No limiar do escalão? Veja as simulações para perceber o impacto da não atualização das tabelas de IRS

O Governo decidiu não atualizar os escalões de IRS à taxa de inflação. Alguns contribuintes que tiverem aumentos salariais em 2019 vão pagar mais IRS. Veja se é o seu caso.

Sabe que pode ter um ligeiro agravamento de impostos porque, em 2019, os escalões de IRS não vão ser atualizados à taxa de inflação? A situação só vai afetar uma parte dos contribuintes. Quais? Aqueles cujo rendimento está muito próximo do limiar superior dos escalões de tributação dos rendimentos e, no próximo ano, tiverem uma atualização salarial, nem que seja para anular os efeitos da inflação de modo a manter o poder de compra.

Confuso? Vamos a um exemplo. Um contribuinte solteiro, sem dependentes que ganhe 1.720 euros mensais em 2018, (24.080 euros anuais brutos) encaixa-se no terceiro escalão de tributação. Ou seja, paga 4.501,92 euros de IRS e 2.648,8 euros de Segurança Social. Mas se a empresa em que trabalha decidir atualizar o seu salário em 1,3%, o valor da inflação previsto no Orçamento do Estado para 2019, então passa a ganhar 24.393,04 euros brutos por ano e, consequentemente, a pagar 4.592.96 euros de IRS e 2.683,23 euros de Segurança Social. Ou seja, pagar mais 91,04 euros de IRS face a este ano, porque o aumento o fez saltar de escalão.

Mas há que sublinhar que, o IRS é um imposto progressivo, ou seja, “apenas o rendimento adicional que se situe no novo escalão de rendimentos (mais elevado) suportará a taxa de IRS mais gravosa“, lembra a fiscalista da EY, Joana Vivas.

E como é que sabe se o seu rendimento está em risco? Basta olhar para os limites superiores dos sete escalões de IRS e perceber se o seu rendimento se aproxima (7.091 euros; 20.261 euros; 25.000 euros; 36.856 euros; 80.640 euros de rendimento coletável).

E que impacto em concreto isso tem? Para tentar responder a essa pergunta, o ECO pediu à consultora EY para fazer um conjunto de simulações, que refletissem estas situações em concreto. “As nossas simulações refletem o efeito decorrente da não atualização dos escalões de IRS à taxa de inflação para o ano de 2019 e pretendem demonstrar o efeito que poderá resultar de um aumento de 1,3% nos salários, em situações de fronteira dos escalões de IRS”, precisou Joana Vivas. Estes “aumentos levarão a que, o contribuinte passe para o escalão de rendimentos superior”, logo passa a estar “sujeito a uma taxa de IRS superior”, acrescenta.

Vamos então aos casos. Um contribuinte que ganhe 11.060 euros brutos anuais e tenha um aumento salarial de 1,3% passa a ganhar 11.203,78 euros, o que significa que 8,78 euros do seu rendimento coletável passam a ser tributados a uma taxa de 23% enquanto o resto do rendimento é taxado a 14,5%, as taxas correspondentes ao primeiro e segundo escalões. Assim, este contribuinte solteiro sem dependentes vai pagar 1.030,21 euros de imposto no próximo ano, ou seja, mais 21,59 euros do que este ano. Ou seja, feitas as contas, este contribuinte tem um acréscimo de rendimento líquido de 106,37 euros. O que representa um aumento de 1,2%, menos 0,1 pontos percentuais do que os 1,3% de aumento que teve inicialmente.

Já um contribuinte solteiro sem dependentes que ganhe um salário mensal bruto de 1.050 euros, se tiver um aumento de 1,3% para colmatar os efeitos da inflação, passa a ganhar 1.063,65, ou seja, mais 191,10 euros. Mas este novo rendimento passa a ser tributado de forma diferente. Dada a progressividade do IRS, até aos 7.091 euros de rendimento coletável é tributado a 14,5%, a parte do salário entre os 7.091 e os 10.700 euros é taxada a 23% e aos 87,10 euros remanescentes é aplicada uma taxa de 28,5% que corresponde ao terceiro escalão. Resultado, este contribuinte vai ter de pagar mais 21,02 euros de imposto em 2019. Em termos de rendimento líquido tem um acréscimo de 121,34 euros, ou seja, 1,07% (menos do que os 1,3% de aumento que lhe foram inicialmente concedidos).

