Conversas Soltas: “Super-comercial que não é um comercial” precisa-se
Na segunda edição do Conversas Soltas discute-se a gestão comercial das empresas. Onde se cruzam os objetivos comerciais e a retenção de clientes? Meo, Cisco e Polopique respondem.
As empresas precisam de um “super-comercial que não é um comercial“, defendeu a diretora geral da Cisco, Sofia Tenreiro, na segunda edição do Conversas Soltas. Juntou-se ao painel João Epifânio, da Meo, e Isabel Carneiro, da Polopique, que concordaram. Seja na relação com o consumidor final, no caso da Meo, ou no papel de fornecedor, como é o caso da têxtil Polopique, a conclusão é unânime: as funções que cabem à gestão comercial das empresas são cada vez mais amplas.
Pela segunda vez, o ECO e o Banco Popular reuniram executivos em torno de um tema transversal a todas as empresas. Em julho, as conversas centraram-se no Marketing e Comunicação. Esta quinta-feira, o tema escolhido foi a gestão comercial. Carla Santos, coordenadora executiva de comunicação do Popular, salientou que as equipas comerciais “têm sabido adaptar-se às mutações constantes que têm existido no mercado” mas mantêm-se questões sobre a abordagem futura. As prioridades das empresas convidadas estão definidas: a Cisco fala em “confiança e flexibilidade”, a Meo em “proximidade e conhecimento” e a Polopique num “acompanhamento próximo e chegar primeiro”. Quanto ao caminho para lá chegar, é o que se segue.
Cisco: “Confiança e flexibilidade”
A conversa começou com uma certeza de Sofia Tenreiro: “Hoje o papel do comercial não é o do típico vendedor“. Segundo a diretora geral da Cisco, as empresas precisam de um “super-comercial que não é um comercial“, que consiga agregar as funções que habitualmente se dividem pelos departamentos de pré-venda, consultoria e comercial para dar o melhor apoio ao cliente. Isto é, “ter a propriedade de saber as soluções técnicas mas também saber fazer as perguntas corretas para perceber as necessidades e finalmente gerir a colaboração externa“. Uma separação destas funções não é desejável: obriga o cliente a repetir-se e “perde-se muita informação”, afirma Sofia.
"Hoje o papel do comercial não é o do típico vendedor.”
As necessidades de agregação vão mais longe: até à coopetition, a cooperação entre concorrentes para satisfazer o cliente comum. Cada vez mais os clientes querem uma simplificação da parte dos fabricantes e esperam que “haja um que consiga aliar vários”, explica Sofia com base na experiência da Cisco.
Dentro da empresa, os objetivos comerciais estão muito presentes dado que “cada pessoa tem um pensamento muito focado nos resultados da empresa“, embora não se pretendam “bons resultados a qualquer preço”, ressalva. No horizonte, a Cisco tem como prioridade para a gestão comercial estabelecer a “confiança e flexibilidade” necessárias para incorporar as mudanças. “É necessária muita formação para as novas tendências” — desde cibersegurança a cidades inteligentes — para fomentar a confiança entre os colaboradores. A Cisco preocupa-se ainda em dar compensações ajustadas ao perfil de cada colaborador tendo em conta a fase da vida em que se encontra e as necessidades próprias de cada um. A flexibilidade estende-se ao ritmo de trabalho: “Podem estar na praia se quiserem desde que sejam entregues os objetivos”, ilustrou Sofia. A executiva acredita que estes benefícios “complementam muito bem” a remuneração mais direta.
Acredito numa tecnologia com alma, acompanhada pelo fator humano.
A Cisco, como empresa de referência no setor tecnológico, já conseguiu aperceber-se de que os consumidores não se importam de comprar online produtos mais indiferenciados, embora Portugal seja uma exceção. Por cá, é preciso o contacto, um “aspeto consultivo muito mais forte do que noutros países” e vendem-se essencialmente serviços, observa. Contudo, “acredito numa tecnologia com alma, acompanhada pelo fator humano”, assinala Sofia Tenreiro. “Não basta vender tecnologia: tem de se perceber que vai ser utilizada pessoas e cada um tem a sua interpretação“, acrescenta. A diretora geral da Cisco descreve o envolvimento das equipas humanas como “uma abordagem necessária e que tem de continuar a existir”. “O cliente ainda gosta de saber quem está do outro lado para o caso de surgirem problemas”, justifica.
Meo: “Proximidade com conhecimento”
“Hoje quando se dirigem a um ponto de venda [os clientes], não se limitam às perguntas básicas“, comenta João Epifânio, diretor de Vendas B2C da Meo. Isto obriga os comerciais a apresentar soluções diferentes para diferentes perfis. Neste sentido, as vendas estão incluídas na gestão comercial e mesmo a pré-venda, o suporte mais técnico, funciona de modo integrado.
