Falta de professores deverá agravar-se a partir de 2026
Se nada for feito, faltarão professores com habilitação a praticamente todas as disciplinas em 2031, prevê 'think tank' EDULOG, num novo estudo. David Justino apela a profissão mais atrativa.
A escassez de professores que Portugal enfrenta deverá agravar-se já a partir de 2026, ano em que o país ficará em risco de esgotar as reservas que servem para cobrir as ausências temporárias e as vagas deixadas abertas por docentes que passam à reforma. A previsão é do think tank EDULOG, que, num novo estudo, indica também que faltarão professores com habilitação a praticamente todas as disciplinas em 2031, se nada for feito.
“O EDULOG desenvolveu estimativas das necessidades de professores a curto prazo e concluiu que, no pressuposto de que as condições atuais não se alteram, Portugal terá falta de professores com habilitação profissional a praticamente todas as disciplinas em 2031“, lê-se no estudo “Reservas de professores sob a lupa: antevisão de professores necessários e disponíveis”, divulgado esta terça-feira.
Os professores com habilitação são aqueles que têm formação específica para exercer essa profissão. Dada a falta de professores nalguns grupos de recrutamento, as escolas portuguesas já têm recorrido a professores sem habilitação (isto é, licenciados noutras áreas e sem o mestrado para exercerem a docência). E o problema deverá agravar-se nos próximos anos, se nada for feito.
Segundo o estudo agora conhecido, em 2026 alguns grupos de recrutamento entrarão mesmo em défice estrutural, sendo que em 2031 estarão “praticamente todos nesta circunstância, à exceção dos professores de Educação Física“.
Em 2026, alguns grupos de recrutamento entrarão em défice estrutural, sendo que em 2031 estarão praticamente todos nesta circunstância.
Um outro dado relevante tem que ver com o impacto das ausências no total de professores disponíveis. “Em 2021, a falta de professores que já se fazia sentir decorria da dificuldade de substituir ausências permanentes dos professores, ausências por licença ou por baixa médica. Em 2031, este problema ganhará escala e será assinalável quer pelas falhas estruturais — resultado de um aceleramento do número de reformas por idade — quer por incapacidade quase total de fazer substituições ao longo do ano“, prevê o EDULOG.
Em concreto, o think tank estima que em 2031 faltarão 8.700 docentes para preencher lugares permanentes e 15.700 professores para substituir colegas ausentes de modo temporário.
Esse cenário é “essencialmente sentido no terceiro ciclo do ensino básico e no ensino secundário, praticamente em todas as disciplinas“. Em resultado, o número de dias sem aulas por falta de professores irá “subir exponencialmente”, é estimado.
Escasseiam professores abaixo dos 40 anos
Se não forem tomadas medidas, as reservas de professores disponíveis “irão secar” até ao final da década, considerando, por um lado, “o baixo número de professores em formação” e, por outro, o número crescente de reformas, identifica o think tank.
O envelhecimento desta profissão tem sido motivo de alerta, há vários anos, e o novo estudo agora conhecido mostra que a maioria dos professores que estão disponíveis hoje para ingressar na profissão tem entre 40 anos e 50 anos, estando as faixas etárias abaixo dos 40 anos “quase vazias”. “Confirma a ausência de formação de novos professores nos últimos 15 anos“, salientam os especialistas do EDULOG.
As classes etárias abaixo dos 40 anos são classes quase vazias, confirmando a ausência de formação de novos professores nos últimos 15 anos.
Os grupos de recrutamento do terceiro ciclo do ensino básico e do ensino secundário com as pirâmides etárias mais frágeis são Economia, Geografia, Informática, Matemática, Biologia e Geologia, e Física e Química, observa o estudo. E revela que os professores disponíveis para lecionar pré-escolar, primeiro ciclo do ensino básico e Educação Física são os únicos que apresentam estruturas etárias equilibradas.
Por outro lado, o think tank mostra que há assimetrias geográficas relevantes. Hoje, o número de professores ainda é suficiente de modo global face às necessidades, mas as regiões a Sul do Tejo já ficam com vagas por preencher.
Também é no sul do país que a dificuldade em substituir professores temporariamente ausentes “é muito acentuada”. “A substituição de professores de Geografia e Informática a sul do Tejo é praticamente impossível“, avisam os especialistas.
“É melhor começar já para que cenário não se concretize”
Perante o cenário traçado, o estudo do EDULOG avança com um conjunto de recomendações, que passam por aumentar o número de vagas nos cursos de formação de professores, nomeadamente em áreas consideradas críticas como história, matemática e informática.
Em declarações ao ECO, David Justino, membro do conselho consultivo do referido think tank, explica que as vagas para formação de docentes têm sido preenchidas, mas, neste momento, “são estreitas”, isto é, estão aquém do necessário, a pensar no futuro. “O número de futuros professores inscritos nos mestrados conducentes ao ensino no terceiro ciclo do ensino básico e ensino secundário permanece muito baixo face às prováveis necessidades”, confirma o próprio estudo.
“Foi criada uma imagem de precariedade laboral da profissão, o que levou a que os que poderiam ser candidatos a professores tivessem fugido para outros cursos“, argumenta o especialista. “A única forma de atenuar este efeito é dignificar a profissão e melhorar as condições, não só de acesso à carreira, mas também de progressão”, acrescenta, sublinhando que “ninguém está para andar com a mala às costas durante 15 ou 20 anos“.
Ninguém está para andar com a mala às costas durante 15 ou 20 anos. Há que trabalhar estas dimensões de forma a tornar a carreira docente mais atrativa.
Ainda assim, David Justino alerta que, mesmo que se abram mais vagas agora, o efeito prática demorará o tempo da formação. Por isso, “é melhor começar já para que os cenários não se concretizem“, defende, referindo-se às projeções do estudo “Reservas de professores sob a lupa: antevisão de professores necessários e disponíveis”.
Quanto à resolução das necessidades que já se fazem sentir, o especialista frisa que uma “gestão eficiente” dos professores disponíveis é a chave, sendo que, neste momento, o país pode ter “oferta de educação a mais nalgumas situações“. David Justino não dá mais detalhes sobre esse ponto, remetendo-os para uma análise que será publicada no próximo ano pelo EDULOG.
Já em relação às medidas que têm sido tomadas pelo atual Governo, o mencionado membro do conselho consultivo atira que tem a “sensação que são para acudir de imediato à situação, sendo o seu efeito estrutural ainda reduzido“. “Se queremos resolver o problema, temos de tomar outras medidas”, apela.
O estudo agora conhecido recomenda, por exemplo, a criação de uma estratégia nacional para a gestão das reservas de recrutamento dos professores, “que considere as especificidades regionais e a necessidade de flexibilidade nas substituições temporárias”.
“Para isso, é fundamental que as autoridades educativas desenvolvam um plano estratégico, de longo prazo, que antecipe as necessidades futuras e implementem ações preventivas de monitorização contínua das reservas de professores, adaptando as políticas educativas conforme as mudanças demográficas e sociais, essenciais para se evitar um potencial colapso no sistema educativo em Portugal”, aconselham os especialistas do EDULOG.
Este think tank enquadra-se na Fundação Belmiro de Azevedo e cujo objetivo é, nomeadamente, “contribuir para a construção de um sistema de educação de referência” e a informação das políticas públicas “para a inovação e mudança na Educação“.
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