Num terceiro exemplo de um contribuinte que ganha um salário anual bruto de 24.080 euros com um aumento correspondente à inflação passa a ganhar 24.393,04 euros. O seu rendimento coletável sobe 91,04 euros e o imposto a pagar 34,43 euros. A conclusão é, mais uma vez que o seu rendimento líquido sobe apenas 187,56 euros, ou seja, 1,1% (menos do que o aumento salarial que lhe foi dado).

Passando aos contribuintes dos escalões mais elevados. Um salário mensal bruto de 2.070, com um aumento salarial de 1,3%, ganha 376,74 euros. De acordo com as regras até aos 7.091 euros de rendimento coletável é tributado a 14,5%, a parte do salário entre os 7.091 e os 10.700 euros é taxada a 23%, a fatia entre 10.700 e 20.261 euros é tributada a 28,5%, entre 20.261 e 25.000 a 35% e aos 252,74 euros remanescentes é aplicada uma taxa de 37% que corresponde ao quinto escalão. Resultado, este contribuinte vai ter de pagar mais 136,91 euros de imposto em 2019. O seu rendimento disponível aumenta apenas 1,01% apesar do aumento salarial ter sido de 1,3%.

De sublinhar que a partir do sexto escalão ao rendimento bruto, o valor da dedução específica passa a ser o da Segurança Social, já que é superior aos 4.104 euros definidos como dedução específica para os escalões anteriores.

Já para um rendimento que estava no limite do sexto escalão, o rendimento líquido aumenta 1,03%. Ou seja, o rendimento bruto de 41.300 euros passa a ser de 41.836,90 euros. O imposto a pagar é 207,11 euros superior ao pago em 2018 e o rendimento líquido anual passa a ser de 26.435,84 euros, ou seja, mais 270,73 euros. Também aqui, o agravamento de impostos anula parte do aumento salarial.

Finalmente, um salário mensal bruto de 6.400 euros vai pagar mais 470,72 euros de imposto. Seguindo o raciocínio: os 89.600 euros brutos anuais têm um aumento de 1,3%, passando para 90.764,8 euros (mais 1.164,8 euros). É feita uma dedução específica de 9.984,13 (o valor equivalente à Segurança Social) e subtrai-se ainda 30.398,84 euros de imposto. Resultado o contribuinte solteiro, sem dependentes tem um acréscimo de 565,95 euros ao rendimento líquido, ou seja, um aumento de 1,13%, mais uma vez inferior ao aumento inicial de 1,3%.

O Executivo tem desvalorizado este efeito preferindo sublinhar que o conjunto das medidas adotadas ao nível do IRS se vão traduzir num alívio de mil milhões de euros para os escalões mais baixos do IRS. Um alívio que resulta das alterações aos escalões do IRS que não foram totalmente refletidas nas tabelas de retenção — o que terá um impacto de 155 milhões de euros no próximo ano, um valor confirmado nesta proposta de OE, a que se somam aos 230 milhões de euros previstos para 2018 –, mas também do aumento do mínimo de existência (o valor de rendimento livre de IRS).

De facto, para a generalidade dos portugueses o imposto volta a baixar, em 2019, devido à conjugação destes dois fatores. Mas, ainda assim, a generalidade dos portugueses ainda não recuperou do “enorme aumento” de IRS que houve no período de ajustamento financeiro.

Pressupostos das simulações:

  • O contribuinte é solteiro, sem dependentes, residente no Continente, sem deficiência.
  • O contribuinte aufere exclusivamente rendimentos do trabalho dependente, não tem rendimentos de outra natureza.
  • Não foram consideradas deduções à coleta.
  • As simulações demonstram o efeito no rendimento líquido anual decorrente da não atualização dos escalões de rendimento artigo 68.º do Código do IRS à taxa de inflação.
  • As simulações presumem aumentos salariais na mesma medida da inflação estimada para o ano de 2018, i.e. 1,3%, de acordo com a Proposta de Lei n.º 155/XIII – Grandes Opções do Plano para 2019.

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