A prioridade da gestão comercial é desta forma atingir a proximidade ao cliente com um conhecimento elevado do mesmo e dos produtos. Os comerciais têm de saber os diferentes meios de cobertura à disposição, o perfil de consumo do cliente e só depois fazer a sugestão do produto, pois “um produto melhor também vai deixar os clientes mais satisfeitos” e que portanto vai permitir que “rodem menos entre operadores”. Às vezes um incremento de dois ou três euros ao preço pode garantir uma qualidade substancialmente melhor — e é o papel do comercial saber quando o deve aconselhar.
A preocupação de como vender tem de existir muito antes de chegar ao comercial.
Como conjugar vendas e receitas com consultoria e serviço? A “preocupação de como vender tem de existir muito antes de chegar ao comercial”, defende João Epifânio. Os pacotes de serviços, cada vez mais alargados, são um exemplo de desenho do produto que vem precisamente ajudar à eficácia das vendas. Isto sem desvalorizar o papel do comercial que tem “uma função muito exigente, diria talvez a função mais exigente”, arrisca o diretor de vendas da Meo.
A “função mais exigente” tem que ser devidamente compensada, até porque “comercial sem dinheiro no bolso não vende“, afirma o líder de vendas. Neste sentido, a remuneração variável poderá ser superior à fixa, mas tenderá a ser equivalente. Outra componente da motivação é, à semelhança do que acontece na Cisco, a formação. “Não se pode vender sempre com a mesma metodologia” e a aprendizagem contribui para que os níveis de confiança saiam reforçados. Por fim, as políticas de rotação de quadros estão a ser afinadas com a nova dona, a Altice, pois “funcionam particularmente bem em termos de retenção” de acordo com o executivo, que deteta ainda a presença de “cada vez mais portugueses na estrutura corporativa da empresa”.
"Comercial sem dinheiro no bolso não vende.”
A digitalização também simplifica os processos, mas “ainda não estamos lá”, assume João, referindo-se mais especificamente à subscrição online de serviços. A empresa encontra-se contudo a “trabalhar fortemente nestes processos”. Entretanto, a redistribuição da rede de lojas para evitar que os clientes tenham que se deslocar mais de 50 quilómetros é outra forma de aproximação. Os canais telefónicos, a transição de tarifários… tudo tem de ser simplificado.
Polopique: “Acompanhamento próximo e chegar primeiro”
A Polopique está dimensionada para grandes distribuidores, como “não existem muitos no mundo”, diz Isabel Carneiro, a diretora geral da Polopique. É o caso do grupo Inditex. Por esta razão “não nos interessa ir a todos”, afirma a diretora, mas mantém-se consistente no tratamento: proximidade. As equipas vão frequentemente ao encontro do cliente. “Se tiverem de estar a trabalhar uma semana com o cliente estão”, reitera. E as instalações da empresa têxtil de Santo Tirso também recebem várias vezes os clientes.
Qualquer criador gosta de ver o trabalho valorizado. Quando o produto sai há um estímulo [para as equipas que o desenham].
Entre os tecidos, a equipa de desenvolvimento e a do departamento comercial “entrelaçam-se” pois “qualquer criador gosta de ver o trabalho valorizado” e a venda do produto é um estímulo para as equipas que o desenham. As equipas têm uma informação trimestral da evolução do negócio, e reúnem frequentemente com a direção para receber um feedback mais direto do cliente e “poderem reagir”. A capacidade de reação é particularmente importante numa indústria como a da moda em que “todas as semanas estamos a propor coisas” conta a diretora.
A digitalização tem acelerado o passo ao setor, pois quando o site é a montra, “passado uma semana queremos ver uma coisa diferente”, explica ainda. A Polopique consegue atualmente responder no passo de duas a três semanas a uma nova tendência ou à reposição de um artigo. A verticalidade da empresa, isto é, a participação em várias fases da cadeia de valor, ajuda à agilidade. Neste momento exportam a maioria da produção: enviam para Espanha e a partir de lá se faz a distribuição.
Num mercado em crescimento e “cada vez mais aguerrido” nas palavras de Isabel, a executiva acredita que a Polopique oferece as melhores condições aos colaboradores. “As pessoas sabem que são reconhecidas em função do desempenho”. Para além do mais, os rendimentos dos trabalhadores situam-se sempre “acima do ordenado mínimo”, garante, e têm especial atenção a assuntos de segurança social pois dão “tranquilidade” aos trabalhadores. Dificuldades no recrutamento são poucas uma vez que “Portugal tem boas escolas de moda” e a empresa também investe na formação aos seus profissionais.
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