Água e ESG: uma relação intergeracional e multissetorial

  • Filipa Newton e Júlia Gonçalves
  • 10 Outubro 2024

Perante os desafios e crescente competição pela água, é importante o contributo de diferentes stakeholders, setores e gerações.

Somos de diferentes gerações separadas por 20 anos, mas convergentes e complementares num tema que nos une: a água.

Nas últimas décadas a transformação tecnológica, industrial e climática reconfigurou o território, as empresas e a gestão dos recursos. Nestas transições, a água é vista como um recurso indispensável, mas frágil, “o bem comum global mais precioso da humanidade” (António Guterres, Conferência das Nações Unidas sobre a Água, 2023).

Há 20 anos, existia um afastamento entre empresas e ambiente. Na água, as políticas públicas priorizavam soluções centralizadas, focadas na oferta, descurando a eficiência e a gestão do lado da procura (ie, redução das necessidades do lado dos utilizadores, que pode reduzir em mais de 30 a 50% as necessidades de consumo atuais).

Hoje essa visão mudou. Empresas, economia, cidadãos e ambiente são peças-chave de um sistema interligado e interdependente, onde recursos naturais, em particular a água, são críticos para o crescimento e bem-estar. O ESG (Environmental, Social and Governance) contribuiu para acelerar esta mudança que tem empresas e cidadãos como motores da transformação para a sustentabilidade. A energia é um bom exemplo, onde estes agentes se tornaram prosumers, mais eficientes e produtores-consumidores de energia renovável descentralizada.

A jornada da água, embora mais demorada, é fundamental. O momento é agora.

A Água no ESG

A água está no centro da dimensão ambiental (E) do ESG, impactando e sendo impactada pelas alterações climáticas, urbanização e atividades económicas. As mudanças no ordenamento do território e ineficiências afetam a sua disponibilidade e qualidade, com repercussões na dimensão social (S). A falta de acesso a este recurso pode deslocar populações, prejudicar empresas e afetar a saúde das comunidades.

A água é também um desafio de Governança (G), desde o início dos tempos e com novas crises esperadas que afetam todos os setores. Tem por isso de ser gerida de forma intersetorial, intergeracional e colaborativa, assente em novas visões e práticas.

Adicionalmente, o ESG traz métricas e exigências de reporte que favorecem a melhor gestão da água, valorizando-a e incentivando a ação.

Água no futuro

Na Europa, a nova pasta e Comissária para o “Ambiente, Resiliência da Água e uma Economia Circular Competitiva”, e a campanha #WaterWiseEU, confirmam a água como uma das prioridades do novo mandado da Comissão Europeia.

No mundo, o “Pacto para o Futuro” das Nações Unidas incentiva novas abordagens.

Em Portugal, a futura estratégia “Água que Une” nascerá de uma visão intersetorial entre ambiente e agricultura. O Programa “Acelerar a Economia” prioriza os ESG nos setores produtivos e do turismo, onde a água é um recurso vital.

Rumo a uma Estratégia que nos Una

Perante os desafios e crescente competição pela água, é importante o contributo de diferentes stakeholders, setores e gerações. A par de outras medidas, a gestão da água do lado da procura é fundamental, envolvendo cidadãos e empresas em torno de:

  1. Eficiência hídrica: Apostar de forma decidida na eficiência em edifícios, cidades, e agricultura, exigindo práticas responsáveis, tirando partido de instrumentos como o AQUA+ da ADENE — Agência para a Energia, que melhora e certifica a eficiência hídrica nos setores residencial, turístico e de serviços.
  2. Descentralização e prosumers: Incentivar sistemas locais e comunidades de autoconsumo de “Água renovável” (eg. águas pluviais, águas residuais tratadas) para usos adequados, aumentando a resiliência a secas, incêndios e inundações.
  3. Apoio ao investimento: Melhorar programas de financiamento para alavancar a adoção de tecnologias de eficiência, sensorização e monitorização. O ecossistema de inovação nacional contribui com tecnologia que importa aplicar e escalar, como a Noytrall, Builtrix, AQVAMORE e AQUAInn, e outras soluções integradas na Rede Tech AQUA+.
  4. Gamificação: Implementar programas de valorização do consumo racional da água, recompensando empresas e consumidores.
  5. ESG em reservas hídricas de fins múltiplos: Conciliar as finalidades de abastecimento com a preservação de recursos hídricos e com o seu contributo para a produção de energia e redução de emissões, adotando padrões de sustentabilidade e desempenho ESG como o Hydropower Sustainability Standard, da HSA — Hydropower Sustainability Alliance.
  6. Tarifários dinâmicos: Adotar preços dinâmicos que reflitam a escassez e incentivem a eficiência e a autoprodução.

Estas medidas têm o potencial de aproximar a produção do consumo, reduzindo ineficiências e promovendo um uso mais sustentável deste recurso.

Num mundo em rápida mudança, a água pode ser o elo que une gerações e setores, que une o E, o S, e o G, para um futuro mais inteligente e resiliente.

  • Filipa Newton
  • Founder&CEO, Infinite.ε consulting
  • Júlia Gonçalves
  • Founder&Engenheira Agrónoma, AQUAINN

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