Montenegro segura ministra da Saúde. “Consequência política é trabalhar, não mudar as pessoas”

  • ECO
  • 8 Novembro 2024

Contrariando a tese de Ana Paula Martins de que "não estava à espera da greve", o sindicato deu dez dias para iniciar negociações. Pedido foi ignorado e técnico do INEM avançaram com a paralisação.

A greve dos técnicos de emergência pré-hospitalar às horas extraordinárias, que teve início em 30 de outubro e foi suspensa esta quinta-feira após uma reunião com a tutela, podia ter sido evitada. De acordo com o Expresso (acesso pago), o Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH) enviou um aviso ao gabinete da ministra da Saúde no dia 10 de outubro, em que dava dez dias para iniciar negociações por melhores condições laborais e travar a paralisação, mas não obteve resposta. Atrasos o socorro pode estar a origem de sete mortes, mas o primeiro-ministro não demite a ministrada Saúde. “Consequência política é trabalhar, não mudar as pessoas”, disse Luís Montenegro à margem do Conselho Europeu em Budapeste, esta sexta-feira.

Nesse dia, a estrutura sindical enviou uma primeira missiva ao chefe de gabinete da ministra, à própria governante, às duas secretárias de Estado e ao presidente do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM). Além do pré-aviso de greve e da margem de manobra de dez dias para “eventuais medidas que pudessem reverter as ações reivindicativas”, fazia uma descrição das condições de trabalho, assinalando que Ana Paula Martins reconheceu como “miserável” o índice remuneratório dos técnicos quando foi ouvida no Parlamento.

O repto, segundo o presidente do STEPH, Rui Lázaro, “foi ignorado” e, ainda a 10 de outubro, o pré-aviso de greve foi formalmente remetido para todas as entidades necessárias, tendo como primeiro destinatário o gabinete do primeiro-ministro.

A troca de comunicações, revelada pelo semanário, contraria as declarações da ministra da Saúde, no início da semana, de que “não estava à espera da greve”: não só foi previamente informada, como até teve margem de tolerância para a travar. Só esta quinta-feira, nove dias depois do início da paralisação dos técnicos — um período durante o qual houve atrasos na assistência médica a sete pessoas, que acabaram por morrer –, é que Ana Paula Martins chamou o sindicato para uma reunião de urgência. Terminou com a assinatura de um protocolo negocial que, segundo Rui Lázaro, criou “as condições necessárias para suspender, de imediato, a greve às horas extra”.

Esta sexta-feira, o Observador (acesso pago) noticia também que estão a piorar vários indicadores de desempenho do Instituto Nacional de Emergência Médica, que desde o início do ano viu sair muitos técnicos do serviço e tem tido dificuldade em fazer novas contratações. Está com o tempo de resposta a pedidos de socorro mais demorado dos últimos cinco anos, ultrapassando em muitos casos os limites definidos, e teve carros parados mais de seis mil horas até outubro.

Em entrevista à CNN Portugal, o presidente do INEM, Sérgio Dias Janeiro, admitiu que foram registados “os piores” tempos de atendimento “relativamente aos períodos de normalidade e sobreponíveis a outros momentos de greve” e que o instituto está “muito dependente das horas extraordinárias” dos técnicos de emergência pré-hospitalar.

Por isso, já teve “várias reuniões com a tutela”, sendo que estão a ser estudadas “formas de valorizar as carreiras” destes técnicos, apontou, acrescentando que, da sua experiência, “tem havido abertura [da ministra da Saúde] para avaliar esta situação”.

Sérgio Dias Janeiro revelou que “há 500 candidatos em prova” no concurso para técnicos, dizendo-se “confiante” de que, a partir de janeiro, o INEM vai ter “200 técnicos de emergência pré-hospitalar a iniciar a sua formação específica, que demora seis a oito meses, mas que em dois meses poderão iniciar funções nos CODU [Centro de Orientação de Doentes Urgentes]”. A isto acresce o “concurso para comprar mais 312 viaturas de emergência médica a adquirir ao longo dos próximos três anos”.

Antes da entrevista do presidente do INEM, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, recusou associar os sete óbitos à “falta de capacidade de resposta do INEM ou do atraso no atendimento de chamadas”. Não obstante, em declarações aos jornalistas transmitidas pela RTP3, reconheceu que “há uma situação grave de necessidade de reforço da capacidade de resposta” da entidade.

Outro membro do Governo, o ministro António Leitão Amaro, atirou culpas aos socialistas na “avaliação política das causas para os problemas dramáticos que o INEM enfrenta”, quando questionado pela deputada Isabel Moreira sobre a notícia do Expresso na audição na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública no âmbito da apreciação na especialidade do Orçamento do Estado para 2025 (OE2025).

“O PS precisa de ter um bocadinho mais de pudor quando tem nas suas costas a responsabilidade de oito anos de desinvestimento, de falta de recursos humanos, de desvalorização dos profissionais de ignorância de reivindicações dos técnicos de emergência médica”, afirmou, realçando que o atual Executivo “não resolve os problemas num dia”, mas que está a “tomar medidas, [que] poderão não ser suficientes”.

Tentando pôr um ponto final na polémica, sobretudo depois de Ana Paula Martins ter cancelado uma visita ao hospital de Pombal, Montenegro disse que “a consequência política” a retirar do caso “é resolver as questões. Não é mudar as pessoas para o problema continuar”, o primeiro-ministro esta sexta-feira à margem do Conselho Europeu em Budapeste, respondendo diretamente à questão dos jornalistas se iriam ser retiradas consequências políticas deste caso.

Não está em causa a demissão da ministra da Saúde, garantiu Montenegro. “Os ministros estão no Governo para resolver problemas, não para se arrastarem e tentarem contornar os problemas para que, eventualmente mudando os protagonistas os problemas subsistam”, frisou, em declarações transmitidas pelas televisões.

(Notícia atualizada com as declarações de Luís Montenegro à margem do Conselho Europeu em Budapeste, esta sexta-feira)

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