Aicep já contratualizou 50 milhões em investimentos. Vai bater novo recorde este ano

"Não sabemos vender Portugal e a verdade é que o país tem hoje um conjunto de ativos cada vez mais relevante", defende Ricardo Arroja, presidente da Aicep em entrevista ao ECO.

Portugal prepara-se para bater um novo recorde na atração de investimento este ano. O presidente da Aicep, em entrevista ao ECO, revela que até ao momento já foram contratualizados cerca de 50 milhões de euros, mas, até ao final do ano, esse valor poderá subir para as centenas de milhões de euros.

“Em 2022, o investimento contratualizado pela Aicep foi de sensivelmente 13 milhões de euros. Em 2023, foi à volta de 40 milhões e, até ao momento, temos investimentos contratualizados, investimentos elegíveis, de sensivelmente 50 milhões de euros“, revelou Ricardo Arroja. “O meu objetivo, até ao final do ano, é aumentar bastante este valor“, disse. “Estamos a falar de valores na casa das centenas milhões de euros”, avançou o responsável numa das primeiras entrevistas desde que tomou posse, sem se querer comprometer com valores”. Centenas de milhões que são esmagadoramente de origem estrangeira.

Sublinhando a necessidade de não confundir conceitos, Ricardo Arroja acrescentou que, em termos de investimentos potenciais, as chamadas leads de investimento ou o pipeline de projetos, a Aicep tem “várias dezenas de milhares de milhões de euros”. Mas, “projetos com alguma maturidade para serem levados a sério, estamos a falar de cerca de 20 mil milhões de euros, envolvendo a criação de 25.000 postos de trabalho”, precisou.

Para estes valores recordes de investimento são importantes os 150 milhões de euros anuais em incentivos que a Aicep pode atribuir. Um apoio ao qual se irá juntar brevemente. “A famosa linha dos mil milhões de euros, que se prevê que seja operacionalizada muito em breve”, poderá ser “contratualizar em 2025, com a possibilidade de ser executado até bastantes anos mais à frente, em que vamos sobretudo suportar e apoiar projetos na área de transição energética”, sublinhou.

Estamos perante um abrandamento dos principais motores da economia europeia — Alemanha e França — Trump vai chegar à Casa Branca em janeiro com a promessa de um aumento de tarifas, a economia chinesa está a abrandar. É realista pensar que as exportações nacionais vão conseguir chegar aos 53% do PIB em 2030?

Penso que sim. O que temos de fazer em Portugal é observar as tendências macroeconómicas que neste momento estão no panorama. O comércio internacional de Portugal provavelmente vai ser reforçado junto dos países europeus. O próprio continente europeu está, neste momento, a procurar também criar cada vez mais interligações. Há projetos de natureza infraestrutural que, neste ponto, estão em curso no âmbito da transição energética digital, que vão fazer com que os países europeus também se aproximem cada vez mais. E, simultaneamente, há que explorar avenidas de colaboração intercontinental com os países e os continentes que acabou de referir em áreas onde Portugal tenha claras vantagens comparadas. Quando olhamos para o comércio internacional, temos de olhar para as macrotendências, mas também para os setores que estão a florescer, onde sabemos fazer, onde podemos exportar o sucesso. É precisamente esse trabalho que procuramos fazer na Aicep, a partir de nossa rede externa, que é, sem dúvida, o nosso grande ativo, aquilo que nos diferencia face às restantes entidades do Estado que lidam com matérias relacionadas com a economia.

Quer identificar alguns desses nichos onde estão a apostar?

Neste momento, temos em Portugal a magnífica mescla de setores tradicionais e modernos. Ou seja, temos por um lado o tradicional, onde desde há muitas décadas temos vindo a ganhar know how e capacidade exportadora, desde logo o setor dos bens alimentares que se tem vindo a qualificar e requalificar nos anos mais recentes. Temos hoje em Portugal empresas de média dimensão, em alguns casos até a raiar a grande dimensão, que estão com uma ambição de gestão para se internacionalizar e até de adquirirem outras entidades no estrangeiro. Temos também o setor das bebidas, onde desde sempre também temos tido os nossos nichos de especialização. E temos, cada vez mais, outros setores, nomeadamente o farmacêutico, a biotecnologia, aeronáutica, construção naval que está a ressurgir depois de um longo hiato em que esteve adormecida. E nos serviços, as tecnologias de informação e comunicação, os centros de negócio e, claramente, também, cada vez mais, os data centers.

