As respostas ao aumento do turismo e como a Câmara de Lisboa não as está a dar, o problema do arrendamento tradicional e do alojamento local. São os temas da conversa com Adolfo Mesquita Nunes.
Promete que a candidata do CDS à Câmara de Lisboa vai apresentar soluções para alguns dos problemas que os lisboetas enfrentam hoje. Sobre o arrendamento considera que o Governo deveria ter reforçado o sentido das políticas do anterior executivo de que fez parte como secretário de Estado do Turismo. Porque não se aumenta o arrendamento tradicional e diminui o alojamento local por decreto.
Esta é também a parte da entrevista em que Adolfo Mesquita Nunes fala da sua experiência governativa dizendo que saiu no tempo certo, porque “era melhor que viesse outra pessoa continuar o meu trabalho ou o trabalho que quiser fazer.”
O turismo em Portugal começa a disparar quando foi Secretário de Estado do Turismo. Consegue distinguir o que é que foi o sucesso que pode ser atribuído a si e o que é que pode ser conjuntura internacional, nomeadamente a instabilidade no Norte de África, o terrorismo, e o que é que também cabe às autarquias, especialmente ao Porto e de Lisboa.
Disse sempre que nenhum destino turístico se constrói em três anos. Foi o tempo que eu tive como Secretário de Estado do Turismo. Eu herdei um país com muito boas infraestruturas, com um extraordinário parque hoteleiro, com um ótimo destino do ponto de vista histórico, cultural e de clima e herdei um país com boas ligações aéreas. Éramos o vigésimo país mais competitivo do mundo quando comecei a trabalhar com Secretário de Estado do Turismo. E pareceu-me que, tendo já tudo isto, era preciso trabalhar em duas áreas. Por um lado, atualizar a produção do destino, que estava muito desatualizada, quer quanto às mensagens, quer quanto aos meios, quer quanto aos objetivos. E por outro lado na desregulamentação, para permitir que houvesse cada vez mais negócios. Quando terminei [o mandato], o país era o décimo quinto mais competitivo do mundo, de acordo com o Fórum Económico Mundial.
É evidente que se, de repente, temos mais não sei quantos milhões de pessoas numa cidade a visitá-la, isso gera desequilíbrios e necessidade de repensar a gestão urbana, como a higiene urbana, os transportes, o estacionamento, o trânsito. E são desafios que, do meu ponto de vista, não estão a ser bem resolvidos pela Câmara.
Somei aquilo que existia. O sucesso do turismo é o resultado de tudo isto, e não é meu. Tenho a pretensão de ter melhorado a promoção que se fazia de Portugal, mas se o destino não fosse bom, se os hotéis não fossem bons, a promoção não servia de nada. E não era eu que lá estava quando se criaram condições para que os hotéis fossem melhores.
Sobre a conjuntura internacional, de forma muito simples, os países envolvidos pela primavera árabe perderam, na altura, – agora não sei com que dados é estamos – , cerca de seis milhões de turistas e a Europa ganhou 60 milhões. A conjuntura internacional pode explicar alguma coisa, mas não explica que estejamos a crescer mais do que todos os nossos concorrentes. Significa que fizemos alguma coisa de bem feito, eu e todos os secretários de estado anteriores. É positivo que haja um setor que se possa apresentar como campeão. E em que os membros do Governo possam reconhecer o trabalho dos membros do Governo anterior, coisa que fiz sempre.
E as autarquias?
As autarquias também.
A Câmara de Lisboa, nomeadamente quando António Costa era Presidente da Câmara.
Todas as autarquias têm o governo das suas cidades e, portanto, da oferta cultura e da dinamização da cidade. Há coisas que têm a ver com o Governo, com o Estado. Muitos dos regimes de licenciamento que foram liberalizados têm a ver com isso, mas muitas outras condições como a limpeza da cidade, a higiene, a beleza da cidade, a capacidade de a cidade atrair e acolher turistas tem que ver com as autarquias. Da mesma forma, qualquer presidente de câmara herda algo que já veio de trás e vai tentando somar, melhorar e tanto quanto possível não prejudicar. Também os autarcas são protagonistas do crescimento que o turismo tem tido em Portugal.
