fazer um ato de campanha eleitoral”, considerando que o líder socialista sabe que seria “praticamente impossível ao Governo de Luís Montenegro ceder nas matérias do IRC, do IRS”. Perante o impasse, defendeu que “o Governo tem de perceber que está numa situação de bloqueio democrático”.
Quem são os 18 conselheiros de Estado
Membros por inerência
- Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco
- Primeiro-Ministro, Luís Montenegro
- Presidente do Tribunal Constitucional, Juiz Conselheiro José João Abrantes
- Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral
- Presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque
- Presidente do Governo Regional dos Açores, José Manuel Bolieiro
- Antigo Presidente da República, general António Ramalho Eanes
- Antigo Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva
Cinco cidadãos designados pelo Presidente da República
- António Lobo Xavier
- Joana Carneiro
- Leonor Beleza
- Lídia Jorge
- Luís Marques Mendes
Cinco cidadãos eleitos pela Assembleia da República
- Francisco Pinto Balsemão, antigo primeiro-ministro
- Carlos Moedas, presidente da Câmara de Lisboa
- Pedro Nuno Santos, secretário-geral do PS
- Carlos César, presidente do PS
- André Ventura, presidente do Chega
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Marcelo usa Conselho de Estado para persuadir Governo e PS a acordo para o OE2025
{{ noCommentsLabel }}