Os ‘trunfos’ e os desafios de Sarmento ao defender o Orçamento
Ministro das Finanças é ouvido esta segunda-feira no Parlamento sobre a proposta orçamental, que já tem viabilização garantida.
O ministro de Estado das Finanças dá esta segunda-feira o pontapé de saída para a apreciação na generalidade do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025). Pelas 15 horas, Joaquim Miranda Sarmento irá à Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP) defender a proposta orçamental, que tem já viabilização garantida devido à abstenção do PS.
Apesar da ‘vitória’, esperam-se críticas à direita – IL anunciou na semana passada o voto contra – e à esquerda, mas o governante tem alguns argumentos que poderá tirar da cartola, entre os quais as previsões do FMI ou a posição orçamental do país face à Zona Euro.
Na apresentação do OE2025, em 10 de outubro, Miranda Sarmento procurou passar duas mensagens que deverá repetir perante os parlamentares da COFAP: o país está perante um Orçamento que não sobe impostos e é preciso responsabilidade na especialidade para não pôr em causa um excedente de 863 milhões de euros no próximo ano.
Portugal é dos poucos países da zona euro que espera excedente
O Governo prevê um excedente orçamental de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano e de 0,3% em 2025. Uma análise do ECO aos planos orçamentais submetidos à Comissão Europeia pelos países da Zona Euro (à exceção da Áustria, Bélgica, Croácia e Lituânia, cujo documento à data de publicação ainda não estava disponível), Portugal é um dos três países que prevê saldos orçamentais positivos. A liderar a tabela, em 2024, está a Irlanda (4,5%), seguindo-se o Chipre (3,9%). Em 2025, a ordem inverte-se e o excedente estimado pelo Chipre, de 2,7%, é o mais elevado, com os irlandeses a apontarem para 1,7%. Portugal mantém o terceiro lugar nos dois anos.
Crescimento em 2025 a meio da tabela da Zona Euro
Se no saldo orçamental o país brilha, no crescimento económico a realidade é distinta, com taxas abaixo de países do Sul como Espanha e Grécia. Tendo em conta os planos orçamentais de cada país, Portugal tem a sexta maior subida do PIB este ano: 1,8%. A liderar o ranking estão Malta (4,9%), Chipre (3,7%), Espanha (2,7%), Eslováquia (2,3%) e Grécia (2,2%). No lado oposto, estão a Estónia, com uma contração de 1%, e Finlândia e Irlanda (ambos com -0,2%), seguindo-se a Alemanha (0,3%) e Espanha (0,6%).
Contudo, em 2025, Portugal passa para meio da tabela de crescimento, com uma expansão de 2,1%, abaixo dos 2,4% esperados pela vizinha Espanha e dos 2,3% dos helénicos. Malta continua a registar a maior taxa (4,3%), seguida pela Irlanda (3,9%), enquanto Alemanha (1%) e França (1,1%) têm as menores.
Cativações sobem para 3,9 mil milhões
As cativações inscritas nos mapas da proposta do OE2025 atingiram um novo recorde e dispararam para 3.891,55 milhões de euros. Trata-se de um aumento de 1.370,55 milhões, o que corresponde a um salto de 54,3% face ao OE de 2024, que previa congelar 2.521 milhões de euros, e representa o valor mais alto dos últimos 10 anos, isto é, desde 2015, de acordo com o levantamento feito pelo ECO com base nos cálculos da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO).
Num artigo publicado no Público, o ministro das Finanças defendeu que “não houve qualquer aumento da percentagem de dotação afeta” às cativações, sendo o montante superior porque o valor total da despesa é maior do que este ano. “Além disto, decidiu-se não colocar, na lei do OE2025, como excecionada de cativação uma lista de entidades e de dotações de despesa, cuja autorização de descativação é da competência dos ministros setoriais, passando essa decisão a poder ser feita, a partir de 1 de janeiro de 2025, por cada ministro, por simples despacho. Isso, naturalmente, faz o valor total das cativações parecer mais elevado (dado que inclui os valores de entidades que anteriormente estavam excecionadas), no entanto permite muito mais flexibilidade à gestão orçamental de cada Ministério”, acrescentou Miranda Sarmento.