Perante as ameaças de Trump, está a ser preparado algum plano para tentar prevenir ou antecipar um cenário de aumento das tarifas comerciais?

Neste momento, o que posso dizer é que está em preparação uma missão empresarial aos Estados Unidos para muito breve trecho, que está inserida no âmbito das relações bilaterais.

Ainda este ano?

Já nos próximos dias. O tema orientador do Fórum Económico deste ano vai ser as ciências da vida. Ou seja, vamos levar à América a um conjunto de empresas de diferentes dimensões, em diferentes nichos, que exemplificam o sucesso que Portugal tem vindo a obter no setor farmacêutico, da biotecnologia e também nas tecnologias aplicadas à saúde, que, na prática, acabam por combinar as ciências da vida com as tecnologias de informação. Este setor — ehealth — está cada vez mais em voga internacionalmente. Foi um dos eixos que levámos também a uma missão recente que tivemos no Luxemburgo e que teve grande recetividade por parte dos investidores aí sediados.

O comércio internacional de Portugal provavelmente vai ser reforçado junto dos países europeus.

Daí o seu otimismo relativamente ao desempenho das exportações nacionais?

Não sabemos vender Portugal e a verdade é que o país tem hoje um conjunto de ativos cada vez mais relevante. Desde logo os recursos humanos qualificados numa série de setores. Temos, a nível europeu, a terceira maior taxa de penetração de licenciados em engenharia em percentagem do total de estudantes universitários e diplomados em Portugal. O que temos de fazer é partir dos nossos pontos fortes, que são a nossa localização central no mapa mundo; os recursos humanos de que cada vez mais dispomos, a nossa capacidade de falar línguas. Somos neste momento, um dos países com maior proficiência no domínio da língua inglesa. E não é só o inglês que dominamos. Recentemente estive numa conferência sobre centros de negócios e centros de serviços partilhados. É espantoso o crescimento que temos tido nos últimos dez anos no número dos centros de negócios e centros de serviços partilhados — partindo de 90 em 2015 para 250 hoje –, em que o número médio de idiomas falados nesses centros de serviços partilhados é de cinco e em que 90% são detidos por investidores estrangeiros. Isto mostra a capacidade que temos hoje de chegar a um conjunto de setores com saber, com capacidade de execução e competindo da melhor forma possível, ao mesmo nível que os países mais avançados por este mundo fora.

A administração anterior terminou com um valor recorde de investimento captado em 2023. Estamos quase a terminar 2024. Como é que estamos mesmo nesse capítulo?

Estamos neste momento em condições de contratualizar um volume de investimento elegível superior aos anos mais recentes.

Vamos voltar a bater um recorde?

É muito importante distinguirmos os conceitos. Quando falamos de investimento captado, podemos estar simplesmente a falar do que se chama, na terminologia anglo-saxónica, de leads de investimento, projetos de investimento que estão pré-selecionados para uma pequena localização. Isso é diferente dos contratos que depois são efetivamente contratualizados. A partir do momento em que uma multinacional escolhe Portugal para desenvolver os seus projetos e o momento em que o concretiza e que esse projeto é até apoiado por fundos públicos, que a Aicep pode operar, vai uma grande distância. No passado recente tivemos o maior número de leads de investimento que se traduz em intenções de investimento.

Está a falar dos 60 mil milhões que estavam em pipeline ou dos 3,5 mil milhões de IDE captado?

Uns e outros estão inter-relacionados porque alguns desses projetos que concorrem pelos valores de milhares de milhões de euros, são projetos precisamente que estão pré-selecionados, ou seja, em que há uma intenção de investimento. Mas essas intenções de investimento não estão contratualizadas. Em 2022, o investimento contratualizado pela AICEP foi de sensivelmente 13 milhões de euros. Em 2023, foi à volta de 40 milhões e, até ao momento, temos investimentos contratualizados, investimentos elegíveis, de sensivelmente 50 milhões de euros. E o meu objetivo, até ao final do ano, é aumentar bastante este valor.

