Passado o êxtase inicial com a abertura do espaço aéreo, resta encarar os desafios que aí vêm, com a formação qualificada à cabeça e a preservação da natureza sempre em pano de fundo.
O ano que passou seria chave para o desenvolvimento do turismo dos Açores e o Governo Regional assumiu isso mesmo. No Orçamento para 2016, destinou 8,6 milhões de euros à promoção da região, lá fora e cá dentro. O ano acabou generoso: de menos de 40 milhões de euros da era pré-liberalização, as receitas da hotelaria saltaram para 60 milhões de euros nos nove primeiros meses de 2016.
A multiplicação dos euros foi o resultado de um trabalho intenso para posicionar o ‘destino Açores’ no quadro do turismo mundial. Um trabalho que não vem de hoje, nem de há dois anos.
“O crescimento do setor do turismo beneficia do novo modelo de acessibilidades aéreas à região, mas é preciso ter a noção de que este não foi um trabalho que se iniciou com a entrada das lowcost ou com o momento de liberalização das rotas entre o Continente e as ilhas de São Miguel e Terceira. O crescimento do número de turistas dos EUA e Canadá que nos visitam — rotas nas quais não operam companhias de baixo custo — dá bem nota deste ponto, com crescimentos de 57% e 14%, respetivamente”, destaca a secretária Regional da Energia, Ambiente e Turismo, Marta Guerreiro.
Sobram alguns (grandes) desafios. Que o diga Joana Damião Melo, que, quando teve de recrutar a equipa para o Santa Bárbara Eco Beach Resort, inaugurado em junho de 2015, acabou a contratar um antigo carteiro, um arquiteto e uma lojista.
A ilha, no seu todo, peca por isso. É genuína, mas falta-lhe refinamento.
“Somos um quatro estrelas e temos tudo para ser cinco, mas não queremos. Porquê? O maior problema é a mão de obra. O recrutamento de fora é dificílimo, é preciso dar um pacote salarial muito grande. Encontrar pessoas qualificadas aqui, mais difícil é. Metade das pessoas que saem da escola de turismo não quer ir para a hotelaria, a outra metade quer ir para fora”, lamenta a diretora geral do resort. “A ilha, no seu todo, peca por isso. É genuína, mas falta-lhe refinamento”.
A falta de formação qualificada é um problema reconhecido, que já está a ser atacado. Entre as várias medidas previstas, contam-se “o incentivo a programas de formação e qualificação, tanto do setor público como privado, o apoio da conversão profissional e da atualização de competências adequadas ao mercado trabalho, em particular no atendimento ao cliente e no marketing digital, e o incentivo à criação de programas e intercâmbios profissionais e de estágios com entidades públicas e privadas noutros destinos, quer partilhem o mesmo tipo de características e de mercados”, destaca Marta Guerreiro.
Num destino com a qualidade e sustentabilidade ambiental como os Açores, não podemos descurar a qualidade.
Depois, há a questão da proteção da galinha dos ovos de ouro: a natureza. Os açorianos estão convencidos de que o boom do turismo não vai estragar o arquipélago, por dois motivos: primeiro, porque não acreditam que o Governo vá deixar “que a construção se descontrole”; segundo, porque estão todos “muito empenhados” em que o têm de melhor seja preservado. “Se a nossa natureza não existir, o que é que nos resta?”
Certo é que o Governo Regional não está a deixar a sustentabilidade da ilha ao acaso. Desde já, prepara-se para cobrar uma taxa aos turistas que queiram visitar parques naturais e zonas geridas pela Secretaria do Turismo, impondo ainda um limite de capacidade a algumas destas áreas. Os preços a cobrar ainda não estão definidos, mas o Governo deixa claro qual é a intenção: “Num destino com a qualidade e sustentabilidade ambiental como os Açores, não podemos descurar a qualidade”.
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Crónica de uma ilha liberalizada. O milagre da multiplicação dos euros
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