A viver “tempestade perfeita”, setor têxtil avisa que resiliência tem “limites claros”
Mário Jorge Machado admite que setor atravessa “momentos difíceis” e critica a concorrência “distorcida” de plataformas como Shein, Temu e AliExpress. Reshoring e passaporte digital são oportunidades.
A atravessar “momentos difíceis” pelo efeito conjugado da crise económica nos principais mercados de exportação e do “desinvestimento dos governos nacionais nos setores tradicionais”, a indústria têxtil e do vestuário (ITV) portuguesa diz ser “frustrante” a falta de reconhecimento do Estado a um setor “fundamental” para a criação de riqueza, emprego e inovação, sem esquecer o “contributo fiscal” ao país.
“Os últimos governos, incluindo o atual, têm priorizado a manutenção de um Estado sobredimensionado, em detrimento de quem gera riqueza e sustenta o país. Essa postura revela uma visão limitada, acreditando que a resiliência da nossa economia é infinita. Essa resiliência tem, porém, limites claros”, advertiu esta terça-feira o presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP).
No tradicional discurso sobre o estado do setor, na abertura do 26º Fórum da Indústria Têxtil, em Vila Nova de Famalicão, na reta final de um ano em que as exportações estão em queda, Mário Jorge Machado lembrou como o setor enfrentou e superou nas últimas décadas desafios como a liberalização do comércio mundial, a entrada da China na OMC, a crise global de 2008, a intervenção da troika, a pandemia ou, mais recentemente, a crise energética.
No entanto, acrescentou o porta-voz deste setor composto por mais de 12.200 empresas que empregam cerca de 128 mil trabalhadores e que representa 1,3% do PIB nacional, “vivemos hoje uma ‘tempestade perfeita’ [em que] crises conjunturais combinam-se com mudanças estruturais globais, como a transformação no comportamento dos consumidores e na sustentabilidade exigida em toda a cadeia de valor”.
Shein, Temu e AliExpress beneficiam da regra ‘de minimis’, que permite a entrada de mercadorias de baixo valor sem fiscalização ou taxas aduaneiras, distorcendo a concorrência e prejudicando os fabricantes europeus.
Além disso, esta indústria que em 2023 vendeu 5.753 milhões de euros para 208 países – embora 80% da faturação venha de apenas quatro (Espanha, França, Alemanha e EUA) – enfrenta atualmente a “concorrência feroz” das plataformas de moda ultrarrápida, como a Shein, Temu e AliExpress, que “inundam os mercados com produtos a preços extremamente baixos, muitas vezes com total desrespeito pelas normas ambientais e sociais”.
“Estas plataformas beneficiam da regra ‘de minimis’, que permite a entrada de mercadorias de baixo valor sem fiscalização ou taxas aduaneiras, distorcendo a concorrência e prejudicando os fabricantes europeus. A eliminação desta isenção é fundamental para restaurar um equilíbrio competitivo”, dramatizou o presidente da ATP.
Oportunidades no reshoring e passaporte digital
No arranque do fórum anual, que decorre esta tarde na Casa das Artes com o tema “Estratégias para uma parceria eficaz entre marcas e indústria”, Mário Jorge Machado sublinhou, por outro lado, que muitas marcas internacionais estão a explorar o reshoring para os seus países de origem, como os EUA, mas onde faltam infraestruturas industriais e mão-de-obra qualificada, “Portugal, com a sua tradição industrial e compromisso com a qualidade, pode posicionar-se como uma alternativa viável”.
Perante o secretário de Estado da Economia, João Rui Ferreira, o presidente da ATP destacou igualmente a introdução do Digital Product Passport (DPP), um passaporte digital que será obrigatório na União Europeia para permitir rastrear a origem, composição e pegada ambiental dos produtos, como “mais do que uma obrigação regulatória”.
Para a indústria portuguesa, desafiou Mário Jorge Machado, à frente de uma plateia composta por empresários e gestores do setor, esta medida que visa fomentar a transparência e a confiança nos consumidores é “uma oportunidade de valorizar os produtos nacionais e garantir condições justas de concorrência no mercado europeu”.
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