A circularidade e a sustentabilidade da água

  • Simão Mendes de Sousa
  • 26 Março 2025

Os conceitos de circularidade e sustentabilidade devem ser os pilares do moderno Direito Administrativo da Água.

O setor da água desenvolveu-se na ideia de garantir as necessidades de consumo. Com o tempo, foi inevitável recorrer a novas origens de água para satisfazer o consumo. E isso decorre, tanto do nível elevado de perdas registadas na rede de distribuição, mas também, do aumento da escassez que dificulta a satisfação das necessidades humanas.

Durante décadas faltou uma visão integrada do setor que aponte para a sustentabilidade futura do recurso, investida na circularidade da água que se divide em água captada, água distribuída, água que após tratamento rejeitamos e, complementarmente, em água que devemos renaturalizar. A circularidade da água vai muito para lá da simples reutilização de águas residuais urbanas tratadas, devendo assentar na reformulação do ciclo urbano da água, assente na lógica de uma só água.

As fontes alternativas de água oferecem uma abordagem sustentável à gestão da água promovendo a biodiversidade, a melhoria da qualidade da água e uma melhor adaptação às alterações climáticas, permitindo, a circularidade que diversos usos se satisfaçam com diferentes águas.

Evidentemente, a mudança ocorrerá, por um lado, com a promoção de um investimento sustentável em redes dedicadas exclusivamente à distribuição de água para reutilização, promovendo o seu consumo em usos que lhe sejam compatíveis. Investimentos que se traduzem no tratamento das águas residuais nas estações de tratamento que, com recurso a soluções tecnologicamente inovadoras, permitam a eliminação da maioria dos agentes patogénicos e contaminantes da água tratada, transformando-a num recurso pronto a ser utilizado.

A lógica destes investimentos deve assentar na ideia de partir da captação que satisfaça os usos da população para que, após rejeição, se garanta a recuperação enquanto recurso, permitindo uma utilização segura na agricultura, na indústria e nas cidades, tendo em atenção os usos admissíveis para essa água, garantindo a sua renaturalização, a recarga dos aquíferos e, numa abordagem sinergética, almejar a gestão equilibrada da água, otimizando a sua utilização, nomeadamente na exploração de fontes alternativas, diversificadas que estão as fontes de abastecimento para os diversos usos.

Ora, estes investimentos permitem o aumento da eficiência nas entidades gestoras, utilizando de forma equilibrada os seus recursos financeiros, direcionando-os à adaptação às alterações climáticas com o benefício de permitirem o envolvimento do setor privado, reduzindo o desperdício e garantindo uma estratégia planeada para o médio e longo prazo. A central dessalinizadora de água do algarve é um exemplo desse envolvimento.

Evidentemente nada disto se alcançará sem um quadro regulatório que transmita certeza aos atores privados, às entidades públicas e aos utilizadores, não se afigurando despicienda a revisão do quadro regulatório nacional quanto aos usos permitidos para água potável, como aos usos permitidos às águas para reutilização, estabelecendo-se a primazia da utilização de água não-potável para determinados usos. Igualmente urgente, é a regulação da atividade de dessalinização e o estabelecimento de normas para a transformação da cidade, privilegiando a separação de águas para diferentes utilizações.

No mesmo sentido, é necessário que, normativamente, se clarifique o papel dos privados nesta mudança, regulando-se a sua forma de entrada, estabelecendo-se a necessidade de uma rápida implementação das métricas ESG relativas ao seu consumo e reutilização da água, promovendo a fixação de um índice de cumprimento mínimo que fomente a transparência dos dados e o estabelecimento de soluções equilibradas.

Os conceitos de circularidade e sustentabilidade devem ser os pilares do moderno Direito Administrativo da Água.

  • Simão Mendes de Sousa
  • Associado de Direito Público da CMS

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