A conversa do turismo a mais é, por um lado, inconsequente, porque dali não sai nenhuma pista de solução e, por outro lado, só serve para ter aplausos e escrever ótimos artigos de jornais que toda a gente aplaude porque toda a gente sente, de facto, que o turismo alterou o nosso quotidiano.
As atuais obras em Lisboa podem prejudicar o turismo?
Qualquer obra que se faça em Lisboa, e que seja avaliada sob o ponto de vista de “prejudica” ou “não prejudica”, deve ter em primeiro lugar, como grau de avaliação, os lisboetas e depois então os turistas. As obras da cidade, feitas todas ao mesmo tempo, sem alternativas, tem criado bastantes constrangimentos aos lisboetas, àqueles que aqui trabalham e, consequentemente, aos turistas. Como tem acontecido nos problemas que tem havido também nos transportes públicos, das cativações que o Governo tem feito e que também têm prejudicado as mesmas pessoas.
Pensa que Fernando Medina corre o risco de perder as eleições?
Estamos a um ano das eleições. Ainda não temos todos os candidatos definidos. É muito extemporâneo fazer cenários sobre quem pode ganhar ou não. A convicção que tenho é que o CDS tem a melhor candidata [Assunção Cristas] e aquela que poderia ser a melhor presidente da Câmara de Lisboa.
Considera que existe pressão turística a mais? Há neste momento já criticas ao excesso de turismo, nomeadamente em Lisboa.
Quantos às criticas sobre o turismo em Lisboa, se substituir a palavra “turista” por “estrangeiro” e a palavra “lisboeta” por “português”, vai ficar siderada com as frases. Frases do género: “porque no meu bairro já só vivem estrangeiros e eu não quero casas compradas por eles porque já cá não há portugueses” é muito parecido com “no meu bairro já só há turistas e eu não quero casas vendidas a turistas”. Faço só esse parênteses sobre sociedades abertas e fechadas (Adolfo Mesquita Nunes refere-se aqui à parte da entrevista sobre as atuais ameaças às sociedades abertas).
Não estamos condenados a que o alojamento local seja sempre mais atractivo que o arrendamento. Temos é que trabalhar no arrendamento tradicional para o tornar tão atractivo ou mais como o alojamento local.
Sobre o desafio do turismo, é evidente que se, de repente, temos mais não sei quantos milhões de pessoas numa cidade a visitá-la, isso gera desequilíbrios e necessidade de repensar a gestão urbana, como a higiene urbana, os transportes, o estacionamento, o trânsito. E são desafios que, do meu ponto de vista, não estão a ser bem resolvidos pela Câmara. É natural que as pessoas se queixem que há turistas a mais, porque é esse o fenómeno visível, mas muitas das vezes o que falta é gestão urbana. Se temos mais pessoas a fazer lixo na rua, o problema é que não é não estar a resolver o problema.
Há muita coisa a fazer do ponto de vista de gestão dos fluxos turísticos, com recurso também inovação. É possível responder a esses desafios sem cair no outro lado da conversa, que é a do turismo a mais. Estamos a trabalhar nisso na candidatura da Assunção Cristas. Porque a conversa do turismo a mais presume que há um número de turistas bom, que nunca ninguém define, e depois presume que, chegado esse número, é possível impedir as pessoas de chegar cá.
A conversa do turismo a mais é, por um lado, inconsequente, porque dali não sai nenhuma pista de solução e, por outro lado, só serve para ter aplausos e escrever ótimos artigos de jornais, que toda a gente aplaude, porque toda a gente sente, de facto, que o turismo alterou o nosso quotidiano.
Não referiu por exemplo o aumento no preço das casas, que é uma das queixas. Em Lisboa, nomeadamente, não deveria ser gerida?
Os dados que têm surgido demonstram coisas curiosas como: há freguesias, como a freguesia do Lumiar, que tem sofrido grandes aumentos de rendas, ou freguesias como os Olivais, onde tem havido um dos maiores desaparecimentos de números de casas para arrendar.
