Com juros das dívidas em queda e as ações a recuperarem do vírus, onde investir?

Coronavírus virou os mercados financeiros de pernas para o ar, mas o poder de fogo dos bancos centrais estão a tentar por os pés novamente na terra e encaminhar a recuperação.

A pandemia de coronavírus gerou o pânico nos mercados financeiros: os juros das dívidas dispararam e as ações afundaram de forma generalizada. O efeito passageiro acabou afogado pela liquidez injetada pelos bancos centrais na economia. Com mega-estímulos em vigor e resultados empresariais afetados pelo confinamento, as maiores gestoras de ativos estão a olhar para Portugal como um oásis num mundo de baixos juros. Na dívida privada e (em parte) nas ações também há quem veja interesse.

“Temos estado muito positivos em relação a obrigações públicas nos últimos anos, mas tenho de admitir que, no ponto em que estão neste momento, não são um ativo particularmente atrativo”, diz Neville Hill, economista-chefe europeu do Credit Suisse, ao ECO. “Em geral, obrigações públicas não estão particularmente entusiasmantes. Portugal está incluído neste grupo“.

Tal como os pares, o banco de investimento suíço tem vindo a rever a estratégia para fazer face aos desenvolvimentos do coronavírus. O principal fator que determinou o apaziguar das tensões nos mercados foram a rápida ação dos bancos centrais.

"Estamos overweight em risco soberano da Zona Euro devido ao forte panorama político da compra de ativos do Banco Central Europeu e do Fundo de Recuperação da União Europeia. Gostamos especialmente de soberanos que já esgotaram uma parte significativa da dívida que esperam emitir, como Portugal ou Espanha.”

Elena Domecq

Estratega para Portugal da JP Morgan AM

No caso da Zona Euro, o Banco Central Europeu (BCE) lançou um programa de emergência que, já após um reforço, tem 1,35 biliões de euros para comprar dívida pública e privada. Da mesma forma, nos EUA, a Reserva Federal anunciou que iria retirar os limites à aquisição de ativos e estendeu estes programas a quase todas as áreas da economia.

Se do lado dos emitentes, permitiu que se financiassem com baixos custos, do lado dos investidores, comprimiu os retornos. Também a BlackRock diminuiu a exposição a obrigações soberanas, por considerar que com yields tão reduzidas têm menos possibilidade de gerar ganhos. É o caso das Bunds alemãs, cujo juro é negativo em todas as maturidades até aos 30 anos.

Mas neste caso, a gestora de ativos assume como exceções as Treasuries norte-americanas e as obrigações da periferia da Europa, ativos nos quais a posição de overweight. “Quando falamos de periféricos, Portugal está incluído neste grupo e dentro desta previsão”, explica André Themudo, responsável pelo negócio da BlackRock em Portugal e pelo segmento wealth para a Península Ibérica.

"A intervenção dos bancos centrais, que compram obrigações corporativas diretamente, oferece um forte apoio ao mercado. Essas massivas injeções de liquidez fornecem financiamento abundante e barato às empresas e ajudam a manter as taxas de default a um nível razoável, principalmente na Europa.”

Vincent Marioni

Diretor de Credit Investments da Allianz Global Investors

Gostamos especialmente de soberanos que já esgotaram uma parte significativa da dívida que esperam emitir, como Portugal ou Espanha“, refere Elena Domecq, estratega para Portugal da JP Morgan AM, apesar de reconhecer que, além do principal fator relacionado com a própria cura para o vírus, há o risco de exaustão dos governos que possam vir a reverter a política de estímulos orçamentais demasiado cedo.

Além de alinhar na preferência por dívida portuguesa, JP Morgan e BlackRock partilham igualmente a preferência por crédito. O impulso dos bancos centrais também chegou às empresas, que têm emitido mais dívida para fazer face aos desafios gerados pelo vírus e, neste caso, os cupões são mais atrativos para compensar o risco associado ao ambiente económico deteriorado e às incertezas persistentes durante a duração da pandemia.

“A intervenção dos bancos centrais, que compram obrigações corporativas diretamente, oferece um forte apoio ao mercado. Essas massivas injeções de liquidez fornecem financiamento abundante e barato às empresas e ajudam a manter as taxas de default a um nível razoável, principalmente na Europa“, explica Vincent Marioni, diretor de Credit Investments da Allianz Global Investors.

Ações sobrevalorizadas? Ainda há margem para ganhos

A dívida privada é uma fonte de retornos para as principais gestoras de ativos, o que não quer dizer que tenham abandonado as ações. O Credit Suisse reforçou posições em março, mas recuou para uma posição neutra devido à incerteza sobre uma segunda vaga. A BlackRock também reduziu a exposição a ações, nomeadamente dos EUA, por considerar que as avaliações estão demasiado esticadas. Mas a posição não é consensual.

O Bankinter prefere olhar para estimativas de resultados em 2021 como referência para as avaliações das bolsas, “uma vez que os de 2020 estão totalmente distorcidos” pela pandemia. “Os resultados de 2021 das empresas norte-americanas já serão algo superiores aos de 2019, mas tal não acontecerá no caso da Europa”, diz a equipa de research.

“Por isso, entre outras razões, Wall Street não parece sobrevalorizado. E por isso a nossa estratégia continua centrada no mercado norte-americano. A capacidade para gerar lucros é o mais importante numa avaliação. Contudo, as bolsas deverão evoluir de forma muito mais lenta ao longo do segundo semestre. As incertezas chave são o vírus e as eleições americanas de 3 de novembro”, acrescenta.

"Wall Street não parece sobrevalorizado. E por isso a nossa estratégia continua centrada no mercado norte-americano. A capacidade para gerar lucros é o mais importante numa avaliação. Contudo, as bolsas deverão evoluir de forma muito mais lenta ao longo do segundo semestre.”

Equipa de research

Bankinter

Wall Street tem feito uma recuperação mais robusta do que as bolsas europeias após o crash vivido no início da pandemia, tendo mesmo renovado máximos antes de os dados económicos terem refreado o entusiasmo dos investidores. No total do ano, o índice tecnológico norte-americano Nasdaq já valorizou mais de 20%, enquanto o S&P 500 ou alemão DAX estão na linha de água. O pan-europeu Stoxx 600 e o português PSI-20 ainda estão negativos com perdas superiores a 10% e 15%, respetivamente.

“Em termos de ações, mantemos uma posição positiva sobre ações dos EUA, apesar de com maior foco em small caps e mantemos uma inclinação positiva para ações da Europa e mercados emergentes”, diz Domecq. “Em suma, estas inclinações do portefólio são combinadas dar um risco distinto às nossas carteiras de ativos, seguindo um padrão de crescente tolerância ao risco que começou gradualmente no final de abril”.

“No entanto, notamos que a volatilidade se mantém elevada e, como resultado, a dimensão das posições são bastante modestas. A acomodação monetária deverá manter a volatilidade numa trajetória gradualmente decrescente, mas que não exclui episódios de elevada volatilidade. Hoje, acreditamos que há impulso económico suficiente para que haja suporte para as ações e obrigações privadas“, acrescenta a estratega para Portugal da JP Morgan AM.

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