Tarifas, corte de impostos e desregulação são apostas do ‘Trumponomics 2.0’
Sinais sobre a estratégia de política económica do presidente dos EUA não difere muito da usada na primeira vez que ocupou a Casa Branca. Protecionismo deverá ser chapéu para as restantes medidas.
Tarifas, corte de impostos e desregulação. É esta a receita de Donald Trump no regresso à Casa Branca, 1.461 dias depois, para “tornar a América grande outra vez”. O “Trumponomics 2.0” parece não diferir muito da versão inicial, mas desta vez o 47º Presidente dos Estados Unidos tem uma vantagem acrescida: poder absoluto, com o Supremo e Congresso controlado pelos republicanos.
“Ainda não sabemos exatamente o que será o Trumponomics, quer nas políticas e medidas em concreto, quer no que respeita à sua articulação com outros elementos de política externa. Falando, por exemplo, de protecionismo, não sabemos se será abrangente ou localizado, moderado ou forte. Não sabemos o alcance das reformas fiscais e regulatórias, entre muitos outros aspetos”, considera Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, em declarações ao ECO.
Para o economista, o que parece relativamente claro é que “há condições e até incentivos para que Trump entre no mandato num tom bastante interventivo e não de forma moderada”.
“Neste momento há condições políticas dado existirem as maiorias no Congresso, que não se sabe até quando poderão durar tendo em conta eleições intercalares e alguma divisão que possa surgir entre os Republicanos. Trump tem a legitimidade e popularidade ligadas à vitória no voto popular e há expectativa quanto à sua política”, assinala.
Não é segredo que Donald Trump acredita numa política protecionista e quer ter como principal arma a imposição de tarifas, tendo já anunciado que irá criar uma nova entidade para a sua cobrança – o External Revenue Service. Durante a campanha eleitoral, o agora Chefe de Estado norte-americano sinalizou a aplicação de taxas alfandegárias de 60% sobre produtos chineses e 10% a 25% de taxas alfandegárias globais.
No entanto, a equipa económica de Trump terá discutido o aumento gradual de tarifas numa base mensal, de acordo com fontes citadas pela Bloomberg na semana passada.
“As tarifas serão implementadas gradualmente ao longo de 2026 e o impacto na economia dos EUA não será totalmente sentido até ao final do segundo mandato de Trump”, considera Abby Samp, da Oxford Economics, numa nota de research. Segundo a analista, por um lado, as tarifas ajudarão a proteger a indústria dos EUA da concorrência global, beneficiando a produção interna.
Por outro, aumentarão o custo dos bens intermédios importados e irão levar a cadeias de abastecimento globais, comércio e transferência de conhecimentos menos eficientes.
David Nelson, investigador no Center for Strategic and International Studies em Washington, destaca que “o Congresso avançou claramente numa direção mais protecionista em ambos os partidos”.
“Existem propostas para eliminar os benefícios da Organização Mundial do Comércio (OMC) para a China, criando uma nova lista de tarifas específicas para a China. E há propostas – apoiadas por alguns dos principais conselheiros de Trump – para capacitar o presidente a impor “tarifas recíprocas”, ao mesmo nível que os países estrangeiros atribuem tarifas a produtos específicos”, refere num comentário publicado no site do centro de investigação.
Para concretizar este aumento, Trump “pode aplicar tarifas unilateralmente em alguns casos utilizando a Secção 301, como ele (e Biden) fizeram contra a China. A sua utilização anterior das tarifas da Secção 232 (Segurança Nacional) sobre o aço e o alumínio criou um precedente”.
Pode também invocar a Lei dos Poderes de Emergência Económica Internacional, declarando uma emergência económica para impor tarifas globais. “Cada uma destas ferramentas pode ser contestada em tribunal ou pelo Congresso e, em alguns casos, devem ser aplicadas apenas após uma revisão completa, o que normalmente demora de nove a 12 meses”, explica. Além disso, o Congresso pode aumentar as taxas.
“Trump deverá optar por políticas protecionistas, utilizando tarifas, mas não só, e deverá prestar atenção aos temas de propriedade intelectual e segurança. Provavelmente irá baixar os impostos às empresas e promover iniciativas de desregulação. Poderá utilizar o protecionismo como argumento de negociação para outros temas, económicos ou não. É muito difícil antever o que poderá acontecer em termos de efeitos”, considera Filipe Garcia.
Corte de impostos
A política económica de Trump não se esgota, contudo, nas tarifas. O corte de impostos para famílias e empresas é outra das promessas. “Pode existir aumento dos lucros corporativos, incentivando o consumo e os investimentos no curto prazo. Todavia, isso pode custar o aumento do défice orçamental, gerando preocupações de sustentabilidade orçamental no médio e longo prazo”, assinala em declarações ao ECO Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa. Para o fazer, Trump precisaria de encontrar medidas de compensação se não quiser aumentar ainda mais a dívida norte-americana.
Na atualização das previsões económicas mundiais, o Fundo Monetário Internacional (FMI) assinala que uma política orçamental mais flexível nos Estados Unidos, impulsionada por novas medidas expansionistas, como cortes de impostos, poderá impulsionar a atividade económica no curto prazo, com pequenas repercussões positivas no crescimento mundial.
No entanto, a longo prazo, poderá exigir um maior ajustamento da política orçamental que poderá tornar-se perturbador para os mercados e para a economia, ao enfraquecer potencialmente o papel dos títulos do tesouro norte-americanos como ativo global seguro. “Além disso, o aumento do endividamento para financiar uma política orçamental mais flexível poderia aumentar a procura de capital a nível mundial, levando a um aumento das taxas de juro e possivelmente deprimindo a atividade económica noutros locais”, adverte a instituição de Bretton Woods.
Certo é que muitos investidores entraram em 2024 preocupados com uma recessão nos EUA, mas isso não se concretizou. “Continuamos a considerar as expectativas do mercado para a economia dos EUA demasiado pessimistas. O consumo está em boa forma e, com o mercado de trabalho a arrefecer, em vez de entrar em colapso, os gastos das famílias deverão continuar a impulsionar o crescimento”, considera George Brown, economista da Schroders, numa nota de research.
A gestora de ativos prevê um crescimento do PIB dos EUA de 2,5% este ano, acelerando para 2,7% em 2026. “Embora esperemos que [Trump] implemente políticas protecionistas, estamos céticos de que incluam uma tarifa básica universal. Da mesma forma, suspeitamos que os seus esforços para expulsar os imigrantes ilegais podem não atingir a escala prometida de 20 milhões”, destaca George Brown.
Alguns economistas têm alertado que a deportação de milhares de imigrantes ilegais, prometida por Trump, poderá restringir a oferta de mão-de-obra, criando escassez e aumentando os salários, tendo impacto na inflação.
Paralelamente, os economistas destacam que Trump deverá apostar na diminuição de regulamentações no setor financeiro e outras indústrias-chave. Segundo Paulo Rosa, o presidente americano deverá apostar na política energética, “sobretudo o maior enfoque nos combustíveis fósseis, com maior produção doméstica de petróleo e gás, reduzindo regulações ambientais”.
“Esta política é positiva para os setores como energia e construção. No entanto, aumentam as dificuldades na atração de investidores focados em ESG e maior pressão ambiental”, elenca. Acredita ainda que Trump irá apostar no investimento em infraestrutura.
“É positivo para o emprego em setores como construção e materiais, com estímulo ao crescimento económico. Todavia, impulsiona ainda mais o já elevado défice público devido ao elevado custo desses projetos”, aponta.
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