Portugal e Lisboa têm, há décadas, um problema grave de arrendamento. Pretender que é um fenómeno, que podemos identificar como tendo três ou quatro anos, que causou os problemas do arrendamento em Portugal, parece-me claramente excessivo. Aliás, não consigo compreender como é que se pode incentivar o arrendamento na cidade de Lisboa ao mesmo tempo que se diz que se vai manter o congelamento de rendas, que se vai criar a figura do senhorio social ou que se vai reverter o balcão do arrendamento, que tem permitido agilizar as ações de despejo.
O importante é tornar o arrendamento tradicional mais apelativo, o que não é, ainda. Devia-se intensificar a reforma do arrendamento que foi feita pelo Governo anterior e não o contrário, que é estar preocupado em revertê-la.
É evidente que o turismo constitui também uma pressão no mercado imobiliário. Mas está por provar é que seja a pressão determinante que tenha causado esta circunstância, de as pessoas hoje se queixarem, como se nunca tivesse havido um problema de arrendamento em Lisboa, nos últimos 20 anos.
Não deveríamos fazer também aquilo que fizeram algumas capitais, no que diz respeito a Airbnb e outras plataformas?
O home sharing existe independentemente da lei o proibir ou não. É isso que essas cidades estão a descobrir. Cidades que têm leis restritivas, vivem o mesmo drama.
Temos é de fazer com que, para o senhorio ou para o proprietário da casa, o arrendamento seja uma solução mais atrativa e menos dispendiosa do que a de dar a sua casa de arrendamento a terceiros. Aí há um conjunto de iniciativas que podem ser tomadas. O que não me parece adequado pensar é que esse é um fenómeno que se trava por decreto.
Se as pessoas puderem colocar a casa em arrendamento, com um bom rendimento por mês, sem mais nenhum trabalho e com confiança que se a coisa correr mal, o contrato termina, dá bastante menos trabalho do que ter que estar a pegar nos lençóis de três em três dias, lavar e etc. Não estamos condenados a que o alojamento local seja sempre mais atrativo que o arrendamento. Temos é que trabalhar no arrendamento tradicional para o tornar tão atrativo ou mais como o alojamento local.
Alterar os incentivos e esperar pela candidatura da candidata do CDS para ouvir essas medidas?
Não vou estar a destrunfar aquilo que são as propostas que Assunção Cristas apresentará em matéria de habitação em Lisboa.
Agravar a tributação do alojamento local pode ser uma boa solução no sentido de convergir a remuneração do arrendamento tradicional versus alojamento local?
Estamos a passar ao lado do problema, porque isso implicava considerar que as pessoas só dão a sua casa de alojamento local por motivos fiscais. Eu estou em crer que não são essas as principais razões. Nesse sentido também poderia ser feito muita coisa, diferenciando situações. Nem todas as situações são iguais. O Governo, nesse sentido, não refletiu como deveria, pelo menos nos vários cambiantes que o fenómeno tem.
Já percebemos que vamos ter muitas novidades no domínio do turismo na candidatura da líder do CDS à Câmara de Lisboa. O que que ainda gostaria de ser na política?
Eu nunca quis ter compromisso profissional com a política e por isso é que não concorri nas listas a deputado nesta legislatura. Essa ideia de ter esse compromisso sempre me assustou o que significa que vou vivendo a minha experiência política à medida que os dias vão passando e à medida que os convites vão surgindo. Neste momento estou a gostar muito de ser vice-presidente da Assunção Cristas.
Não tem saudades de ser Secretário de Estado? Não ficou com aquela depressão pós-governo?
Depois de termos passado por um Governo que durou três semanas, a pessoa tem vontade que a experiência termine. Saudades, não tenho. Tenho muito boas memórias e foi algo que gostei muito de fazer. Mas há um tempo para tudo. Era importante que viesse outra pessoa. Quando chegamos, temos as nossas prioridades, procuramos fazer tudo por elas e a nossa força, a nossa capacidade de nos impormos e de impormos as nossas ideias também se vai esbatendo com o tempo, perante os atores do setor, e é importante que haja essa renovação. Deixei [o Governo] com a convicção que era melhor que viesse outra pessoa continuar o meu trabalho ou o trabalho que quiser fazer.
Mas quererá voltar à política ativa, no sentido governamental, se tiver oportunidade?
Isso não me parece que dependa de mim.
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