UTAO valida contas do Governo até 2028 no défice e dívida
As previsões orçamentais do Governo que constam do plano de médio prazo até 2028 “permitem o cumprimento da cláusula de salvaguarda da resiliência do défice” e a “salvaguarda da sustentabilidade da dívida” de acordo com as novas regras comunitárias, considera a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) na análise preliminar à proposta de Orçamento do Estado para 2025 à luz do novo Plano Orçamental-Estrutural Nacional de Médio Prazo 2024–28 (POENMP). O relatório da unidade coordenada por Rui Nuno Baleiras aponta, ainda assim, riscos à execução orçamental e é crítico da estratégia das ‘cativações’ e dos chamados “cavaleiros orçamentais” no orçamento para o próximo ano.
A UTAO recorda que, em termos financeiros, as restrições previstas para 2025 mantêm as restrições introduzidas em anos anteriores, sendo remetido para governante de cada área setorial, “o poder (discricionário) de autorizar a execução de despesa com a aquisição de serviços acima dos limites estabelecidos, ainda que o serviço ou organismo em causa tenha dotação disponível no orçamento aprovado pela Assembleia da República”. No entanto, alerta que “é forçoso que estas restrições venham a repercutir-se negativamente sobre a qualidade (e quantidade) dos serviços públicos prestados às pessoas e às empresas”, pelo que “a necessidade de introduzir um elevado número de exceções é um sinal de que a regra definida não será o melhor meio para atingir o fim pretendido”.
Novo Banco e cortes nos juros do BCE podem ajudar contas
A UTAO considera que o excedente orçamental de 2024 e de 2025 poderá ficar acima do esperado, devido a uma sobreorçamentação da despesa com prestações sociais. “Um resultado orçamental melhor do que estimado neste ano constitui um ponto de partida mais favorável para 2025 e um risco ascendente neste biénio”, refere.
A unidade inclui ainda entre os riscos ascendentes para o saldo orçamental o fim antecipado do mecanismo de capital contingente que pode permitir o pagamento de dividendos por parte do Novo Banco. Como o ECO noticiou, poderá significar uma receita superior a 250 milhões de euros de fundos que o banco poderá libertar. Considera ainda que a descida das taxas de juro diretoras do Banco Central Europeu (BCE) pode diminuir os encargos com juros no próximo ano.
Contudo, alerta que a incapacidade em atingir as metas de execução do Plano de Recuperação e Resiliência no biénio 2024–2025 altera a dinâmica orçamental, apontando ainda como risco descendente as tensões geopolíticas.
FMI apoia revisão do IRS Jovem…
O chefe de missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) para Portugal afirmou à agência Lusa que as alterações à versão inicial do IRS Jovem vão na direção certa e defendeu o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis. “A versão revista do IRS Jovem vai na direção certa porque é menos onerosa e, por isso, apreciamos o esforço“, disse Jean-François Dauphin em entrevista à agência Lusa em Washington. No entanto, considera que deveria ser tratada numa perspetiva mais abrangente e não com medidas orçamentais específicas.
“As energias de combustíveis fósseis devem ter o preço certo, e os subsídios incentivam o consumo daquilo que queremos que seja reduzido; além disso, são medidas regressivas, ou seja, os benefícios em euros dos subsídios custam menos aos ricos do que aos mais pobres”, argumenta o economista, que elogiou a trajetória económica do país dos últimos anos, elencando a baixa produtividade e o investimento, a par do envelhecimento da população, como os maiores desafios.
… e está mais otimista do que Governo sobre crescimento
O FMI está mais otimista do que o Governo sobre o desempenho da economia portuguesa este ano e no próximo. Na atualização das projeções económicas mundiais, divulgadas na terça-feira passada, a instituição liderada por Kristalina Georgieva prevê uma taxa de 1,9% em 2024 e de 2,3% em 2025, uma décima e duas décimas, respetivamente, a mais do que o estimado pelo Ministério das Finanças.
O fator política
A maioria relativa da Aliança Democrática (AD) obrigou o Governo a negociar o Orçamento do Estado. Apesar de não ter chegado a acordo com o PS, o secretário-geral socialista, Pedro Nuno Santos, anunciou a viabilização da proposta em nome da estabilidade do país. Contudo, afirma discordar do essencial da proposta e aponta o dedo a matérias como saúde e habitação. Por outro lado, à direita, a Iniciativa Liberal e o Chega criticam o resultado das negociações com o PS que integram a proposta. Os liberais anunciaram o voto contra, argumentando que a proposta “poderia ter sido apresentada pelo PS” e que o PSD está “completamente encostado neste momento à visão” dos socialistas.
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