Sarmento compromete-se em Bruxelas com excedente primário durante dez anos
Plano orçamental de médio prazo entregue à Comissão Europeia prevê que saldo que desconta a despesa com juros seja positivo, apesar de deterioração devido a encargos com o envelhecimento da população.
O Governo entregou na sexta-feira à Comissão Europeia o plano estrutural orçamental de médio prazo, o novo documento central na fiscalização das regras orçamentais europeias e negociado durante o verão entre o Ministério das Finanças e os técnicos de Bruxelas. Os dados detalhados ainda não são públicos, mas há quatro critérios com os quais o ministro da tutela, Joaquim Miranda Sarmento, se comprometeu, entre os quais um excedente primário ao longo dos próximos anos.
Na informação complementar do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025), entregue na quinta-feira passada no Parlamento, o Ministério das Finanças indica já alguma informação relativa ao plano para os próximos quatros anos que resulta da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
O novo quadro orçamental europeu tem como principal indicador a “despesa líquida” dos Estados-membros, ainda não conhecida. Ou seja, Bruxelas passa a centrar-se na evolução da despesa (exclui os encargos com juros) e da receita que não resultam da evolução da economia e está antes sob o controlo dos governos. Assim, os países negoceiam com a Comissão uma trajetória de referência baseada no risco, sendo os números sobre a despesa primária e o Produto Interno Bruto (PIB) potencial centrais na sua determinação.
De acordo com o parecer do Conselho das Finanças Públicas (CFP) ao plano de médio prazo, o Ministério das Finanças aponta para um crescimento do PIB potencial de 2,1% em 2025, de 2% em 2026, de 1,7% em 2027 e de 1,6% em 2028.
Apesar das alterações, as novas regras mantêm parte dos requisitos anteriores, como o limite dos défices orçamentais de 3% do PIB. Um cenário com o qual o país se sente confortável, depois de ter chegado a estar, entre 2009 e 2017 2.784 dias sob o Procedimento por Défice Excessivo. O Ministério das Finanças prevê um excedente de 0,3% do PIB este ano e de 0,4% em 2025, mas Bruxelas irá olhar também para o saldo primário (retira a despesa com juros) e estrutural (retira o efeito do ciclo económico e das medidas temporárias e não recorrentes).
Além de ter o valor de referência de 3%, o país deverá respeitar também uma margem de pelo menos 1,5 pontos percentuais (pp.) definida em termos estruturais, o que corresponde à “salvaguarda relativa à resiliência do défice”.
“O saldo primário mantém uma posição de excedente durante o horizonte de 10 anos considerado, mesmo quando assumido o impacto dos custos com o envelhecimento da população“, pode ler-se na informação complementar do relatório do OE2025.
O Ministério tutelado por Miranda Sarmento admite que nos últimos anos da simulação os custos com o envelhecimento “implicam uma deterioração significativa do saldo orçamental, que não obstante, permanece acima de 3% considerado“.
Nos últimos anos da simulação os custos com o envelhecimento “implicam uma deterioração significativa do saldo orçamental”.
O saldo orçamental primário anual irá condicionar a evolução futura da dívida pública — refletindo as taxas futuras de crescimento económico, as taxas de juro e os custos do envelhecimento. É precisamente o envelhecimento que coloca a Portugal um risco acrescido, de acordo com artigo publicado recentemente por Martin Larch e Matias Busse, ambos do Conselho Orçamental Europeu (EFB, na sigla em inglês). Segundo os economistas, dado o horizonte de projeção muito longo utilizado na análise ao país pelas regras orçamentais e o impacto de uma migração líquida mais volátil, “as projeções da população total podem desviar-se significativamente dos resultados”.
Neste sentido, alertam que o desafio demográfico pode “não deixar margem para absorver outros choques que provavelmente ocorrerão”, ou seja, para regressar a uma trajetória plausivelmente decrescente da dívida os governos teriam de implementar um esforço orçamental adicional ou impulsionar o crescimento económico futuro.
No OE2025, o Governo apresenta apenas estimativas para este ano e o próximo do saldo estrutural: 0,2% este ano e 0% em 2025, enquanto para o saldo primário aponta para 2,5% em ambos os anos. Paralelamente, compromete-se com a trajetória de redução da dívida pública face ao PIB.
Governo promete a Bruxelas ir mais longe do que o exigido na “salvaguarda relativa à sustentabilidade da dívida” e indica que o rácio da dívida pública reduz-se anualmente 1,8 pp. entre 2029 e 2038.
Prevê ainda que o rácio caia para 95,9% em 2024 e 93,3% em 2025, recuando para 83,2% em 2028, último ano do plano. Contudo, na análise de sustentabilidade vai mais longe e de 2029 em diante aponta para um redução de 18,3 pp., atingindo 64,8% do PIB m 2038. Quer isto dizer que o Governo promete a Bruxelas ir mais longe do que o exigido na “salvaguarda relativa à sustentabilidade da dívida” e indica que o rácio reduz-se anualmente 1,8 pp. entre 2029 e 2038.
A Comissão Europeia requereu que a probabilidade de o peso da dívida em 2033 ser inferior ao de 2028 seja superior a pelo menos 70%. Aqui Miranda Sarmento aponta para que a probabilidade seja de 74,9%.
“Neste contexto, o Governo português reafirma o seu compromisso com a gestão responsável das finanças públicas. As recentes atualizações das notações e perspetivas positivas atribuídas pelas agências de rating relativas à dívida soberana evidenciam a credibilidade das finanças públicas de Portugal”, refere a informação associada ao OE2025.
Finanças estimam probabilidade de 74,9% de que o peso da dívida pública em 2033 será inferior ao de 2028.
O CFP alertou recentemente que Portugal pode ficar de mãos atadas para aumentos da despesa ou redução de receita sem medidas compensatórias entre 2025 e 2028, caso o crescimento médio da despesa líquida nesse período se fixe em 4,2%. A instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral estima que a variação da despesa fixa-se, pelo menos, acima das estimativas para o crescimento potencial da economia (3,6%), indicador previsto pela Comissão Europeia na primavera.
No parecer ao plano divulgado na sexta-feira, o CFP considerou que as estimativas e previsões para a evolução do PIB real e respetivo deflator como prováveis e plausíveis, mas que “as estimativas apresentadas para a taxa de crescimento do PIB potencial, bem como para o hiato do produto, não aparentam ser coerentes com o restante cenário macroeconómico apresentado“.
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