Em quanto?

Não queria comprometer-me com valores, mas estamos a falar de valores na casa das centenas milhões de euros.

“Projetos com alguma maturidade para serem levados a sério”, no pipeline, ou seja, investimentos potenciais, “estamos a falar de cerca de 20 mil milhões de euros, envolvendo a criação de 25.000 postos de trabalho”, diz o presidente da Aicep, Ricardo Arroja, em entrevista ao ECO.Hugo Amaral/ECO

Nesses valores está misturado investimento nacional e estrangeiro. Consegue destrinçar deste montante já contratualizado quanto é IDE?

A maioria é investimento estrangeiro.

Estes valores decorrem no normal esforço de captação de investimento ou vem à boleia do PRR e das agendas mobilizadores que acabam por influenciar positivamente estes valores?

Sem dúvida. A Aicep tem hoje instrumentos que permitem aumentar os montantes de contratos assinados. Estão neste ponto em vigor um instrumento, e espera se um segundo, que vão precisamente trazer capacidade financeira à Aicep, para aprovar e contratualizar alguns destes investimentos. Refiro-me à Resolução do Conselho de Ministros número 34 de 2023, ainda do anterior Governo, que estipula a existência de uma capacidade de incentivo de até 150 milhões de euros por ano até 2027. Isto é, o montante que a Aicep pode atribuir em incentivos ao investimento.

Esse incentivo já foi atribuído a alguns projetos?

Parte destes valores que mencionei já decorrem da atribuição desse incentivo. Depois temos também em perspetiva algo que será operacionalizado a muito breve trecho A Resolução do Conselho de Ministros número 49 de 2024, a famosa linha dos mil milhões de euros que se prevê que seja operacionalizada muito em breve. Teremos mil milhões de euros para contratualizar em 2025, com a possibilidade de ser executado até bastantes anos mais à frente, em que vamos sobretudo suportar e apoiar projetos na área de transição energética: baterias elétricas, bombas de calor, hidrogénio verde e biocombustíveis. Projetos que têm um impacto estrutural e transformacional da economia portuguesa.

Em 2022, o investimento contratualizado pela AICEP foi de sensivelmente 13 milhões de euros. Em 2023, foi à volta de 40 milhões e, até ao momento, temos investimento contratualizados, investimentos elegíveis, de sensivelmente 50 milhões de euros. E o meu objetivo, até ao final do ano, é aumentar bastante este valor.

Está preocupado com os atrasos ao nível dos investimentos, sobretudo no hidrogénio verde? Recordo as declarações de Pedro Dominguinhos, no Parlamento. Todas as agendas mobilizadoras relacionadas com energia estavam atrasadas. Isso preocupa-o?

Naturalmente, porque são oportunidades de investimento que se estão a atrasar em termos da sua concretização. Agora, o importante é entender alguns dos custos de contexto que frequentemente levam a esses mesmos atrasos. E aí, por exemplo, nas questões de licenciamento ambiental há regras hoje muito exigentes, que têm de ser observadas. São processos que, frequentemente, envolvem pareceres de diferentes entidades. São processos e investimentos, em particular, que exigem também acesso à rede elétrica, acesso à água, etc. Às vezes, os passos procedimentais a fim de operacionalizar os investimentos e assinar os respetivos contratos demoram mais tempo do que aquilo que perspetivam no início. O importante é que as intenções de investimento se mantenham de pé e, felizmente, na esmagadora maioria dos casos, isso acontece. Portanto, a nossa expectativa é que as tais intenções de investimento, as tais dezenas de milhares de milhões de euros…

As leads, o pipeline, neste momento, está avaliado em quanto?

Neste momento são várias dezenas de milhares de milhões de euros. Mas diria que projetos com alguma maturidade para serem levados a sério, estamos a falar de cerca de 20 mil milhões de euros, envolvendo a criação de 25.000 postos de trabalho.

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